Benfica: penáltis sem especialistas
Ángel Di María falhou o primeiro penálti ao serviço do Benfica (Foto: D. R.)

Benfica: penáltis sem especialistas

NACIONAL31.03.202408:30

Há mais de dois anos que Arthur Cabral não falhava dos 11 metros, mas taxa de conversão é melhor que a de Di María; argentino falha um a cada três; há 20 anos que não se via isto

Arthur Cabral ficou pior na fotografia por ter falhado, na última sexta-feira, dois penáltis consecutivos (mas só o segundo contou, porque o primeiro foi invalidado por violação da área de um jogador adversário), porém foi Ángel Di María quem viu piorar um registo sem consonância com o seu estatuto e dimensão futebolística.

O remate dos 11 metros não concretizado frente ao Chaves, ainda na primeira parte, foi o quinto penálti desperdiçado na carreira do internacional argentino (sem contar com eliminatórias desempatadas por grandes penalidades) em 15 tentativas, o que dá uma taxa de conversão de apenas 67 por cento, longe de serem números de um especialista.

Diga-se, no entanto, que o esquerdino falhou pela primeira vez desde que regressou à Luz, tendo em conta que nas quatro ocasiões anteriores acertou sempre no alvo (Gil Vicente, Toulouse por duas vezes e Rangers).

Numa decisão que partiu dos jogadores, tal como confidenciou Roger Schmidt no final da partida diante dos flavienses, Arthur Cabral foi convidado a apontar o segundo penálti. Certamente porque nos treinos demonstrará essa aptidão, mas porque o registo do brasileiro na carreira até é bastante superior ao de Di María: há mais de dois anos que o avançado não falhava uma grande penalidade.

A última vez que tal ocorreu foi em dezembro de 2021, quando ainda representava o Basileia, tendo entretanto passado pela Fiorentina, de Itália, e marcado a Atalanta e Inter. Em termos absolutos, o brasileiro de 25 anos já bateu 16 penáltis, tendo falhado três (incluindo o segundo com o Chaves, aquele que ficará nos registos), o que se traduz numa taxa de sucesso de 81 por cento — bem superior, portanto, aos números de Di María, o argentino que, em média, falha um em cada três.

Os números dos líderes

E o que é um especialista em penáltis? Geralmente atribui-se o selo a quem tem melhores taxas de conversão, razão pela qual, por exemplo, Messi (78%) é pior do que Cristiano Ronaldo (85%). A regra dos 85 para cima é aquela que melhor define os grandes mestres dos 11 metros. Os 10 melhores da história (desde que passou a haver registos mais rigorosos) apontaram pelo menos três quartos dos remates, nalguns casos houve mesmo quem tivesse conseguido mais de 90 por cento de acerto.

O inglês Matt Le Tissier, glória do Southampton dos anos 90 do século passado, apontou 98 por cento dos penáltis, liderando uma lista (cruzando vários artigos já publicados) onde constam muitos craques do passado: Ortigoza (93%), Mendieta (91%), Hugo Sánchez (91%), Juninho Pernambucano (91%), Batistuta (90%), Bergkamp (90%), Gerrard (88%), Lampard (86%) e CR7 (85%).

Matt Le Tissier, estrela do Southampton dos anos 90, converteu 98% dos penáltis cobrados (Foto: Mary Evans Allstar Paul Mcfegan/IMAGO)

2004: dois penáltis defendidos na Luz

É preciso recuar quase 20 anos para encontrar a última vez que um guarda-redes defendeu dois penáltis num jogo realizado no Estádio da Luz. Foi na 5.ª eliminatória da Taça de Portugal, frente à AD Oliveirense, em dezembro de 2004, quando Vítor, guardião da equipa do concelho de Famalicão, parou os remates de Simão Sabrosa e Tomo Sokota, o que permitiu levar o encontro para prolongamento depois do empate a uma bola no final dos 90 minutos — as águias lideradas por Giovanni Trapattoni acabaram por vencer por 4-1.

Carlos, guarda-redes da AD Oliveirense, frente a Azar Karadas em dezembro de 2004 (Foto: António Pedro Santos)

Na sexta-feira, em casa, o Benfica voltou a ver um guarda-redes brilhar apesar da derrota. Hugo Souza travou as tentativas de Di María e Arthur Cabral, todas para o mesmo lado (direita do guardião brasileiro). Muito previsível, um pouco à imagem do que tem sido a equipa em 2023/2024.

João Mário perdeu o estatuto

João Mário perdeu o estatuto de marcador oficial dos penáltis com o regresso de Ángel Di María ao Benfica, mas continua a ter uma taxa de conversão superior à do argentino. O internacional português falhou apenas quatro vezes na marca dos onze metros em 26 tentativas, o que se traduz em 85 por cento de acerto, 18 pontos percentuais acima do camisola 11 das águias.

Curiosamente, a última grande penalidade convertida por João Mário foi diante do Chaves, na primeira volta do campeonato, jogo que as águias venceram por 2-0 em Trás-os-Montes. Foi aos 80 minutos, quando Di María já não estava em campo (saíra nove minutos antes). Na baliza estava Hugo Souza, o herói sem medalha na derrota dos flavienses no Estádio da Luz — João Neves desfez o sonho do guardião brasileiro, marcando de cabeça o único golo da partida.