Espaço Universidade Borislav Stankovic e David Stern: A força da globalização do basquetebol (artigo de Eduardo Monteiro, 52)
Borislav Stankovic nasceu a 9 de Julho de 1925, em Bihac (Reino dos Sérvios, Croatas e Eslovenos). Enquanto estudante na Universidade de Belgrado conseguiu conciliar os estudos (medicina veterinária) com a vida de jogador de basquetebol nas equipas do Estrela Vermelha/Crvena Zvezda (1946-1948), Zeleznicar Belgrado (1948-1950) e Partizan Belgrado (1950-1953). Ao serviço do Estrela Vermelha foi tri-campeão nacional. Entre 1948 e 1953 foi internacional pela Selecção da Jugoslávia, com a qual participou no 1º campeonato do mundo de basquetebol (1950) efectuado na cidade de Buenos Aires (Argentina). Quando deixou de jogar optou pela carreira de treinador tendo orientado as equipas do Partizan (1950-1953), KK BSK (1953-1958) e do OKK Belgrado (1958-1963 e 1964-1965) com o qual conquistou 3 títulos nacionais e 2 Taças da Jugoslávia.
No ano seguinte viajou para Itália onde exerceu as funções de treinador principal no Pallacanestro Cantú (1966-1969), um dos mais prestigiados clubes do basquetebol italiano, onde conquistou a Liga italiana em 1968. Quando terminou o seu contrato, entendeu regressar a Belgrado onde treinou novamente o OKK Belgrado por mais uma época (1969-1970) para, de seguida, se dedicar à sua profissão de inspector veterinário no controle alimentar da capital Jugoslava. Depois de ter desempenhado as funções de Secretário Geral da Federação de Basquetebol da Jugoslávia ingressou na FIBA na qualidade de Adjunto do Secretário Geral. Em 1976, foi nomeado Secretário Geral da FIBA, em substituição do britânico William Jones que se retirou da actividade após 4 décadas no exercício do cargo.
Borislav Stankovic desempenhou as funções de Secretário Geral da Federação Internacional de Basquetebol (FIBA) durante 26 anos (1976-2002) e, por inerênca do cargo fez parte do Comité Olímpico Internacional (COI) durante vários mandatos. Enquanto máximo gestor dos destinos da FIBA a sua grande preocupação foi a promoção do basquetebol ao nível internacional e efectuar um maior intercâmbio entre o basquetebol FIBA e a NBA, no sentido de proporcionar aos melhores jogadores dos diferentes países situações de jogo com um nível competitivo mais elevado. Em 1991, foi nomeado para o “Naismith Basketball Hall of Fame”, pela sua contribuição no desenvolvimento do basquetebol à escala mundial.
No âmbito do aperfeiçoamento desportivo ao mais alto nível dos jogadores europeus, encorajou alguns dos talentos jugoslavos a ingressar na NBA. Destes, salientamos Kresimir Cosic, Drazen Dalipagic, Vlade Divac, Drazen Petrovic, Dino Radja, Tony Kukoc, Peja Stojakovic, Pedrag Danilovic que marcaram boa presença na liga profissional norte americana. Estabeleceu excelentes relações com o então comissário da NBA, David Stern, no intuito de permitir que os jogadores da liga profissional norte americana pudessem participar nos Jogos Olímpicos em representação dos respectivos países e, nesse sentido, retirou a palavra amador à designação oficial da FIBA. Assim, nos JO de Barcelona - 1992, a selecção dos USA foi a grande atração do evento ao ser constituída pelos melhores praticantes da NBA: Michael Jordan, Larry Bird, Magic Johnson, Charles Barkley, David Robinson, Scottie Pippen, Patrick Ewing, Karl Malone, Clyde Drexler, Chris Mullin, John Stockton e o então o MVP universitário Christian Laettner. O simples facto da seleção norte americana apresentar alguns dos melhores jogadores da história do basquetebol, fez com que a comunicação social lhe atribuisse a designação de “Dream Team”.
David Stern nasceu a 22 de Setembro de 1942, em Manhattan (New York City) e cresceu a ver os jogos do New York Knicks no Madison Square Garden na companhia do pai. Estudou na Universidade de Rutgers onde se licenciou em História (1963) e, de seguida, fez uma licenciatura em Direito na Columbia University. Jogou basquetebol na liga dos advogados de Nova York, mas devido a uma lesão problemática num joelho teve que abandonar a competição. Começou a trabalhar numa empresa de advogados que representava a NBA, tendo sido o principal jurista no diferendo entre o conceituado jogador Oscar Robertson e a NBA. Também participou nas negociações para a fusão das ligas NBA e ABA que, mais tarde, provocou a alteração contratual e a permissão para os jogadores se tornarem “free agents” pela primeira vez.
Entretanto, em 1978, David Stern saíu da empresa de advogados e foi trabalhar como principal conselheiro do então comissário da NBA, Larry O´Brien. Em 1980 foi nomeado para o cargo de vice-presidente executivo da NBA nas áreas de negócios e questões jurídicas o que, em termos práticos, também o tornou responsável pelo marketing, televisão e relações públicas. Em Agosto do mesmo ano, o jornal Los Angeles Times denunciou que 40 a 75% dos jogadores da NBA usavam cocaína, o que deu origem à imediata introdução na liga do teste antidopagem para a resolução do problema da droga no basquetebol profissional. A NBA foi a primeira liga de desportos profissionais nos USA a implementar o controlo anti-dopagem.
O segundo problema que David Stern teve que lidar, foi o da introdução do tecto salarial, que envolveu nas negociações os donos das equipas e a Associação de Jogadores da NBA. Ficou estabelecido que, no sistema de partilhas das receitas, os patrões e jogadores eram parceiros, com os jogadores a receberem 53% de todas as receitas. A resolução destes dois problemas conferiu um enorme prestígio a David Stern, no país e além fronteiras. Entretanto, David Stern foi nomeado Comissário da NBA (1984) que, logo virou os holofotes da comunicação social sobre as grandes estrelas daquela década. Os então líderes das mais prestigiadas equipas, Magic Jonhson (Los Angeles Lakers), Larry Bird (Boston Celtics), Michael Jordan (Chicago Bulls), Charles Barkley (Phoenix Suns), Patrick Ewing (New York Knicks), Hakeem Olajwan (Houston Rockets) passaram a ser o principal factor promocional da NBA no país e além fronteiras.
Durante o seu mandato a NBA expandiu-se para o Canadá (1995) com a criação de duas equipas, os Toronto Raptors (actuais campeões) e os Vancouver Grizzlies, posteriormente relocalizados em Memphis. Face à enorme popularidade que a NBA disfrutava na América do Norte e, em resposta às inúmeras solicitações para a criação de novas formações, a liga profissional fez um estudo de mercado que apontava para um limite de 30 equipas. Nesse sentido, para além da entrada dos Raptors e dos Grizzlies, apenas foram admitidas as candidaturas dos Hornets (actual New Orleans Pelicans), Minnesota Timberwolves, Miami Heat, Orlando Magic e os Bobcats (actual Charlotte Hornets).
Boris Stankovic e David Stern sempre tiveram excelentes relações pois perceberam, de imediato, que as suas ideias para a globalização do basquetebol eram idênticas e que os cargos que desempenhavam lhe conferiam a possibilidade e oportunidade de concretizarem esse objectivo. Deste modo, entenderam que numa primeira fase deveria ser criada uma prova internacional entre as melhores equipas continentais e uma equipa de topo da NBA. Foi assim que surgiu o “MacDonald´s Championship”, patrocinado pela referida empresa, que começou a ser disputado anualmente a partir de 1987 até 1991 e, daí em diante, de 2 em 2 anos tendo terminado em 1999. Nestes torneios participaram os campeões de diferentes continentes e uma formação da NBA que foi sempre a vencedora do torneio, mas com boa oposição das equipas internacionais:
MILWAUKEE – 1987
1º Miwaukee Bucks, 2º Selecção URSS, 3º Milão (ITA);
MADRID – 1988
1º Boston Celtics, 2º Real Madrid (ESP), 3º Selecção Jugoslávia;
ROMA – 1989
1º Denver Nuggets, 2º Jugoplastika (JUG), 3º Milão (ITA);
BARCELONA – 1990
1º New York Knicks, 2º Split Zagreb (CRO), 3º Barcelona (ESP);
PARIS – 1991
1º Los Angeles Lakers, 2º Juventude Badalona (ESP), 3º Limoges (FRA);
MUNIQUE – 1993
1º Phoenix Suns, 2º Virtus Bolonha (ITA), 3º Real Madrid (ESP);
LONDRES – 1995
1º Houston Rockets, 2º Bolonha (ITA), 3º Perth Wild Cats (AUS);
PARIS – 1997
1º Chicago Bulls, 2º Olympiakos Pireu (GRE), 3º Atenas Cordoba (ARG);
MILÃO – 1999
1º San Antonio Spurs, 2º Vasco Gama (BRA), 3º Zalgiris Kauna (LIT).
Estas duas grandes personalidades do Basquetebol e do desporto internacional foram o cérebro que dimensionou o desporto da “Bola ao Cesto” em todo o planeta.
Infelizmente, o ano de 2020 começou da pior maneira para a história do Basquetebol porque, no início de Janeiro, David Stern (77 anos) não resistiu a uma hemorragia cerebral e, em meados de Março, Miroslav Stankovic (94 anos) também partiu para sempre. O Desporto mundial ficou mais pobre atendendo a que ambos foram a FORÇA da globalização do Basquetebol.
Eduardo Monteiro é ex-treinador do SL Benfica e das Seleções Nacionais