João Figueiredo: «Não é honesto dizermos que somos candidatos a títulos»

João Figueiredo: «Não é honesto dizermos que somos candidatos a títulos»

BASQUETEBOL16.10.202309:17

Apesar de duas sensacionais vitórias frente ao Benfica, na Luz, no espaço de 48 horas, treinador da Oliveirense mostra-se com os pés bem assentes na terra. Quer equipa no top 4 pois sabe que é difícil competir com os três grandes, mas ambiciona estar nos momentos decisivos da Taça da Liga e Taça de Portugal e aí... quem sabe. Procura ainda um quinto estrangeiro que faça a diferênça na equipa e na competição.

Com duas sensacionais vitórias na Luz ante o bicampeão Benfica, no espaço de 48h, a primeira, quarta-feira, num jogo em atraso da 1.ª jornada da Liga Betclic (73-74), e sexta, para o arranque da XV Taça Hugo do Santos (71-78), a Oliveirense é a equipa sensação da semana. O que pretende, como se encontra e como foi viver, planear e gerir as emoções do grupo, foi o que quisemos saber junto do treinador João Figueiredo, na liderança do conjunto pela segunda temporada.

«Como é óbvio, saímos felizes pelos resultados e pela forma como competimos nos dois jogos, mas também pela consistência apresentada. Parece-me que é demasiado cedo para mostrarmos alguma química e conexão entre os jogadores, mas parecia um grupo que já jogava a algum tempo junto, quando não é verdade», conta o técnico, de 44 anos. 

«Não esperava ver isso, porque estamos com sete semanas de preparação e, ainda por cima, não atuámos na 1.ª e 3.ª jornada do campeonato – basicamente fizemos um jogo com o Esgueira, um torneio com o Esgueira e Póvoa e encontros frente a formações da Proliga. Uma vez que, nesta fase, o Benfica estava com ritmo competitivo de nível europeu, não esperávamos o que fizemos», reconhece. «Por isso estamos felizes com o que atingimos». 

«Foi um conjunto de fatores… alguns que não conhecemos»

E qual foi o segredo daquelas vitórias? O que é que sabia de como o Benfica atua que transmitiu ao grupo. É que não foi vencer na Luz uma vez. Foram duas. Seguidas! De certeza que o Benfica já não tinha gostado de ter perdido a primeira. «Sim, de certeza… Mas, honestamente, penso que foram um conjunto de fatores. Provavelmente também haverá alguns que desconhecemos», deixa no ar.

«A nível interno, porque tem mais talento físico e técnico, o Benfica quer destruir os adversários com um ritmo elevado. Se virmos os jogos antes com o Esgueira e V. Guimarães, foram poucas as situações em que fizeram ataques com mais 14/15 segundos. Por terem muito campo aberto e serem fisicamente superiores, não necessitam de ter complexidade tática. Criam situações de superioridade numérica ou espacial, momentos de um contra um ou dois contra dois. Resolvem a partir daí. Já era assim o ano passado», recorda.

Colocar o Benfica a jogar a meio-campo

«Assim, se tivermos atenção a isso, taticamente temos de colocar o Benfica a jogar a meio-campo. É a base para tentar competir com eles, ou para não ser dizimado. Sempre que os adversários deixam correr uma equipa daquelas têm bastantes dificuldades. Essa é a ideia base», comenta. «E está associada àquilo que é uma das marcas da Oliveirense antes mesmo de vir para o clube: tentar controlar ritmos de jogo. Para mim, isso é fundamental desde o primeiro dia de trabalho», revela.

«Sinceramente, na época passada pareceu-me que eramos a melhor equipa a fazê-lo. Nesta, embora ainda com poucas semanas, conseguimos pô-la em prática e talvez tenha causado algum nervosismo ao Benfica, saiu da zona de conforto. Penso que poderá ter sido um bocado por aí», acaba por analisar. 

Mensagens com impacto quando se vence

Mas, pela longa experiência como jogador e já como treinador, depois da primeira vitória sentiu necessidade de acalmar no grupo uma possível alegria em demasia? Até porque teria de voltar à Luz passados dois dias? «Sim, mas não só por aquela vitória. É sempre que ganhamos. As mensagens têm um impacto maior quando vencemos. Quando perdemos, por norma, há maior facilidade de exprimir frustrações e críticas. Normalmente ajo ao contrário. Daquela vitória, ou outra qualquer, o importante retirar é sabermos a nossa realidade. Aquilo que é o nosso plantel e condições para a construção, o recurso que temos para ir ao mercado. Por alguma razão ainda não temos o quinto estrangeiro. Somos os únicos com quatro estrangeiros», faz questão de salientar o antigo internacional luso. 

À procura de alguém diferenciador

Não tem porque considera que ainda não é o momento, para ver o que realmente necessita? Ou porque ainda não encontrou o que quer? Dentro do orçamento que tem. «Não existe porque não quero ter apenas mais um. Gostava de adquirir alguém diferenciador, tanto na equipa como na competição», responde de imediato. «Neste momento, não conseguimos ter recursos suficientes para haver esse tipo de jogador. Vamos aguardando… Mas isso traz-nos coisas boas: cada elemento sabe exatamente o seu papel e aumenta os minutos em campo de todos. Por outro lado, prejudica-nos, por exemplo, nos treinos porque temos de adaptar jogadores de posições exteriores a interiores».

Fotografia Facebook Oliveirense

E quando começou a época, o que lhe foi pedido? Tentar lutar com os três habituais candidatos? Garantir logo os lugares imediatos? Já agora, após este dois resultados, onde pensa que a equipa pode chegar? «O clube tem um passado presente de alguns títulos. Foi bicampeão nacional [2017/18, 2018/19], ganhou quatro Taças da Liga, duas Supertaças… e foi mantendo alguma competitividade entre os quatro/cinco primeiros a nível nacional. Mas quando o Sporting regressou o panorama alterou-se completamente», vai explicando Figueiredo.  

Jogador português complicado de recrutar

«Primeiro, o número de estrangeiros subiu e, como foi obvio, depois da Oliveirense ganhar títulos numa competição em que estão três ditos grandes, as coisas tornaram-se bastante mais difíceis. Até porque os recursos não são os mesmos. Antes de chegar á Oliveirense o clube já não estava no top 4. Depois retomou essa posição, chegou à meia-final e na época passada voltámos a ficar no 4.º lugar na fase regular e fomos eliminados pela Ovarense nos quartos do play-off», recorda.

«Até pelo contexto da competição, quando Benfica, FC Porto e Sporting começam a inflacionar orçamentos, o jogador português torna-se mais complicado de recrutar para clubes como nós e outros. As diferenças claramente agudizam-se. Por isso, acho que não é honesto dizermos que somos candidatos a títulos. Considero que seria desrespeitoso para com outras equipas que recrutam em panoramas completamente diferentes», diz com humildade. «São realidades orçamentais sete vezes superior à nossa», faz questão de destacar.

«Agora, a nossa ambição – clube, minha e dos jogadores – passa por nos situarmos nos quatro primeiros e tentar competir da melhor forma possível para que possamos estar em momentos de decisões: Final Four da Taça da Liga e da Taça de Portugal. Depois tudo pode acontecer, são dois jogos. Essa é a ambição pessoal», comenta o líder do conjunto de Oliveira de Azeméis.

«Estou satisfeito na Oliveirense»

E sente-se realizado na Oliveirense? «Estou muito satisfeito de ter oportunidade de trabalhar num clube como a Oliveirense. Claro que tenho a minha ambição. Com o trabalho diario, ao longo da época e investimento em informação é obvio que tenho ambições. Mas, neste momento, estou muito bem. Num local de que gosto. Temos boas condições e estruturas, quer em termos de logística como de necessidades de uma equipa quase profissional. E contamos com um pavilhão onde existem muitas horas para treinar. Há soluções, no dia a dia, que nos permite trabalhar com competência. Provavelmente, nem todos os clubes têm estas condições, mas com diferenças de plantel para os grandes. Estou satisfeito», volta a garantir.

O que disse Norberto Alves

E agora uma curiosidade, até por ter sido treinador bicampeão pela Oliveirense, no final Norberto Alves deu-lhe os parabéns? Ainda que apenas tenha ganho dois jogos, nada mais. «Parabéns não, até porque não tinha de o fazer. Cumprimentou-me. Cumprimos as rotinas que fazemos sempre após um jogo: cumprimentamo-nos e dizemos ‘bom jogo’. Faz parte da modalidade, percamos ou ganhemos. Foi o que o Norberto fez», concluiu João Figueiredo.