A bênção. E a sina!

OPINIÃO22.02.201903:11

Na Turquia, o Benfica foi quase sempre uma equipa melhor sem bola do que com bola. Foi melhor sem bola porque mesmo os mais jovens jogadores encarnados têm muita escola e sabem taticamente muito dos diferentes momentos do jogo e são muito solidários a defender. E foi pior com bola por maior imaturidade e menor experiência daquele eixo central do meio-campo mas também pela menor capacidade de construir a partir de trás, com a alteração surpreendente que o treinador fez também dos dois laterais. Foi o Benfica em Istambul uma equipa bem mais incapaz de controlar o jogo, o que não surpreendeu, apesar de tudo lhe ter corrido tão bem e bem melhor do que qualquer encomenda, como diz a sabedoria popular…

Agora, na Luz, a águia já foi bastante melhor com bola, também porque Bruno Lage arriscou bem menos, mantendo, creio que acertadamente, a estrutura defensiva, ao contrário do que tinha feito em Istambul, quando, recordo mais uma vez, decidiu jogar com Corchia e Yuri Ribeiro num onze que já surpreendia por ter Florentino e Gedson no chamado meio-campo defensivo.

Por ter mexido menos no onze, Bruno Lage garantiu, creio, uma equipa mais consistente com a bola e menos vulnerável do que foi no jogo da primeira mão, no qual duas ou três intervenções de Vlachodimos foram muitíssimo importantes, se bem se lembram, para o Benfica poder trazer para Lisboa a vantagem que lhe deu, afinal de contas, o conforto para o que veio a ser o sucesso numa eliminatória difícil, frente a um Galatasaray muito adulto e bem mais forte na estrutura física dos jogadores, como se viu, ao levaram vantagem sempre que o duelo se impunha mais físico do que técnico.

Seja como for, com mais ou menos risco, o que Bruno Lage está a conseguir, na verdade, mais do que recolocar a equipa no caminho do bom futebol, do futebol que agrada aos adeptos, daquele futebol (como nos tempos de Jesus) positivo, arriscado, ofensivo, que procura mandar no jogo, mais do que tudo isso, repito, o que Bruno Lage está a conseguir é devolver a confiança e o entusiasmo aos adeptos e a alegria e a autoestima aos jogadores. E isso, nos tempos que foram correndo pelos lados da Luz, é a bênção que, há mais ou menos dois meses, já poucos esperariam possível esta época.

Uma bênção que Lage está, para já, a saber construir, juntando algumas decisivas peças ao puzzle que é sempre o trabalho de um treinador de futebol, a começar pelo sinal de inteligência que deu ao fazer a equipa regressar ao 4x4x2 que foi sempre a marca do Benfica de Jorge Jesus (que tanto sucesso teve) e com o qual Rui Vitória conseguiu ganhar tudo o que ganhou na Luz.

Lembro aliás que quando decidiu alterá-lo para o 4x3x3, Vitória perdeu tudo o que tinha para perder. E acabou como acabou.

Lage não foi nisso. E o resultado já está à vista.

ADMITO, evidentemente, que Marcel Keizer se sinta ainda com condições de continuar a trabalhar no seu projeto de equipa no Sporting apesar da eliminação da Liga Europa, da circunstância difícil que para uma equipa como a dos leões sempre significa ocupar a 4.º posição na Primeira Liga e do cenário para já de desvantagem que leva para a 2.ª mão da meia-final da Taça de Portugal que joga com o rival Benfica.

O que também admito é que os adeptos leoninos possam vir a não ser muito mais tolerantes com o treinador holandês se a equipa não for capaz de inverter os resultados, mais até do que as exibições.

O Sporting de ontem foi, apesar da eliminação, muito melhor do que o Sporting do jogo da primeira mão, onde verdadeiramente creio que o Sporting perdeu esta eliminatória.

E a questão da insatisfação dos adeptos leoninos nem estará tanto no futebol que o Sporting já mostrou que é capaz de jogar, como sucedeu, no último fim de semana, quando asfixiou o Braga em Alvalade e lhe deu um valente murro no estômago, e até no futebol que apesar de tudo mostrou ontem em Espanha, com um onze e um modelo de jogo que parece ser muito difícil de bater.

O problema estará mais nalgumas incoerências do treinador holandês e nalgumas opções mais incompreensíveis. A verdade é que pareceu desvalorizar muito mais a primeira mão desta eliminatória, quando se exigia, com mais ou menos gestão do plantel, com maior ou menor preocupação relativamente aos jogos para o campeonato, que não se deixasse abater por um adversário espanhol que estava muito mais do que ao alcance dos leões.

Claro que é agora fácil atribuir a algumas das opções de Keizer as razões deste fracasso europeu, quando se esperava que o Sporting fizesse, na realidade, bem melhor do que fez. Mas creio que também ontem Marcel Keizer não soube interpretar da melhor maneira o que o jogo com o Villarreal pedia quando, já na segunda parte, o resultado estava ainda favorável ao Sporting mas já o Sporting jogava com dez e parecia mais ou menos claro que a presença de Bas Dost em campo se tornava cada vez mais desnecessária, que obrigar Bruno Fernandes a ser demasiado tempo lateral-esquerdo era absolutamente criminoso e que se tornaria cada vez mais perigosa a cada vez mais evidente atitude da equipa juntar as suas linhas cada vez mais perto da sua área.

Se assim parecia, assim veio a confirmar-se. Não foi o golo do Villarreal francamente consentido?

Não estava Bas Dost claramente de rastos? E não terá sido por estar de rastos  (metendo o pé onde devia ter posto a cabeça...) que ele foi incapaz de concretizar aquela bola de golo tão bem colocada pelo pé direito (e até parecia com a mão!...) desse talento excecional que é Bruno Fernandes?

Pena, para os sportinguistas, que Keizer não tenha feito em Lisboa o que fez em Espanha, e pena também que Jefferson não tenha conseguido evitar uma expulsão que, sim, acabou também por colocar definitivamente em xeque a qualificação leonina, quando ainda faltavam, é bom não esquecer, 40 minutos para se jogar.

Não ter paz e ver-se obrigado permanentemente a refletir tem sido nos últimos tempos, para angústia dos adeptos, a sina do Sporting.

Triste sina! A sina que o leão tem de começar por vencer!

JULGO que foi Jorge Jesus francamente feliz (e sábio) na forma que encontrou para retratar um pouco o valor, o talento, o potencial do jovem  João Félix, que tanto se tem mostrado à Europa do futebol sobretudo desde que Bruno Lage substituiu Rui Vitória no comando da equipa do Benfica. Disse Jesus mais ou menos isto, que o jovem Félix tão depressa parece ter coisas de Rui Costa, como parece ter coisas de Kaká, e é isso mesmo, só mesmo alguém que sabe tanto de futebol como Jorge Jesus para retratar de forma tão feliz o talento de um jovem jogador que tem tanto para crescer como tem de potencial valor para se tornar no futuro uma das grandes figuras do futebol português.

Há, no entanto, algo que desde o princípio me impressiona no futebol de João Félix, que nunca vi, na realidade, no jogo de Rui Costa ou mesmo de Kaká, que é, por um lado, a capacidade de rematar com os dois pés - lembram-se do golo que não valeu em Alvalade, feito com o pé esquerdo?! -, e, sobretudo, e muito em especial, o jogo de cabeça de Félix, que surpreende, e que nesse aspeto se aproxima mais de um João Vieira Pinto, que tinha, como todos se recordarão, além de muitos outros atributos, um exímio jogo aéreo quando se tratava de atacar em plena área adversária.

ACHO, com franqueza, que Jesus tem ainda toda a razão quando diz, como disse à chegada a Lisboa no último fim de semana, após acertar todos os detalhes da rescisão do contrato na Arábia Saudita, que o seu Al-Hilal vai ganhar tudo que aparentemente tiver para ganhar nas diferentes competições árabes, e vai ganhar tudo porque, sem qualquer dúvida, o que Jesus e sua equipa técnica lá deixaram foi seguramente uma equipa muito melhor e, sobretudo, uma equipa bem mais competitiva.

Terá Rui Vitória, à frente do Al Nassr - principal competidor e rival do Al-Hilal - de esperar ainda para viver algum sucesso no futebol saudita, mesmo já sem Jesus.

Jesus que já está, como se sabe, de volta a Lisboa porque decidiu não aceitar renovar o contrato com o Al-Hilal, mesmo desperdiçando (em favor do coração que há muito parecia chamá-lo para casa) a possibilidade de continuar a ganhar muitos mais milhões de euros ainda.

O tempo dirá se fez bem ou mal.