CIF: o primeiro 'grande' do futebol português que sonha voltar à ribalta
Equipa do CIF que venceu o primeiro Campeonato de Lisboa (CIF)

Pelos caminhos do futebol CIF: o primeiro 'grande' do futebol português que sonha voltar à ribalta

NACIONAL30.04.202509:40

No Pelos Caminhos do Futebol desta semana, A BOLA foi até ao Parque Florestal de Monsanto conhecer a história de um dos clubes mais importantes nos primórdios do futebol português, que rivalizou com Benfica e Sporting e que chegou a vencer... o Real Madrid 

Se perguntarmos a qualquer pessoa quais são os «grandes» do futebol português, muito provavelmente, as respostas recairiam sobre os mesmos três clubes. No entanto, se a mesma pergunta fosse feita no início do século XX, entre as respostas possíveis, estaria certamente o nome do Club Internacional de Foot-ball.    

Entre a paisagem verdejante do oásis lisboeta que é o Parque Florestal de Monsanto, está um clube centenário, com uma história riquíssima, recheada de troféus, e que chegou a bater o pé ao Sporting, ao Benfica... e ao Real Madrid.    

Campus CIF (A BOLA)

Fundado em 1902, a história do Club Internacional de Foot-ball, ou CIF, como é conhecido, inicia-se em 1892, ano em que nasceu o Club Lisbonense, como conta o ex-presidente do clube, Ernesto Teixeira: «O CIF nasceu em 1902, mas, na realidade, a história começa muito mais atrás, no Club Lisbonense, que foi fundado em 1892, pelos irmãos Pinto Basto, Guilherme Pinto Basto, o Eduardo Pinto Basto e o Frederico Pinto Basto, o Carlos Villar, o comandante João Costa e outros.»    

Ernesto Teixeira explica tudo sobre a funcação do Club Internacional de Foot-ball
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«Em 1902, quando o Club Lisbonense sentia que não tinha capacidade para ombrear com o Carcavelos Club, que dominava tudo em Portugal, quem estava à frente do Lisbonense decidiu criar um clube para integrar estrangeiros também. Com isso, acabou o Lisbonense e começou o CIF, que nasce no dia 8 de dezembro, dia de Nossa Senhora da Conceição. O clube nasce com vários ingleses e elementos de outras nacionalidades. Por isso é que tem o nome Internacional», disse o ex-líder CIFista.   

Símbolo do CIF (CIF)

Um clube pioneiro

A partir daí, o CIF esteve sempre na vanguarda do futebol luso. Para além de ter estado entre os clubes fundadores dos dois primeiros campeonatos nacionais que existiram, o CIF foi também um dos emblemas que esteve na génese da Associação de Futebol de Lisboa (AFL) e do Campeonato de Lisboa.    

CIF foi um dos fundadores da AFL (A BOLA)

«A primeira liga de futebol [Liga de Foot-ball Association], em 1906, é o CIF quem a funda. Um outro campeonato mais tarde [Liga Portuguesa de Foot-ball], que teve uma liga norte e uma liga sul, em 1908, é um outro CIFista que está na sua génese. E depois mais tarde, a Associação de Futebol de Lisboa, que é fundada em 1910, e onde o CIF está.... Aliás, o CIF é um dos três fundadores que ainda estão em atividade. É o CIF, o Benfica e o Sporting, os outros já desapareceram», contou o antigo dirigente, que nunca escondeu o orgulho ao falar da imensa história do «seu» clube.    

Ernesto Teixeira, ex-presidente do CIF, fala da importância do clube lisboeta nos primórdios do futebol português, inclusive, na fundação da Associação de Futebol de Lisboa
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Mas não foi só estar nos grandes momentos dos primórdios do desporto-rei em Portugal. O CIF assumia-se como uma verdadeira potência futebolística. Com os irmãos Pinto Basto e Carlos Villar (ambos ligados à introdução do futebol em Portugal) como grandes figuras da equipa, o CIF conquistou o primeiro Campeonato de Lisboa, em 1910/11, ficando à frente de Benfica – com quem empatou os dois jogos – e Sporting, que ficou em terceiro lugar e perdeu os dois encontros com os campeões lisboetas.  

Equipa do CIF que venceu o primeiro Campeonato de Lisboa (CIF)

Um fenómeno... em Espanha

E a grandeza do CIF não se restringia às fronteiras portuguesas. Corria o ano de 1907 quando os o emblema de Lisboa se tornou no primeiro clube português a jogar no estrangeiro. No Hipódromo da Castelhana, o CIF venceu por 2-0 o Madrid Foot-ball Club, conhecido hoje como... Real Madrid.    

Ernesto Teixeira, ex-presidente do CIF conta como foi a partida entre o CIF e o Madrid Foot-ball Club, antecessor do Real Madrid, em 1907
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«O CIF foi jogar a Madrid, a convite Madrid Foot-ball Club. Jogaram na Castelhana, teve uma assistência de cerca de 10 mil pessoas e o CIF fez uma exibição muito boa, ficaram todos espantados lá em Espanha com a capacidade futebolística do CIF», começa por contar Ernesto Teixeira.    

«O CIF ganhou 2-0, mas a história não acaba aí, porque o Real Madrid, mais tarde, em 1913, quis a desforra e dirigiu-se às instalações nas Laranjeiras, onde era o campo de futebol do CIF nessa altura. E o Real Madrid veio cá, mas não ganhou, empataram 1-1, pelo que o CIF continua a ter vantagem sobre o Real Madrid», acrescentou.    

Equipa do CIF em 1910 (CIF)

Mas há mais. Dois anos depois de brilhar em Madrid, o CIF foi novamente convidado para voltar ao país vizinho para um torneio, desta feita em Badajoz. Com as tradicionais camisolas de listas pretas e brancas, o CIF apresentou uma equipa composta por jogadores portugueses e ingleses.

Perante cerca de quatro mil espectadores, a formação portuguesa dominou o Sport Club Bacense vencendo por 3-0, naquele que foi o primeiro troféu internacional conquistado por um clube português e mais uma página dourada na história do CIF.  

 A decisão que chocou Portugal 

Contudo, na década de 20, tudo mudou. Com as equipas a ficarem cada vez mais profissionalizadas, o CIF tomou uma decisão que provocou um terramoto no mundo do futebol luso. Fiel aos ideais do amadorismo e do desporto pelo desporto, o clube lisboeta optou por retirar-se das competições oficiais. Uma escolha que perdura até hoje.    

«O Benfica, o Sporting e outros clubes na altura começaram a ter outra filosofia do desporto. Começou a haver pagamentos. Primeiro começou com o pagamento dos bilhetes do elétrico, depois eram os lanchezinhos, depois paga-se o almoço. E os jogadores começaram a ser aliciados a mudarem de clube. E o CIF começa a ter uma sangria. Começa a ver os seus jogadores irem para outros clubes e começa a enfraquecer a sua atividade», referiu Ernesto Teixeira.    

O ex-presidente do clube lisboeta, Ernesto Teixeira, conta tudo sobre a decisão de deixar as competições oficiais, em 1924
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«Enquanto a competição foi amadora, o CIF foi-se mantendo. Mas chegou uma determinada altura em que a competição ganhou outro cariz. A situação já não era igual. E o CIF disse: 'Acabou, isto não pode continuar. Nós não podemos continuar por esta via’. É nessa fase que o CIF abandona as competições oficiais, em 1924», acrescentou o ex-presidente, que nem quer ouvir falar em profissionalizar o clube.    

«Nunca. Impossível. Nós somos um clube dos sócios para os sócios, em que defendemos os ideais olímpicos e o desporto por desporto. Dentro do princípio do amadorismo puro» afirmou, apesar de admitir que o emblema lisboeta podia rivalizar ainda hoje com os «grandes» lusos, se tivesse optado por seguir outro caminho.    

Ernesto Teixeira, presidente do CIF, admitiu que o emblema lisboeta podia rivalizar ainda hoje com os 'grandes' lusos, se tivesse optado por seguir outro caminho
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«Se o CIF tem optado por começar a pagar aos jogadores e entrar no profissionalismo, não sei se seria maior que o Benfica e que o Sporting, mas na altura, o CIF até era maior. O CIF simplesmente ficou pelo caminho porque não quis seguir essa via. É uma via diferente. Optou pelo amadorismo e o Benfica e o Sporting optaram pelo profissionalismo. São vias totalmente diferentes», afirmou.    

O CIF de hoje 

A história do CIF mudou, mas não acabou. Assente no apoio incansável dos sócios, dos anos 20 para cá, o clube tem superado todos os obstáculos para se manter vivo e continuar a ter sucesso em várias modalidades, nomeadamente, no ténis - tendo uma das maiores escolas do país -, no basquetebol – onde conquistou inúmeros títulos nas décadas de 60 e 70 – e no atletismo – tendo sido um dos principais emblemas da modalidade, até meados do século XX.     

O museu do clube, repleto de taças, galardões e todo o tipo de títulos e conquistas, sob o olhar atento de todos os presidentes que fizeram parte da história do clube, espelha bem essa natureza eclética e vencedora do CIF, que tanto orgulha os sócios.  

Sala CIF (A BOLA)

Quanto ao futebol, hoje o CIF é um clube que aposta seriamente na formação das estrelas do amanhã, nas palavras do presidente Fernando Magarreiro: «O CIF é hoje um clube de formação. Temos benjamins, infantis e juvenis. São nesses escalões que nós damos a formação às crianças sócias do CIF, porque todas são sócias do CIF. Aqui fazem-se homens, fazem-se jogadores, e sempre dentro dos princípios do CIF, do fair play, do olimpismo, da amizade, é isso que nós tentamos preservar e cultivar.»  

Fernando Magarreiro, presidente do CIF, fala sobre a atualidade do clube
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Estádio Pinto Basto (A BOLA)

«Temos uma academia com cerca de 500 alunos. A jogar futebol federado temos cerca de 200 alunos. Temos o gosto de formar crianças, jovens e queremos que joguem com todo o fair play, que é isso que nós queremos. É o nosso intuito», começou por dizer.    

Como parceiro nesta missão, o CIF conta com o apoio do Sporting, numa parceria que dura há mais de 15 anos, como informou Fernando Magarreiro: «É uma parceria que existiu, que existe e que funciona para as duas partes. E temos todo o gosto em ser parceiros do Sporting. O Sporting, como uma equipa grande do futebol português, também tem os princípios dos quais nós nos revemos. E o Sporting também se revê certamente nos princípios do CIF. Daí surgiu esta parceria.»  

Fernando Magarreiro, presidente do CIF, fala sobre a parceria que existe entre os dois clubes da capital na formação de atletas
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Treino no campo do CIF (A BOLA)

Eusébio, Manuel Fernandes e muitos mais

Além da formação, o CIF também se orgulha de ter o torneio amador mais antigo do país, onde participam 17 equipas compostas por sócios do clube (498 jogadores) e que este ano celebra a centésima edição.

Para o vice-presidente, Nuno Teixeira, esta prova é o que distingue o CIF dos restantes clubes: «O que diferencia o nosso clube é este torneio. Não existe outro torneio com estas características, com esta longevidade e com todo o enquadramento que este torneio tem. Por exemplo, o primeiro critério de desempate, que pode determinar o título de campeão, e que já aconteceu várias vezes, não é a diferença de golos entre as equipas, mas sim a disciplina. Ou seja, é uma vertente que se dá imenso valor aqui no torneio é a questão da disciplina, do comportamento dos jogadores em campo. É um torneio único.»   

(A BOLA)

Uma competição que conta com a disputa de um campeonato (com 34 jornadas), de setembro a junho, uma Taça e uma Supertaça, para além da Taça Disciplina, atribuída à equipa mais bem-comportada, e que, ao longo dos anos, já contou com a participação de algumas das grandes figuras do futebol nacional: «Havia uma equipa que participava aqui no torneio, que era a SOV, que em 10 campeonatos ganhava 9 e era fundamentalmente composta por ex-jogadores de Benfica e Sporting

Todos os jogos do torneio são disputados no Estádio Pinto Basto (A BOLA)

«Passaram por aqui jogadores como o Eusébio, o Manuel Fernandes, como o Humberto Coelho, por exemplo, como o Paulo Bento, o Dani, o Sá Pinto, como o Boa Morte, o Silas, o Dimas, o Rebelo, que ainda hoje está muitas vezes connosco nos encontros que fazemos aqui no final da época, é uma presença regular. É um torneio que tem uma grande história e que teve a honra de ter também esses ex-jogadores que fizeram parte da história do futebol português», lembrou.   

Nuno Teixeira, vice-presidente do CIF (A BOLA)

O futuro, sem esquecer o passado  

Com um relvado sintético novinho em folha a adornar o Estádio Pinto Basto, vários courts de ténis prontos a ser utilizados, inúmeros espaços de lazer e condições de fazer inveja a clubes da primeira Liga, os planos do presidente Fernando Magarreiro e da atual direção passam por melhorar ainda mais as instalações do clube, consolidá-lo no panorama nacional e dar a conhecer o CIF.    

(A BOLA)

«Objetivo é consolidar a posição do CIF no desporto local, municipal e nacional. As pessoas vão conhecer o que é o CIF. Há muito interesse no CIF, que esteve sempre na vanguarda do desporto e é isso que queremos manter. Cerca de 20 mil pessoas frequentam o CIF por mês. É muita gente, é muito desporto aqui praticado. Muitos pais cá vêm, é um clube de gente jovem, e os pais frequentam muito o clube porque também se sentem bem em ficar aqui. O CIF é para ficar, dinamizar e pôr o CIF um pouco maior do que já é», afirmou o líder CIFista, sem esquecer os ideais do clube.    

Fernando Magarreiro, líder do clube CIFista, traça os objetivos para o futuro do clube, sem esquecer o passado
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«O profissionalismo leva a muita competição. A competição leva a muito fervor, a muitas confusões, querelas, e os meus antecessores não se reviam nesse tipo de querelas, nesse tipo de guerrilhas. O amadorismo leva a que as pessoas se deem todas bem com amizade, e joguem o futebol pelo futebol, o ténis pelo ténis, o desporto pelo desporto, e não haver aqui outros interesses fora do desporto», considerou.    

«É isso que nós queremos manter, foi decidido pelos meus antecessores e acho que é para ficar. Pelo menos, não vejo aqui outro rumo num futuro próximo», terminou Fernando Magarreiro.    

CIF foi distinguido com as Quinas de Ouro, em 2024, pelo contributo ao futebol nacional (A BOLA)

Um centenário a olhar para o futuro, sem esquecer um passado glorioso, em que teve uma preponderância enorme no início da prática futebolística em Portugal, chegando a tocar o Olimpo do futebol luso, como afirmou Ernesto Teixeira: «O CIF foi o primeiro grande do futebol português, disso não há dúvida.» 

Para Ernesto Teixeira, ex-presidente do CIF, é claro que o clube lisboeta foi a primeira grande potência futebolísitica em Portugal
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