O Presidente do Académico Futebol Clube (artigo de José Augusto Santos, 29)

Espaço Universidade O Presidente do Académico Futebol Clube (artigo de José Augusto Santos, 29)

ESPAÇO UNIVERSIDADE28.08.202322:47

O meu colega de curso, Pedro Sarmento, acabou agora a sua missão como professor da Faculdade de Desporto da Universidade do Porto (FADEUP). Foram imensos anos de partilha e objetivos comuns que começaram quando nos sentamos ao lado um do outro no primeiro dia de aulas do ano letivo de 1976-77 que começou um pouco atrasado em 1977.

O Pedro era um miúdo comparando com a maioria dos colegas de curso que teriam quase todos mais 10 anos que ele. Daí ele demonstrar uma aptidão física que superava em muito a média do curso e que resultava da sua anterior experiência desportiva multímoda. A sua experiência ia do polo aquático, ao hóquei em patins, ginástica e natação. Era bom em tudo e essa “bonsidade” refletiu-se na sua cooptação precoce como monitor de natação e polo-aquático. Por isso, foi nosso colega-professor e uma das referências intelectuais e físicas do nosso curso. Fomos campeões regionais universitários de futebol de 11 com o Pedro a defender galhardamente a nossa baliza.

Um dia aconteceram os campeonatos regionais de natação. Havia uma prova de estafetas (8x50 m). Tínhamos 7 nadadores de elite, mas faltava um. Pediram a vários colegas e todos se recusaram. Sem soluções vieram ter comigo e eu acedi para mal dos meus pecados. Fui o primeiro da estafeta. Nos primeiros 25 m ainda lhe dei bem e bati na parede pouco depois dos nadadores das outras faculdades. O pior foram os segundos 25 m. Em sofrimento, com a respiração desregulada e os 7 craques a chamaram-me de nabo para cima lá terminei o calvário muito atrasado em relação aos adversários. Os 7 craques recuperaram a coisa e fiquei com o título de campeão regional universitário no currículo. Depois vieram pedir-me desculpa dos apodos “carinhosos” com que mimosearam durante a minha prestação.

Terminado o curso, eu e o Pedro entramos na faculdade como Professores Estagiários e continuamos a senda de uma amizade e respeito que perdura.

Depois de toda uma vida riquíssima em vivências desportivo-profissionais o Pedro Sarmento foi desafiado a assumir o cargo de Presidente do Académico Futebol Clube. Este cargo difícil tem sido levado a cabo com um empenho e proficiência que só se justifica pelo “amor” que o Pedro tem ao clube desde menino. Quando começou a aventura diretiva do Pedro Sarmento no AFC.

Segue o momento em que o José Manuel Carvalho viu no Pedro o homem ideal para lhe suceder.  

“Este ano, o Académico Futebol Clube, agremiação desportiva que representei nos anos de 1968-69-70 como jogador de basquetebol comemorou o seu centenário. Numa conversa com o presidente do clube, José Manuel Carvalho, lancei-lhe o repto de organizar um ciclo de conferências para comemorar a data. Ele aceitou de imediato e meti as mãos à obra.

A 1ª Conferência aconteceu em 19 de janeiro de 2011 subordinada ao tema: Desporto e Sociedade – Para onde caminha o desporto? Preletores: J. Olímpio (FADEUP), José Manuel Carvalho (Presidente do AFC), José Augusto Rodrigues dos Santos (FADEUP) e Miguel Carvalho (Jornalista da revista Visão). Seguiram-se:

2ª Conferência. 10 de fevereiro de 2011. Tema: A Mulher e o Desporto. Preletoras: Teresa Mascarenhas (Chefe de Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital de S. João), Maíta Poli de Araújo (Universidade Anhembi Morumbi – S. Paulo – Brasil). Thuane Huyer da Roza (Universidade do Estado de Santa Catarina – Brasil) e os testemunhos de Aurora Cunha (Tricampeã do mundo de Estrada e ex-atleta olímpica) e de Fernanda Ribeiro (Campeã Olímpica em 1996) coordenados por Maria José Carvalho (FADEUP e ex-atleta internacional de andebol do Académico FC).

3ª Conferência. 23 de março de 2011. Tema: O Treino da Corrida nos Jogos Desportivos Coletivos. Preletores: Manuel António Janeira (FADEUP. Pró-Reitor da Universidade do Porto), Filipe Conceição (FADEUP), Paulo Colaço (FADEUP). Moderador: José Augusto Rodrigues dos Santos (FADEUP).

4ª Conferência. 11 de maio de 2011. Tema: Saúde e Desporto. Preletores: Leandro Massada (FADEUPO – Traumatologia Desportiva), José Soares (FADEUP – Fisiologia do Esforço), José Augusto Rodrigues dos Santos (FADEUP – Nutrição do Atleta de Alta Competição), Nelson Puga (F. C. do Porto – Medicina Desportiva). Moderador: Pedro Girão (Vice-presidente do AFC).

5ª Conferência. Esta conferência era sobre Estética no Desporto. Os preletores começaram a esquivar-se com desculpas sobre impossibilidades temporais e tivemos de anular a conferência.

6ª Conferência. 9 de novembro de 2011. Tema: O Atleta de Alta Competição – Relatos Existenciais. Preletores: Nuno Capucho (Internacional de Futebol), Carlos Resende (Internacional de Andebol), Emanuel Silva (Canoísta Olímpico, Campeão do Mundo, Campeão da Europa), Sara Oliveira (Nadadora Olímpica). Moderador: José Augusto Rodrigues dos Santos (FADEUP).

7ª Conferência. 24 de novembro de 2011. Tema: Gestão Desportiva. Preletores: José Pedro Sarmento (FADEUP), Carlos Resende (FADEUP), Jorge Lopes (Diretor Técnico da F.P. de Patinagem).

Seguiu-se o encerramento do Ciclo de Conferências. Falaram vários e eu fechei com a seguinte intervenção:

Minhas Senhoras e Meus Senhores

É condição sine qua non para cumprir uma maratona dar o primeiro passo. Muitas vezes as grandes obras não acontecem porque as pessoas, isoladas no seu comodismo, não querem dar o primeiro passo.

Mas nós conseguimos. Concluímos, hoje, uma verdadeira maratona cultural que, se não nos tornou mais ricos de certeza não nos tornou mais pobres. Pela parte que me toca sinto-me hoje mais rico cultural e humanamente que há um ano atrás.

Esta aventura cultural, consubstanciada nas conferências integradas nas comemorações do Centenário do Académico Futebol Clube, teve momentos altos de partilha desinteressada de experiências pessoais que fizeram jus à famosa máxima de Terêncio – Homo sum humani nihil a me alienum puto (Sou homem e nada considero alheio a mim do que é humano).

O homo sportivus é um omnívoro cultural, pois são plurais as áreas que abordam essa realidade social única que é o Desporto.

Juntamos especialistas de medicina, gestão, jornalismo, desporto, pedagogia, psicologia, etc. Abordamos o desporto em muitas das dimensões da sua pluralidade. Outras terão faltado, mas essas ficarão para as comemorações dos 200 anos que também terei o prazer de organizar cultural e cientificamente. Escolhemos pessoas que amam o desporto e se entregam a ele de alma e coração, profissionais ou amadores, homens ou mulheres, novos e menos novos, nacionais e estrangeiros. Todos subordinados a um denominador comum – o amor pelo desporto.

Refletimos sobre o Desporto em muitos campos, mas permitam-me que me fixe naquele que reputo de mais importante – o desporto como escola de valores. Nos tempos que correm, em que os Portugueses se encontram um pouco zangados com a sua grei, o desporto pode funcionar como lenitivo para existências tocadas inexoravelmente pelo lastro da dificuldade.

Não, não quero o Desporto como ópio do povo. Não quero que o Desporto nos faça esquecer a dureza do quotidiano. Essa está-nos marcada no sangue e alma. O que quero é que o Desporto se constitua como prémio que merecemos por sermos capazes de suportar com estoicismo o nosso destino. Desporto como catalisador de vontades e ilusões que nos permitam cada vez mais acreditar no nosso porvir. Desporto como escola de vida e cidadania, reflexão e temperança, superação e valor.

Os valores do Desporto, malgrado as malfeitorias que o reduzem e empobrecem, devem funcionar como referenciais de elevação para todas as atividades humanas. A trilogia Olímpica – Citius, Altius, Fortius, não deve ser encarada somente na perspetiva desportiva, mas também humana. Mais rápido, mais alto e mais forte, ultrapassando a mera conotação física, engloba uma pulsão de autossuperação que se estende para todas as atividades e funções humanas.

O Desporto transporta imensas metáforas da vida.

Saibamos recusar aquelas que nos tornam mais pequenos e assumamos como referenciais aquelas que nos elevam em humana dignidade”.