Confirmação da nova ordem

OPINIÃO11.05.202206:55

FC Porto campeão, Sporting com pontuação de campeão e Benfica mais longe do que na época passada. Daí falar-se em revolução na Luz

R ESUMO da temporada em três pinceladas. FC Porto campeão com mais um triunfo e mais uma festa na Luz. Igualou o recorde de pontos (88) em 34 jornadas e pode terminar com pontuação recorde (89 ou 91) na recepção ao Estoril, sábado. Sérgio Conceição tornou-se o terceiro treinador portista tricampeão nacional (2018, 2020, 2022) depois de Artur Jorge e Jesualdo Ferreira, e pode tornar-se o primeiro a completar duas dobradinhas se o FC Porto vencer a final da Taça de Portugal contra o Tondela. É muito possível que sim. Só falta um título europeu a Sérgio para coroar o seu tempo no Dragão. O título portista foi justo e teve uma vez mais a cara de Conceição, um adepto ferrenho do clube que é também um grande treinador de futebol. Não esquecer que ele perdeu o melhor jogador da equipa em janeiro (Luis Díaz) basicamente pela incapacidade de a administração do clube de ter as contas em dia. 

O FC Porto jogou o melhor futebol da era Conceição e arranjou espaço no onze principal para vários jovens da formação com grande potencial - Diogo Costa, João Mário, Fábio Vieira e o sensacional Vitinha. O único falhanço portista aconteceu na Europa. Mesmo aceitando que o grupo da Champions era muito difícil e que o FC Porto merecia mais que empates em Madrid e Milão, facto é que o não passou da fase de grupos e num total de dez jogos europeus (contando com a Liga Europa) ganhou apenas dois.  A grande preocupação da nação portista prende-se com a continuidade ou não de Sérgio Conceição. Pinto da Costa veio a público dizer que isso não é tema porque Sérgio tem mais dois anos de contrato, mas ele próprio saberá que esse facto não é impeditivo de coisa alguma - em abril de 2017 Sérgio tinha renovado com o Nantes até 2020 e Pinto da Costa foi lá buscá-lo à mesma. 

O Sporting termina vice-campeão, muito provavelmente com pontuação de campeão. Se ganhar ao Santa Clara em Alvalade iguala os 85 pontos da época passada, que lhe dariam para terminar em primeiro em 14 dos 19 campeonatos com 34 jornadas. Ou seja: o objetivo do bicampeonato (última vez em 1954) não foi conseguido, mas a equipa continuou forte e competitiva, ao contrário do que era habitual nas épocas pós-título em Alvalade (muitas vezes com quedas a pique para o 3.º e até 4.º lugar). Os milhões da qualificação automática para a Champions foram conseguidos com folga e Amorim, além das duas conquistas domésticas (Supertaça e da Taça da Liga), qualificou, logo à primeira tentativa, a equipa para os oitavos de final da Champions num grupo difícil. O Sporting foi o único entrave ao poderio portista, confirmando-se os sinais da época passada que já sugeriam luta feroz a dois. Creio que o Sporting parte para a próxima temporada mais rodado, mais experiente e mais consciente do que tem de fazer para voltar a ganhar o campeonato. A luta continua.
 


Festa do título do FC Porto, junto ao Estádio do Dragão, depois de vitória sobre o Benfica no Estádio da Luz 


O Benfica mudou de presidente, mudou de treinador, mudou de táctica, mas não mudou de desempenho: ganhou nada e terminou em terceiro. Época muito pobre em termos domésticos (mais longe do Sporting e do FC Porto que na época passada) e novo falhanço no acesso automático à Champions com todos os problemas que essa indefinição acarreta na preparação da próxima temporada. Seis derrotas na Luz (!) e um balanço terrível nos duelos com os rivais históricos (uma vitória contra cinco derrotas, algumas com amassos incluídos) caracterizam a falta de competitividade de uma equipa absurdamente cara para a relação custo/desempenho. Aposta em Veríssimo não resultou de todo, pelo contrário, e os golos de Darwin - belo jogador! - serviram apenas para lhe elevar a cotação e financiar operações de mercado. Único ponto positivo: a campanha na Champions, com qualificação num grupo difícil (mérito de Jorge Jesus) e eliminação do Ajax (mérito de Veríssimo), ainda que conseguida com futebol pouco entusiasmante. A contratação de Roger Schmidt e a promessa de uma revolução no plantel vão animar nos próximos meses os benfiquistas. Este é o tempo dos amanhãs que cantam. Depois se verá.     

PS - Pinto da Costa celebra 40 anos na presidência portista com o 23.º campeonato e o 64.º título no futebol (sete deles internacionais). Benfica (36) e Sporting juntos (24) somam 60 títulos nesse período. 


NADAL E ALCARAZ, FIGO E RONALDO 

I MPRESSIONANTE explosão do jovem tenista Carlos Alcaraz (acaba de completar 19 anos), que venceu de forma imperial o Masters 1000 de Madrid depois de dar cabo, sucessivamente, das lendas Rafael Nadal e Novak Djokovic, e do alemão Alexander Zverev, este, na final. A Espanha ficou de cabeça perdida. «Charly, eres buenísimo», dizia a manchete da Marca na segunda-feira. Os espanhóis celebram o nascimento de um novo herói desportivo apenas cinco meses depois de Rafael Nadal ganhar o Open da Austrália e tornar-se o recordista absoluto de Grand Slams (21 contra os 20 de Federer e Djokovic). Caramba. Que inveja!

Alcaraz parece, de facto, um fenómeno. Pela qualidade invulgar do seu ténis, sim, mas sobretudo pela naturalidade (chega a parecer fácil) com que rentabiliza os dotes técnicos, físicos e mentais que todos os especialistas lhe reconhecem. E isso é sempre o mais importante: transformar o potencial em algo mais concreto: vitórias e títulos, que é disso que o desporto se alimenta. Charly ganhou todas as finais que disputou até ao momento, é o tenista com mais vitórias e títulos em 2022 e, no espaço de um mês, limpou dois Masters 1000 (Miami e Madrid) que não constam no currículo de muitos tenistas consagrados. Nadal tem 35 anos e, como o nosso Ronaldo, infelizmente não é eterno. É possível que a Espanha tenha encontrado em Alcaraz o sucessor do monarca reinante. Lembro que Nadal é unanimemente considerado o maior tenista e também o maior atleta espanhol de sempre.

Nós, portugueses, tivemos essa felicidade já neste século, com a transmissão imediata da coroa de Figo para Ronaldo sem o enorme hiato (cerca de 30 anos) que mediou entre o reinado do king anterior, Eusébio, e a entronização de Figo. Durante muitos anos, Eusébio e a memória dos seus feitos reinaram sem discussão e sem continuador no panorama desportivo nacional. Até surgir Figo - líder da geração de ouro trabalhada por Carlos Queiroz - que foi o primeiro futebolista português a ser estrela numa grande equipa europeia. Figo teve a melhor carreira de um futebolista nacional além-fronteiras até surgir Cristiano: foi ídolo em Barcelona e Madrid, campeão europeu e mundial, Bola de Ouro, craque de dimensão e reconhecimento global. 

Estava Figo a caminho da reforma, como Nadal, e já brilhava a seu lado na Selecção um jovem fenómeno como Alcaraz: Cristiano Ronaldo. Que não demorou muito a suplantar por larga margem tudo o que Figo e Eusébio haviam feito… até se transformar naquilo que é hoje.