A classe!
Venha ou não o Benfica a ser melhor, é difícil não reconhecer a qualidade de Enzo Fernández
ESCREVI, há dias, um artigo em ABOLA 3D (área de conteúdos exclusivos online, que pode o leitor subscrever, a baixo custo, para ter acesso ao que de melhor se produz nesta casa, inclusive a edição digital do jornal, que há mais de 75 anos é principal referência da comunicação desportiva deste País), como o jovem argentino Enzo Fernández trouxe classe à equipa e ao futebol do Benfica, exatamente porque, a meu ver, a classe, no futebol, se define pela velocidade com que um jogador pensa, pela qualidade com que executa e pela forma simples como joga. Volto hoje ao tema, de um ponto de vista mais individualizado, porque me encantam todos os jogadores que, como Enzo Fernández, mais do que jogar, melhor compreendem o jogo, e, por isso, têm a exata noção da diferença entre jogar à bola… e jogar futebol!
Alguém disse, e melhor não o podia, realmente, ter dito, que, sendo um jogo simples, no futebol jogar simples é o mais difícil. Nesse sentido, o caso do jovem argentino Enzo Fernández pode, de algum modo, utilizando, neste caso, exatamente as palavras do artigo em A BOLA 3D (sem querer, naturalmente, replicá-lo), servir de exemplo do tipo de jogador de classe que o Benfica bem precisava, sobretudo num setor da equipa, digamos assim, onde muito se organiza e cria para que a equipa, possa, depois, concluir, que é, como está bom de ver, o setor do meio-campo, onde Enzo Fernández - claramente, creio, muito mais um 8 do que um 6, como porventura alguns julgarão, ainda que, pela natureza da sua ‘liderança’ de jogo, se ‘encoste’ muitas vezes aos centrais, para construir, a três, a partir de trás - surge, neste início de nova época, como a estrela principal e o fio condutor decisivo para que o novo Benfica se projete como equipa capaz de criar renovadas e justificadas expectativas aos seus adeptos, ansiosos por voltar a ver na águia o futebol entusiasmante de outros tempos e, sobretudo, a confiança e a determinação que lhe permita voltar verdadeiramente a discutir as diferentes competições e a ser capaz de voltar a fazer ‘boa figura’ no caso de entrar na Champions.
É verdade que Enzo Fernández está, de momento, com um ritmo de competição um nível acima dos companheiros, uma vez que estava sensivelmente a meio da época no futebol argentino, de onde veio, logo que o River Plate, seu anterior clube, se viu eliminado, já no início de julho, da Taça dos Libertadores. Seja como for, por alguma razão mais Enzo Fernández se destaca já no futebol que o treinador Roger Schmidt procura construir com os jogadores que tem. E deixem-me correr o risco: não será fácil, mesmo a uma equipa do Benfica que parece, até agora, entusiasmar, conseguir acompanhar a velocidade com que o jovem argentino pensa, a qualidade com que executa e a forma simples como joga!
VOLTO à questão da classe para a acrescentar que a classe, no futebol, é, em boa medida, parte do que diferencia as grandes equipas das equipas que, sendo de grandes clubes, não chegam a ser grandes equipas. Podemos dizer, julgo, no caso do Benfica, que ainda faltará mais classe, para juntar à classe que Enzo Fernández realmente tem, e à classe que o jovem brasileiro Neres, num estilo diferente, também promete acrescentar, numa dose, à partida, com bastante mais sal e pimenta do que, infelizmente para ele, Everton alguma vez, na verdade, conseguiu temperar as águias, por inadaptação, incapacidade ou, simplesmente, falta de energia positiva no contexto que veio encontrar no Benfica e em Lisboa.
Já conseguiu Enzo Fernández que os benfiquistas reconheçam ter o Benfica feito, na verdade, fantástica operação, porque jogadores da qualidade de Enzo Fernández são evidentemente muito difíceis de contratar para o futebol português, apesar de grandes clubes como Benfica e FC Porto terem conseguido, sobretudo nos últimos dez anos, resgatar muitos craques, especialmente sul-americanos, que olham para este cantinho da Europa como boa entrada para as grandes Ligas e para o mais rico futebol do mundo.
Ao vermos como joga este Enzo, podemos imediatamente levantar uma outra questão: quanto tempo permanecerá em Portugal? O jovem médio argentino, apesar da juventude dos seus 21 anos (fará 22 em janeiro de 2023), mostra em campo atributos excecionais: pensa realmente muito rápido, define normalmente bem e joga simples, que é mesmo o mais difícil no futebol.
A isso chama-se classe, e classe, como a capacidade de liderança, é algo que não se ensina; ou se tem ou não se tem. E Enzo tem!
Aclasse, no futebol, custa muito dinheiro, naturalmente, e é bom não esquecer que a classe de Enzo Fernández pode vir a custar ao Benfica qualquer coisa 18 milhões de euros. A classe, o talento, a qualidade extra em determinadas características, não devem, sobretudo pelos clubes portugueses, serem, porém, vistas como custo, mas sim como investimento. O que é preciso é saber escolher... e escolher bem!
A capacidade de Darwin também custou ao Benfica muito dinheiro, e muito mais dinheiro veio, afinal, a render-lhe, como há muitos, muitos meses aqui escrevi, antevendo (sem qualquer mérito, note-se) que o dinheiro que Darwin viesse a render ao Benfica, chegaria, praticamente, para pagar o investimento feito na equipa quando, há dois anos, o então presidente do Benfica, Filipe Vieira, decidiu ir ao Brasil buscar, de novo, Jorge Jesus.
Tal como Darwin, não tenho nenhuma dificuldade em acreditar que Enzo Fernández, mesmo que venha a custar 18 milhões ao Benfica (por causa de objetivos que se desconhecem), irá render, certamente, aos cofres da Luz os largos milhões que um dos poderosos clubes da Europa rica acabará por pagar por ele, quando, porventura já daqui a um ano, ficar definitivamente claro que médios como Fernández estão destinados aos melhores palcos dos melhores campeonatos. É o meu palpite!
TENHO outros palpites relativamente à equipa e ao futebol do Benfica, como o de considerar que o Benfica continua a ter o problema de não ter um verdadeiro e bom jogador para a posição 6, o ‘velho trinco’, como mais gosto de chamar-lhe. Creio que o último 6 a sério que o Benfica teve foi o sérvio Fejsa, e, daí para cá, tem andado, creio, equivocado com Samaris, Florentino ou Julian Weigl, que, disfarçando uns melhor que os outros, não são, a meu ver, o 6 que o Benfica, na realidade, me parece precisar. Não sei se vai ser Fredrik Aursnes, o norueguês do Feyenoord de quem se fala, ou outro qualquer, mas algum vai ter de ser se o Benfica quiser, na verdade, ganhar outra dimensão.
Por outro lado, e só para concluir esta minha dose, para já, de palpites encarnados, creio poder estar o Benfica, com o jovem talentoso Henrique Araújo (com todo o respeito pelo generoso e muito aplicado Gonçalo Ramos), à beira de encontrar uma espécie de ‘novo Pedro Pauleta’ para o futebol português (talvez até melhor tecnicamente, o grande Pauleta que me perdoe!...).
Para já, comparação feita pelo estilo de movimentação e, mesmo nas oportunidades não concretizadas - como voltou a suceder, ainda esta semana, no jogo com os dinamarquês do Midtjylland -, pela simplicidade com que o jovem Araújo procura finalizar - por vezes, apenas um toque na bola e… golo, um bocadinho à imagem, posso ir até mais longe, julgo, com a devida diferença, mais todo o respeito e consideração que os ’monstros’ me merecem, do inigualável Nené, esse símbolo ímpar do Benfica, que o famoso ‘tribunal da Luz’ demorou a compreender e a aceitar como um dos maiores avançados que o futebol português contemporâneo teve o privilégio de conhecer. Ora reparem no estilo de Henrique Araújo (vai longe, o miúdo, aposto) e digam-me se concordam. Ou não.
PS: Têm-me parecido absolutamente surreais as acrobacias que vejo serem feitas por quem se contorce para trás e para a frente para argumentar em defesa do FC Porto no caso de investigação de doping que afetou, e de que maneira, banindo-a do pelotão da Volta a Portugal deste ano, a equipa de ciclismo da W52/FC Porto. A última que ouvi foi que a W52 e o FC Porto são meros patrocinadores de uma equipa cuja responsabilidade, diz-se, estaria, exclusivamente, num clube que dá pelo nome de Associação Calvário Várzea Clube de Ciclismo. Não sei, com franqueza, se deva rir, se chorar.
Evidentemente que ninguém pode acusar os responsáveis do FC Porto, ou mesmo um homem como Adriano Quintanilha (há anos ligado ao ciclismo através do seu império empresarial), de serem os ‘promotores’ de uma realidade que as autoridades judiciais e antidopagem consideram, hoje, altamente suspeita e que envolvem corredores e outros responsáveis da equipa que a W52 e o FC Porto decidiram, há seis anos, continuar a pôr em competição. FC Porto e W52 não têm culpa? Acredito. Mas não resumam as duas entidades ao papel de ‘meros patrocinadores’, nem se achem surpreendidos: já em 2017 e 2018 foram retiradas as vitórias na Volta a Portugal a um seu corredor, o espanhol Raúl Alarcón, por «uso de métodos e/ou substâncias proibidas». Os gatos podem ter andado escondidos, mas há muito que os rabos estão de fora…