«Sempre tive a ambição de ser um treinador para jogar por títulos»
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ENTREVISTA «Sempre tive a ambição de ser um treinador para jogar por títulos»

NACIONAL07.02.202409:00

Em conversa com A BOLA, Bruno Pinheiro explica saída do Catar, recorda passagem pelo Estoril e projeta próximo passo na carreira

Depois do sucesso como treinador do Estoril (conquistou a II Liga) Bruno Pinheiro viveu uma situação peculiar no Catar quando foi demitido de treinador do Al-Sadd quando era líder do campeonato. Sem qualquer derrota (9 vitórias em 15 jogos). O técnico português fala, sem rodeios, nesta entrevista a A BOLA sobre os desafios vividos no Catar e a vontade de voltar a treinar.

Como foi gerir o despedimento quando era líder no Catar?

Foi muito fácil. Foi uma questão de divergência de opiniões, na forma como se deveria gerir o clube num futuro mais próximo. Como treinador não poderia defender coisas nas quais não acredito. Conversámos e entendemos que seria melhor sair. Mas, sinceramente, foi muito pacífico. E, só tenho a agradecer por ter treinado um dos melhores clubes da Ásia, e do mundo árabe, e que é uma referência na região. Portanto, foi um privilégio e só tenho de estar grato.

Como é que olha para esta visibilidade, que o próprio mundo árabe, começa a ter, em termos de futebol?

Quer por aquilo que o Catar fez, mas também por aquilo que a Arábia Saudita tem estado a fazer, todos os clubes, dos outros membros da comunidade árabe acabam por ganhar dimensão. A liga catari não tem a mesma visibilidade porque não investe o mesmo, mas provavelmente irá caminhar para lá. Depois do Mundial o foco deixa de estar na formação do jogador local e passa a estar na qualidade da liga local. Portanto, havia um número limitado de cinco estrangeiros e esta época já aumentou para sete, sendo que dois deles têm de ser sub-21, porque esses sub-21 ao fim de cinco anos poderão representar a seleção do Catar. As regras também vão mudar nas Champions League asiática pois para o ano deixa de haver a condicionante dos estrangeiros. Aquilo que pretendem neste momento não é tanto o desenvolvimento do jogador asiático, mas sim promover a melhor competição possível.

O dinheiro compra tudo?

Não, o dinheiro não compra tudo, graças a Deus. Mas, é legítimo utilizar o dinheiro para desenvolver um país.  Eu entrei pela primeira vez no Catar em 2015, portanto, posso falar, porque já são vários anos no país, e aquilo que posso dizer é que eles têm o sonho de gastar esse dinheiro desenvolvendo os locais, os próprios cataris e envolvê-los em projetos em que possam aprender.

Gostava que recordasse como é que entrou no futebol profissional português, como treinador do Estoril, em 2020.

Foi através de um superior hierárquico que tinha no Catar e que entrou na estrutura do Estoril. Entrei e passei lá duas épocas fantásticas. Fomos campeões da II Liga. Como treinador gosto de um futebol positivo, que se reflete nos resultados desportivos, e esses sempre apareceram pois fomos campeões na II Liga e na Liga fizemos um campeonato muito positivo. Valorizámos atletas. Esses dois anos de Estoril foram fantásticos. Continuo a torcer pelo Estoril e fico contente com os bons resultados que consegue.

Depois quando saiu do Estoril voltou para o Catar. Que reflexão faz do trabalho lá e de cá?

A maior reflexão que faço disso é mais até na diferença do que é ser treinador de um Estoril Praia e ser treinador de um Al-Sadd. Fui um privilegiado no Estoril porque os jogadores fizeram do grupo uma família. Eu sempre tive a ambição de ser um treinador a jogar por títulos. No futebol não é exatamente o mesmo jogar para ganhar títulos ou jogar para não descer. E, por exemplo, no Al-Sadd tive a oportunidade de jogar para ganhar, pôr em prática coisas que ainda não tinha conseguido fazer, porque o contexto não me permitia. Saí ao fim de alguns meses, mas sai confiante que as ideias que tinha estavam certas.

E agora o regresso ao treino, será como treinador de um clube português ou estrangeiro?

Não preocupa tanto o projeto em si, preocupa-me só ter sucesso. Para mim o mais importante é ter sucesso onde estiver, porque aceito a derrota, mas trabalho para a vitória. E sei que a derrota irá acontecer, mas prefiro ganhar mais vezes…  Só quero ter sucesso porque é o que nos dá força e lento para continuar.

IDEIAS...

«Não tinha oportunidade para crescer no futebol profissional em Portugal e em determinado momento da minha vida vi no Catar uma oportunidade de crescer enquanto treinador. Foi uma grande aprendizagem ser treinador no Catar»

«Nos momentos bons estamos todos presentes, mas nos momentos maus o treinador é isolado. Acho que é fundamental o treinador nunca ser isolado, porque isso passa para os adeptos, para os jogadores. E a partir do momento em que o treinador fica isolado, acaba por perder toda a gente»

«Os projetos nem sempre se conseguem escolher da melhor forma. Temos de esperar, ser pacientes e depois dar o tiro certeiro, o que nem sempre é fácil. Cada treinador tem de sentir que é capaz de fazer melhor que os outros, quando se entra num projeto, pois todos ambicionamos chegar ao topo»

ASF/PEDRO G. LIMA

«André Franco precisa jogar para ganhar confiança»

Que ambição se tem aos 47 anos nesta fase da carreira?

Acredito que tenho as minhas qualidades, a minha personalidade, tenho uma liderança tranquila, que por vezes nem é muito normal no futebol. Sou muito próximo dos jogadores, só ponho uma regra que é a do respeito. Podem falar tudo comigo, porque jogam, porque não jogam. Tenho capacidade para responder. A pior resposta que lhes posso dar, é que o colega de posição, é muito melhor que o jogador que pergunta porque não joga. No meu estilo muito próprio, e depois desta experiência no Al-Sadd, jogar para ganhar títulos, faz-me acreditar que posso ambicionar algo um pouco mais acima e irei trabalhar para isso.

São cada vez mais os treinadores à procura de equipas para treinar. Há espaço para todos?

Não há espaço para todos ao nível que todos querem. Treinei em todos os escalões, desde escolinhas. Fiz campeonatos distritais e nacionais. Fui coordenador de distrital da Associação de Setúbal, fui adjunto e fui treinador principal. Trabalhei em clube e em seleção nacional. Não há lugar para todos, mas acredito que há para os mais competentes, se souberem escolher bem os projetos e se souberem ser arrojados no futebol. Acredito que quem tem qualidade tem espaço. Uns crescem mais lentos do que outros e o meu crescimento foi lento. Sou treinador há 20 e tal anos e só há cinco vivo do futebol.

O André Franco vai para o FC Porto pelo que fez no Estoril com o Bruno Pinheiro como treinador. O que tem faltado para se impor no FC Porto?

O futebol são oportunidades e o treinador nem sempre as dá. Não é que o treinador esteja errado, são opções. O plantel não tem 11 jogadores, tem muitos e nem sempre se conseguem dar as oportunidades. O André precisa de jogar, de ganhar confiança e o jogo é que dá essa confiança. Neste caso devia jogar mais, mas tem de se aguentar. O futebol é mesmo assim. O desafio do treinador é manter motivado o jogador que não joga. O segredo disto é a frontalidade.