A entrevista a Bernardo Silva na íntegra
Bernardo Silva, figura de 2023 para A BOLA (Foto: Adrian O'Toole)

FIGURA DO ANO 2023 A entrevista a Bernardo Silva na íntegra

INTERNACIONAL28.12.202311:30

Bernardo Silva não esconde a felicidade que o ano que agora acaba teve na sua vida; assume desejo e responsabilidade para os próximos meses com a camisola das quinas; e projeta o que serão os próximos tempos da carreira.

«Ainda não me sinto completo quando se trata da Seleção»

- Bernardo, foi um grande ano para si. Campeonato e Taça de Inglaterra, Liga dos Campeões… Casou-se e foi pai… Estava a dar tudo o que tinha para ganhar o prémio de figura do ano d’ A Bola?

- [risos ] Foi, acho que foi de propósito. Pensei: figura do ano d’A BOLA? Tenho de dar o meu melhor [risos]. Será difícil superar o ano de 2023 porque, como disse, ganhei aqui com o Manchester City a Taça de Inglaterra, a seguir o campeonato e a Champions. E, depois, casei-me, fui pai pela primeira vez. Vai ser um ano difícil de bater, isso vai!

- Se o Euro tivesse sido em 2023 já estava no papo?

- [risos] Ah, eu acho que sim! Com a sorte que tenho tido este ano se se tivesse jogado o Euro teríamos ganho.

- Às vezes olha-se para si em campo e parece que no Manchester City já todos se renderam, mas na Seleção ainda lhe falta qualquer coisa para conseguir ter o mesmo impacto. Sente-o também ou é apenas a perceção errada?

- Isso vem com os títulos. É muito normal. Salta à vista o que conquistamos em cada lugar. O Bernardo, no Man. City, ganha em seis anos cinco Premier e agora uma Champions, e com a seleção de Portugal - e claro que é mais difícil porque há muito menos competições - uma Liga das Nações sim, mas nunca um troféu como o Europeu.

- Teve o azar do Euro-2016 com a lesão, que não o deixou estar na fase final...

- Sim, nunca ganhei um troféu como um Europeu ou um Mundial e é normal que as pessoas olhem para mim dessa forma. É um grande objetivo que tenho na minha carreira: ganhar um Europeu ou um Mundial com a nossa Seleção.

- As pessoas não são aqui assim tão relevantes para mim. Estava a questionar sobretudo sobre o seu sentimento…

- Ah, o meu sentimento. O meu sentimento é igual, porque sei que, no final de contas, o que conta no futebol é ganhar. Eu jogo sempre para ganhar, sabendo que é difícil porque são competições muito especiais, a eliminar e muito curtas, mas obviamente que não me sinto completo a nível de Seleção.

- Como se vê como figura do ano? A partir de hoje, vai continuar a ser o mesmo Bernardo?

- Sim, claro que sim. Sempre.

- Para o Bernardo cidadão, acho que todos sabemos o que significa, mas o que é que ser pai significa para o Bernardo jogador?

- É mais uma grande responsabilidade. A de, pela primeira vez, tomar conta de alguém que depende completamente de mim. Nunca tinha tido essa sensação, tirando com os meus dois cães, e mesmo assim é um bocado diferente. Ter de cuidar de alguém tão dependente só de ti, alguém por quem tens um amor tão grande, claro que é algo novo para mim, mas tem corrido bem e vou dar o meu melhor para que continue assim.

- Depois de um fantástico 2023, deixe-nos um desejo para 2024!

- Ser campeão europeu por Portugal!

«Não concordo com a ideia de serem os goleadores a ganhar sempre os prémios individuais»

- O 10 que é hoje… era o 10 que queria ser quando ainda estava no Seixal?

- [risos] A forma como vemos o jogo muda muito com os anos. Portanto, o pequeno rapaz que via vídeos do Ronaldinho, do Zidane do Rui Costa, do Pablo Aimar, do Figo ou do Cristiano Ronaldo de um bocadinho mais tarde no United, que via as fintas, os dribles e os golos, com os anos começa a perceber o jogo de outra forma e dar valor a outras coisas. Acho que me tornei num jogador um bocadinho diferente daquilo que quando era miúdo pensava que iria ser, mas estou muito feliz com a forma como evoluí porque, apesar de as pessoas não perceberem, o que é normal porque não pensam na parte mais profunda do futebol, entrei numa fase da minha vida em que acho que percebo bem o jogo e em que adoro ser esse jogador que tenta sempre ter essa curiosidade de querer aprender mais. Mas claro que, com os anos, acho que perdi alguma irreverência também. Lembro-me do Bernardo do Mónaco e era um jogador muito mais irreverente, muito mais driblador, muito mais de um contra um, muito mais de último terço do que sou hoje. Agora, penso muito mais nas consequências das minhas ações, antigamente não. Mas faz parte. Faz parte da nossa evolução enquanto jogadores e estou muito contente com a minha.

- Dizem que tem a elegância de David Silva e a ética de trabalho de N’golo Kanté? Concorda?

- Gostava de ter… Eu com a ética de trabalho de Kanté até concordo, mas gostava de ter a elegância de David Silva. Foi um dos melhores com quem joguei e a jogar entre linhas possivelmente o melhor. Nos meiinhos era impressionante. Portanto, acho que na elegância não estou ao nível do David Silva.

- O Bernardo é a prova de que as estatísticas valem pouco?

- As estatísticas valem pouco… Gosto de olhar para as estatísticas de ganhar jogos. Por exemplo, gosto de ver quais são os jogadores que têm maior percentagem de vitórias na Champions, na Premier League, de campeonatos, de jogos, porque, no final de contas, o impacto que um jogador tem numa equipa não se mede tanto pelos golos ou pelas assistências ou por não sofrer tantos golos. Claro que os guarda-redes têm de parar as bolas e os avançados têm de marcar golos, numa forma muito bruta de pensar o jogo. Os defesas têm de defender, os guarda-redes também, os avançados têm de marcar golos e quanto mais golos marcarem melhor, e os médios têm de fazer a ligação. Agora chegou-se a um ponto no futebol em que se vai ao exagero, em que um médio que marca 20 golos é melhor do que um que marca 10, e até o pode ser, mas não é por aí, porque há muitas formas de poder ajudar a equipa e tem de olhar-se para o jogo como um todo e não ir só à estatística, porque há jogadores com características muito diferentes. Vejamos, na minha posição há jogadores como, e vou dar os melhores de sempre, Iniesta ou Xavi, que nunca marcavam golos, marcavam o quê… três, quatro golos por época? E são dos melhores de todos os tempos, se não os melhores. E depois há jogadores com um bocado mais de golos e de assistências como Frank Lampard ou um Kevin de Bruyne, que tem muita assistência, um Bruno Fernandes, que tem muito golo e muita assistência… Dentro da mesma posição podem haver características muito diferentes e os jogadores podem ajudar a equipa de forma diferente. E, como tal, não gosto de olhar para a estatística dessa forma, não.

- São as estatísticas que o impedem de lutar por uma Bola de Ouro?

- Sem dúvida que hoje, quando se olha para os troféus individuais, as pessoas olham muito para a estatística. Normalmente, os jogadores que marcam mais golos… Por exemplo, se o Bayern ganha a Champions é o avançado do Bayern que marcou 40 golos na época que vence a Bola de Ouro. O City ganha a Champions… e por acaso não foi o Haaland, porque o Messi ganhou o Mundial, no entanto, se não fosse o Messi por causa do Mundial, seria o Haaland quem iria ganhar a Bola de Ouro. O Real Madrid ganha a Champions e o campeonato espanhol, e é o Benzema que ganha a Bola de Ouro. Normalmente, os goleadores acabam por conquistar os prémios individuais. Se concordo, sinceramente? Não. Até podem ganhar, porque às vezes até podem ser os mais influentes. Agora, por critério não concordo com esta ideia de que só quem marca golos é que deve ganhar Bolas de Ouro, mas é como funciona o futebol. O futebol é golo e as pessoas celebram quando se dá o último toque, mas se pensarmos no futebol como um todo há todo um processo até haver esse toque final para a bola bater na rede, não é?

- Vê-se ou não como um dos jogadores mais subvalorizados do mundo?

- Não, as pessoas valorizam-me bastante. Talvez em Portugal não tanto como fora. Acho que as pessoas me valorizam bastante mais em França, onde já joguei, e em Inglaterra do que no meu próprio país, mas talvez tenha a ver com o facto de ter saído bastante cedo. Mas sinceramente não, sinto da parte dos meus adeptos, dos adeptos do Manchester City, um carinho impressionante. Tal como dos adeptos do Mónaco também na altura. Mesmo pelos adeptos do Benfica, apesar de só ter feito três jogos pela equipa principal, sinto que sou bastante valorizado. No final de contas, os adeptos é que importam, porque são as pessoas que veem todos os meus jogos. E não veem só a pequena notícia que aparece na internet.

- Mesmo sem uma grande quantidade de golos e assistências, só Eusébio, Figo, Ronaldo e Bernardo Silva estiveram duas vezes no top 10 de uma Bola de Ouro, como é que vê isso?

- É um orgulho. Os prémios coletivos são sempre os mais importantes porque são os mais bonitos. Partilha-se memórias com outras pessoas e, no final de contas, retribuir ao clube que nos paga e aos nossos adeptos que nos apoiam é sempre espetacular. Dar de volta é sempre espetacular. Mas receber esse reconhecimento individual também é bonito e é um motivo de orgulho. Quer dizer que estamos a fazer bem o nosso trabalho e, portanto, num prémio tão prestigiante como a Bola de Ouro ter estado duas vezes no top 10 é fantástico.

- Tenho ideia de que nunca marcou um penálti na Premier League. É verdade? Há alguma razão para isso? Até poderia contribuir para melhorar as estatísticas de que falámos…

- É verdade. Já marquei penáltis no City em finais de Taça da Liga, de Supertaças… Na Taça de Inglaterra não me lembro, por acaso, mas nunca marquei na Premier League. Não sou batedor de penáltis normalmente, não.

- Por alguma razão?

- Não sou um jogador que remata muito forte e, portanto, corro o risco de que se o guarda-redes adivinhar o lado haver probabilidade bastante alta que pare o remate. Depois também tem muito a ver com a confiança. Mas aí… O meu registo não é mau. O meu registo pelo Manchester City é de três ou quatro e marquei todos. No Mónaco, tenho dois, falhei um e marquei o outro, portanto os meus números não são assim tão maus. Em cinco ou seis também só falhei um. Agora, se olharmos para batedores como o Erling Haaland, na altura o Gundogan, o Mahrez, o Kevin de Bruyne, temos de ser honestos. Na Seleção, o Ronaldo, o Bruno Fernandes… são todos batedores de penáltis com percentagens muito boas. Batem muito bem e o melhor batedor, aquele que tem mais probabilidades de marcar, tem de ser o escolhido para ajudar a equipa e ganharmos jogos.

- Apesar dos números, o autor e especialista em táticas Michael Cox escreveu em finais de novembro no The Guardian que o Bernardo era o melhor jogador da Premier League. Justificou ao dizer que conseguia ser dominador nos grandes jogos e em vários papéis, porque conseguiu fazer de De Bruyne a partir do momento em que o belga se lesionou, de Rodri com o castigo do espanhol, além do que já normalmente faz enquanto Bernardo Silva. Como é que se explica isto?

- Eu tento ajudar. Acho que tenho duas posições bastante naturais para mim… Na tática em que nós jogamos habitualmente, que é um 4x3x3, posso ser o número 8 ou o número 10. Nós temos dois médios ofensivos a jogar à frente do nosso número 6 e, portanto, posso fazer uma dessas posições, esquerda ou direita é pouco relevante, e depois também me sinto bastante natural a extremo direito porque o fiz durante grande parte da minha carreira. O Rodri esteve suspenso e eu, tendo de jogar a número 6, dou o meu melhor. Acho que percebo bem o jogo para poder fazer essa posição. É a minha melhor posição? Acho que não. Tento, claro que sim. Falou-me do Kevin de Bruyne e de quando ele não está presente. Sou um jogador muito diferente com ele ou sem ele em campo. Quando jogo com o Kevin dou-lhe bastante mais a liberdade de ser ele a tomar as decisões no último terço, ele é o melhor nisso. É o melhor no último passe e mesmo no remate, na última decisão. É um bocado como jogo com o Bruno [Fernandes] na Seleção. O Bruno é muito forte no último passe, no remate, na última decisão e, portanto, tento entrar um pouco mais na construção do jogo para lhes dar as melhores hipóteses para fazerem a diferença no último terço. Já quando eles não estão sei que tenho de contribuir um bocado mais para esse último terço. Para esse último passe, para esse golo e para fazerem mais a diferença. Tento jogar com os companheiros que tenho dentro de campo comigo e tento ajudar a equipa da melhor forma possível. Agora, também não concordo que seja o melhor jogador da Premier League, porque acho que, por exemplo na nossa equipa… e estou a falar a sério… temos visto nos últimos tempos a influência que dois, três jogadores têm. E a nossa equipa tem esse valor. O [John] Stones faz muita falta, o Rodri faz muita falta, o Kevin de Bruyne também, e quando um deles não está nota-se bastante a diferença. Porque nós não temos nenhum jogador que seja o melhor da equipa ou o melhor jogador da Premier League. Temos vários jogadores, uma base muito importante, em que todos juntos e se estivermos todos bem e não tivermos lesões, é muito difícil para as outras equipas pararem-nos.

- O mesmo Michael Cox também escreveu que o perfil do jogador multifunções, que pode tanto jogar a 8 como falso 9, extremo à direita ou à esquerda, médio de contenção ou até lateral-esquerdo, seria mais um James Milner do que um Bernardo Silva, que classifica como um dos jogadores mais técnicos da Premier League e de que muitos chegaram a duvidar no início se tinha a dimensão física para a própria competição. O Bernardo não se vê como um James Milner de certeza…

- Pela capacidade de jogar em várias posições, sim, mas enquanto jogador não. Somos muito diferentes. Os meus amigos, mais até os benfiquistas, até brincam comigo e dizem que sou um pouco como o César Peixoto e o Rúben Amorim quando estavam no Benfica. Jogavam a lateral-esquerdo [Rúben a lateral-direito] ou a seis, a oito ou como extremos. Mas por fazer várias posições, acho que sou um bocadinho como o Milner sim.

- Quando é que nasceu este novo Bernardo? Houve algum momento em que houve um clique e sentiu que tinha de ser mesmo assim para poder vingar numa grande equipa?

- Também tem muito a ver com a nossa equipa e, da forma como jogamos, é mais fácil, porque somos uma equipa muito pressionante, que joga muito com bola. Se me perguntassem se poderia jogar a lateral ou mesmo a 6 numa equipa de transição provavelmente não porque numa equipa de transição ter de fazer 50 metros para a frente e 50 metros para trás… A lateral, seria impossível, porque com extremos rápidos ia ser muito difícil para mim, e mesmo a 6 seria bem complicado. Numa equipa de controlo como a nossa, claro que é mais fácil poder fazê-lo. Até como falso avançado posso jogar, porque me permite baixar, porém numa mais direta o que iria fazer a avançado. Iriam meter-me bolas pelo ar ou cruzamentos? Ia funcionar pouco. Portanto, no City o ambiente enquadra-se e é melhor para poder fazer esse tipo de coisas. Agora, claro que também não é fácil. Não vou dizer que é fácil. Quando o treinador no ano passado me mete a lateral-esquerdo fora contra o Arsenal e contra o Bukayo Saka, que é um dos melhores extremos da liga, não vou dizer que é fácil, mas tento perceber o jogo e com a ajuda… Lembro-me de chegar ao final do jogo e de ir dar um abraço ao Aké, que foi o central do meu lado, e dizer-lhe obrigado. Dizer-lhe ‘hoje salvaste-me’ porque foi isso mesmo. Se não estivesse o Aké do meu lado não me tinha safado naquele jogo. Porque, na realidade, não sou lateral e jogar contra o Bukayo Saka não é fácil, é um dos melhores extremos da liga. Ter os companheiros que tenho ao meu lado e estar no ambiente em que estou também facilita muito.

- Ainda bem que fala nisso da questão do lateral. Acho que foi contra o Aston Villa na época passada…

- O Aston Villa foi o primeiro jogo, depois foi Arsenal fora e o Nottingham Forest. Foram três jogos seguidos.

- O Bernardo fez questão de vir às redes sociais explicar que não foi bem um lateral, que tinha sido um lateral ofensivo. Por alguma razão?

- Não, porque foi a posição que o Zinchenko tinha feito na nossa equipa. E o Zinchenko também foi na formação um número 8/número 10. Adaptou-se na nossa equipa a jogar a lateral e fez jogos fantásticos. Ainda hoje joga a lateral no Arsenal. Agora, a ideia do Guardiola surgiu porque nós, na nossa saída de bola, geralmente não saímos em 4+1 como muitas equipas, saímos um bocado em 3+2. Como tal, o jogador que no ano passado surgia ao meio ao lado do Rodri, que joga mais na naquela posição, era o Stones, como central a entrar, ou antes o Zinchenko e o Fabian Delph há uns anos. Foi essa a ideia do treinador, por eu poder jogar ali no meio. A defender, tenho um bocado mais de dificuldades, mas depois com bola já é uma posição mais natural, já faz um bocado mais de sentido. Foi essa a ideia dele, de ter mais um médio e mais controlo do jogo, ao meter alguém que naquela zona do campo com bola se sente bastante confortável.

- Guardiola correu algum risco de vida quando o informou da posição em que ia jogar?

- Acho que houve um risco elevado [risos], mas acabou por correr bem, porque ganhámos o jogo fora contra o Arsenal, o que foi também um ponto de reviravolta porque estávamos atrás deles já não me lembro quantos pontos, mas bastantes. Não lhe recomendo voltar a fazê-lo, mas correu bem [risos ].

- A posição é para repetir?

- Se for preciso estou disponível para guarda-redes, central, tudo o que for preciso, porque é o que for… Sinceramente!

- Foi precisamente ali no meio, à frente da sua área, que fez aquela finta de corpo ao Mo Salah, há umas semanas, que correu a internet. Aquilo faz-se a alguém?

- Qual finta de corpo?

- Uma finta de corpo numa saída a meio-campo no jogo com o Liverpool…

- Ah, foi a retribuir uma que ele me fez há um ano, quando me meteu no chão. Ainda tinha isso na memória[risos]!

- Foi vingança, então?

- Foi vingança! [risos ].

«Benfica terá de ser no final de um contrato»

- O Benfica veio mais uma vez à baila em 2023. É cada vez mais um destino anunciado. Sente isso também?

- Nunca escondi que um dia quero voltar, portanto, claro que sim. Agora, vamos ver com o tempo o que é que é possível e não vale a pena estar sempre a falar disto, porque as pessoas até se cansam… Vamos ver.

- Vai-se falando cada vez mais…

- Sim, fala-se cada vez mais e torna-se um bocado repetitivo. Percebo que as pessoas também se cansem. Só que como me fazem tantas vezes essa pergunta também não vou mentir. Eu digo sempre: é uma realidade que eu quero voltar e espero que um dia possa acontecer.

- Os adeptos podem estar já a contar os dias para que isso aconteça…

- Podem, agora há questões contratuais que se têm de respeitar e… tem de se viver a realidade, que o futebol português a nível financeiro não pode competir com clubes ingleses, espanhóis ou até alemães e franceses, portanto… Por exemplo, mesmo que eu quisesse ir para o Benfica neste momento era totalmente impossível porque o Manchester City pede imenso dinheiro por uma transferência por mim. Nos últimos quatro ou cinco anos sou um jogador avaliado acima dos 50 milhões de euros e é impossível para um clube português pagar esse tipo de valor. As pessoas têm de ser um bocado realistas.

- Isso praticamente denuncia que seria no final de um contrato…

- Teria de ser. Acho que sim, claro que sim.

«Não serei um treinador como os portugueses»

- Que treinador ainda gostava que o treinasse?

- Tenho alguns treinadores de que gosto muito. Por exemplo, o Mikel Arteta, que já foi meu treinador, quando foi adjunto do Pep [Guardiola]. É um treinador que adoro. E vemos a evolução que o Arsenal teve com ele, só um bom treinador é que é capaz de fazer isso. Afinal de contas, não é só a qualidade dos jogadores, o treinador é muito importante no processo e na evolução de uma equipa. Depois, há outros de que também gosto bastante. Muito diferentes, mas gosto muito das culturas espanhola e alemã. Espanhola num registo um pouco mais de posse e alemã com um pouco mais de transições. Apesar de ser um rival, [Jurgen] Klopp é um treinador que admiro muito. Muito de transição, não sei se benéfico ao meu jogo…

- Mas também tem evoluído um pouco mais para a posse nos últimos anos…

Sim, é uma equipa muito dominadora… O próprio Tuchel. E depois, assim de espanhóis, falei do Arteta, mas tenho também muita curiosidade por exemplo de um Xabi Alonso, que começou agora a carreira e está a fazer um grande trabalho no Leverkusen, ou mesmo de um Luis Enrique, que fez um grande trabalho no Barcelona e que agora vai ter um trabalho difícil no PSG para crescer com aquela equipa. Gosto muito das culturas espanhola e alemã. Diferentes, mas gosto muito das duas formas de ver o futebol.

- Português não?

Também. Sou português e tudo o que… Tudo não, porque nos últimos anos tive um treinador espanhol, mas tudo o que aprendi até aos 23 anos, e que foi formação do Benfica, Seleção Nacional sub-21 com Rui Jorge e depois A com o Fernando Santos, Mónaco com Leonardo Jardim, foi com treinadores portugueses. Tenho muito da cultura portuguesa dentro de mim. Agora, gosto muito da forma como os espanhóis veem o futebol e acho que são um bocadinho mais de posse, mais de pressão alta do que nós. Nós somos um bocadinho mais manhosos, um bocadinho mais próximos dos italianos. Aliás, acho que nós somos um misto. Estamos a meio-caminho, não somos tanto como os italianos, mas também não somos como os espanhóis. Mas gosto muito da nossa cultura futebolística e muito do que aprendi no futebol foi em Portugal, por isso não me posso queixar.

- Mas será essa a linha que terá enquanto treinador?

- Acho que não. A minha linha como treinador não vai ser muito parecida com a portuguesa, para lhe ser sincero.

- Vai ser mais parecida com a de Pep Guardiola…

- Gosto de acreditar que sim.

- E exclui a entrada num gabinete para ser dirigente?

- Não sei, é muito cedo para falar nisso. Não faço a mínima ideia.

- Treinador é que já está decidido.

- Não, não está. É que nem sei. Gosto muito de futebol e, se tiver saudades, provavelmente sim.

- Ainda faltam uns anos no relvado…

- Faltam muitos anos. Tenho a certeza de que nos primeiros anos após o futebol vou querer descansar com os meus filhos, porque espero ter mais. Já tenho uma, mas na altura já espero ter mais. Aproveitar com os meus filhos, a minha mulher, com a minha família, os meus amigos, porque já estou há nove, dez anos a jogar fora de Portugal. Já estou no décimo ano, tenho muitas saudades de estar com eles. Por isso, vou dedicar os meus primeiros anos à minha família e aos meus amigos, mas de certeza que também vou ter saudades do futebol e, para matá-las, vou querer estar dentro do campo e a única forma de estar dentro do campo é ser treinador. Diria que sim.

- Já tem alguma data estipulada para isso?

- Não. Enquanto o corpo der e me sentir útil, porque quero sentir-me útil, vou continuar. E, depois, há aqui várias fases. Há a fase de sair do estrangeiro e ir para Portugal, que é algo que quero. Depois há a fase em que eventualmente vou ter de me retirar da Seleção. Em todas estas fases vou vendo e percebendo até que momento sou útil. Por exemplo, na Seleção estarei enquanto me sentir útil, quando não me sentir assim vou sair também.

«Rúben Dias e eu dizemos que seremos adjuntos um do outro»

- Rúben Dias diz que é o seu segurança. É mais dedicado do que De Paul com o Messi?

- O Rúben Dias é o meu segurança, é. É um grande amigo que ganhei no futebol, que também é uma pessoa com quem gosto muito de partilhar balneário, porque além de ser um guerreiro, daqueles que é bom ter ao nosso lado nos momentos difíceis, também é muito bom falar com ele de futebol, porque é muito interessado e percebe muito, na minha opinião, do jogo. É muito inteligente na forma como aborda o jogo e sem dúvida que…

- Acha que ele vai ser treinador também?

- Eu espero que sim. Nós às vezes brincamos e dizemos que vamos ser o adjunto um do outro. Num ano é ele o principal e eu o adjunto, no outro seria eu o principal, mas acho que não. Acho que ele vai ser um grande treinador principal um dia. E espero que sim porque ele tem um entendimento do jogo muito bom.

- Matheus Nunes, que Guardiola chegou a considerar um dos melhores médios do mundo, parece estar numa fase de adaptação. Como é que o vê agora e o que é que ele ainda pode trazer à equipa?

- É como disse, está numa fase de adaptação. Quando cheguei ao Manchester City, foram seis a oito meses em que quase não joguei. Adaptarmo-nos a este clube não é fácil, porque a forma de jogar é muito diferente, mas o Matheus tem todo o potencial e todas as qualidades para ter um futuro brilhante neste clube e na nossa equipa, pela forma de jogar, pela capacidade dele em manter a bola, a capacidade de tirar um, dois adversários da frente e arrancar, atacar o defesa central e tomar a última decisão. Tem tudo. Olho para o Matheus e, falando apenas de talento puro, tem tudo a nível físico e a nível técnico. Espero que melhore o seu entendimento do jogo para conseguir chegar ao nível que é esperado, porque ele tem capacidades incríveis.

- Tem-se notado uma química especial nos últimos jogos entre si e Haaland. Sente-se responsável por encurtar aqui a distância para ele, que é mais um finalizador enquanto o resto da equipa é mais de posse e de maior envolvência. Sente-se o responsável por ter de tornar esse caminho até ele mais curto?

- É tentar envolvê-lo o máximo que podemos no jogo, porque sei que ele é um jogador que não precisa de tocar muitas vezes na bola. Ele próprio o diz, que se tocar uma ou duas vezes e marcar um ou dois golos fica feliz. Mas, na realidade, quanto mais envolvido estiver maior a confiança para depois, nos momentos certos, meter a bola dentro da baliza. Portanto, fazer esta ligação, para lhe dar o maior número de bolas possível, é muito importante. Sem o De Bruyne para fazer o trabalho de último passe, às vezes ele toca menos vezes na bola e é mais difícil. Ele e o Álvarez agora, juntos, também combinam muito bem, mas tentar dar-lhe essa participação no jogo sem dúvida que é uma missão. Minha, cada vez mais, principalmente não estando o Kevin, para o ter envolvido no jogo e poder marcar o maior número de golos possível.

- Um homem humilde, como Guardiola o qualifica, num clube rico como o City. Nunca teve a tentação de fazer uma excentricidade?

- Que tipo de excentricidade?

- Alguma coisa de que não faça parte da sua natureza só porque está num clube como o Manchester City…

- Se falarmos a nível financeiro, o dinheiro que eu ganho, que é muito, o maior prazer que me dá é poder dar a segurança e a tranquilidade de uma boa vida às pessoas próximas de mim. Isso é a maior alegria. E depois o resto… Gosto de ter as minhas coisas, gosto de ir de férias, gosto de ir para bons hotéis, gosto de comer bem, gosto de fazer coisas boas com a minha mulher e com a minha família. A nível de extravagâncias, gosto de algumas coisas como toda a gente, gosto de coisas boas, mas acho que não tenha em excesso, não. Não sinto essa necessidade, sinceramente.

«Se eu tivesse ido para o Atl. Madrid teria tido sucesso? Talvez não»

- Uma pergunta um pouco mais séria. Podemos dizer mais ou menos, embora seja sempre algo subjetivo, que o Bernardo e o João Félix tinham inicialmente as mesmas características. Alguma vez falaram sobre a forma como o Bernardo evoluiu e como o João Félix poderia evoluir?

- Eu percebo a questão porque o Félix na formação jogava a número 10 tal como eu, mas ele sempre foi um jogador… Ele era um número 10, mas muito mais um número 10 segundo avançado, que até podia jogar a avançado, e eu sempre fui muito mais um 10 a puxar para o 8. O Félix sempre foi mais golo, mais último terço, muito mais de desequilíbrios e de arriscar bastante e eu sempre fui um jogador mais de controlo, de manter a posse, apesar de também ser um driblador. Portanto, acho que nunca fomos assim tão parecidos e o caminho nas respetivas carreiras é bastante diferente. Aquilo que se pede ao Félix em campo é essa irreverência que eu tinha um bocadinho mais no meu início de carreira, sem nunca ter sido um jogador irreverente como o Félix. Portanto, é sempre difícil fazer essa comparação.

- A pergunta era mais no sentido se alguma vez falaram sobre a evolução dos jogadores com características ofensivas… Ao João Félix é muitas vezes apontado, sobretudo nos tempos do Atlético Madrid, ser aquele jogador que não defende ou defende mal, pressiona mal, e o Bernardo transformou-se nesse sentido…

- Precisamos de perceber que os jogadores levam caminhos diferentes e o meu início de carreira foi o Mónaco enquanto que a do Félix foi no Benfica. Aí até é muito parecido. Mas o primeiro salto do Félix, para além de ter sido dado mais novo … Eu vi para o City com 22, 23 anos, já não me lembro, e o Félix foi para o Atlético de Madrid com 20, 21, muito mais novo… Temos de perceber que o Atlético de Madrid e o Manchester City são dois clubes culturalmente muito diferentes, porque… e não estou a dizer que um é melhor do que o outro, não vou por aí, estou só a dizer que para um jogador como o Félix e, mais uma vez isto não é uma crítica ao Atlético, eu vim para um ambiente que se enquadrava exatamente com as minhas qualidades, com um treinador que pensa da mesma forma do que eu, que gosta de ter bola, que gosta de pressionar alto que… e portanto tudo perfeito para mim… e o Félix, por força das circunstâncias, na minha opinião, acabou por ir para o sítio errado. Perguntam-me a mim: se tivéssemos feito o caminho inverso teria eu tido sucesso no Atlético de Madrid? Se calhar não. Provavelmente teria tentado adaptar-me, teria dado o meu melhor para jogar da forma que o treinador quer. No final de contas, temos de seguir a ideia do treinador. Mas não teria sido o ideal para mim. Eu acho que, e eu já disse isto ao Félix, e acho que ele não se importa que eu diga isto aqui porque somos bastante amigos, o caminho que ele tomou na altura também por força das circunstâncias, porque no final de contas se calhar convinha ao Benfica que fosse para o Atlético porque era o Atlético que pagava aquele valor ou pagava o dinheiro todo na altura em vez de ser em tranches… Não sei, não sei o que aconteceu, mas foi qualquer coisa deste género: compensava mais ir para ali do que para outro lado… Agora estou feliz com o que lhe tem vindo a acontecer nos últimos tempos porque o vejo bastante mais feliz e num ambiente mais dentro daquilo que é o estilo de jogo dele e vamos dar-lhe um bocado mais de tempo para ele fazer bem as coisas, porque passou por uma fase difícil, ele próprio o admitiu que estava num ambiente que não era o mais indicado para a carreira dele, e é a vida… Às vezes tomamos decisões e vamos por caminhos que se calhar não devíamos ter ido, mas faz parte… Serve para aprender, para nos tornarmos mais fortes. O Félix é um jogador muito mais forte do que era há uns anos.

«A coisa mais maluca que Guardiola me pediu foi defender o Saka no Emirates»

- Qual foi a coisa mais maluca que Guardiola lhe pediu?

- A coisa mais maluca que me pediu foi provavelmente jogar a lateral no Emirates contra o Saka. Não foi fácil e foi um jogo de muita pressão porque estávamos atrás deles e se perdêssemos ou empatássemos esse jogo estaríamos fora da luta pela Premier League. Ter de jogar esse jogo contra um dos melhores extremos da liga foi o momento que vou lembrar para sempre na minha carreira. E adorei, adorei. No final de contas foi duro, mas foi um grande desafio, que eu adorei.

- E trocou algumas palavras com o Saka nesse jogo?

- Não nesse jogo. Mas já troquei de camisola com o Saka há uns anos e é um jogador que admiro muito, porque é um dos melhores extremos da liga, além de ser muito trabalhador, com golo e com uma boa mentalidade. Gosto muito dele.

- Já falámos da primeira, e a segunda coisa mais maluca que Guardiola lhe pediu?

- Eu não considero maluca, mas o Guardiola já me pediu bastantes vezes para, no pontapé de baliza, ir para o lado do guarda-redes, ele passar-me a bola e eu entrar a conduzir pelo meio, porque ele sabe que sou um jogador bastante confortável com bola na zona de construção. A verdade é que vai correndo bem [risos], mas é uma zona perigosa, não é? Ele sabe que eu sinto-me bastante confortável, mas não deixa de ser uma zona perigosa em que se perder a bola estou muito próximo da nossa baliza e pode dar golo.

- Voltando a Guardiola, o documentário ‘All Or Nothing’ (Tudo ou nada, de 2018)… Confesso que fiquei um pouco surpreendido porque de cada vez que a imagem captava o Bernardo mostrava-o de boca aberta, quase espantado…

- Sempre fui assim.

- O que é que ele significa para si na sua carreira?

Sempre fui assim, de boca aberta. Quando estou a olhar para alguém estou sempre de boca aberta. Agora, o Pep sempre foi… Quando era mais novo e via aquela equipa do Barcelona dos pequeninos, do Xavi e do Iniesta, do Messi e desses jogadores todos, treinada pelo Pep, foi uma inspiração para mim. Inspiração porque surge num momento em que não jogava na formação do Benfica ao não ser fisicamente tão forte como os meus colegas de equipa. Acabei por não jogar durante vários anos na formação do Benfica e houve uma altura em que estive para ser mandado embora da formação e emprestado ao Belenenses. Num momento difícil para mim, perceber que o tamanho podia não ter assim tanta importância no futebol ao ver essa equipa do Barcelona a jogar foi sem dúvida uma inspiração. E um dos meus sonhos no futebol sempre foi ser treinado por ele, portanto poder chegar ao Manchester City foi na altura um orgulho e ainda hoje poder aprender com ele é sem dúvida algo que nunca vou deixar de querer aproveitar. Vou tomar sempre o máximo de atenção que puder em todas as reuniões e em todos os treinos para ir sempre evoluindo. Não só com ele, mas também com os meus colegas de equipa, mas sobretudo com ele.

- Guardiola deu uma entrevista à psicóloga Soledad Bacarreza em que diz que um dos seus desafios mais interessantes é saber como chegar a um jogador a fim de conseguir motivá-lo e potenciá-lo ao máximo. Por exemplo, convidar para um jantar em casa, ir tomar um café, ficar a falar com ele depois do treino… O que é preciso para motivar o Bernardo?

- O que é preciso para me motivar?

- Ou para potenciar em campo por exemplo?

- Gosto de treinadores exigentes. Guardiola é o exemplo perfeito de um treinador que me motiva da forma certa. Primeiro, porque vemos o futebol da mesma maneira, temos a mesma ideia de jogo… E nem sempre é fácil porque às vezes… não há uma ideia correta de jogo no futebol, não é? Uns treinadores são um bocadinho mais ofensivos, outros mais defensivos, uns gostam de jogar mais com a bola, outros mais em contra-ataque, e pode-se ganhar de qualquer das formas. Eu, da forma que vejo o futebol, gosto de pressionar alto, gosto de ter bola e, portanto, ter um treinador como o Guardiola que pensa exatamente dessa forma ajuda a que eu esteja motivado. Só por aí, ter um treinador que pensa da mesma forma do que eu já é uma motivação para todos os dias ir para o treino com uma cara feliz. E, depois, eu gosto de alguém… eu gosto de alguém honesto. Focado, mas honesto. Com princípios, mas honesto, que me diz, para bem e para o mal, aquilo que fiz bem e mal nos momentos em que tem de dizer. E não tenho problema algum, acho eu… Acho que lido bem com a crítica, mas gosto sobretudo de honestidade. Quando eu vejo que no fundo é só para melhorar a equipa, porque a crítica nunca é pessoal, estou motivado por mim mesmo.

- Não precisa de um convite para jantar…

- Não, não preciso que ninguém me convide para jantar. Percebo que haja jogadores que precisem um pouco mais de carinho, outros de menos, jogadores que precisem mais… Por isso é que é difícil ser treinador, é preciso lidar com os jogadores de forma muito diferente. Há jogadores que precisam levar uns gritos, há outros que precisam mais de umas palmadinhas nas costas, e é difícil perceber o que cada um precisa.

- E o que é que o Bernardo precisa, de gritos ou de palmadinhas nas costas? Ou de nada disso?

- Não me importo que me deem um grito de vez em quando, embora não seja um jogador de que precisem de gritar muito comigo, porque acho que sou bastante trabalhador e cumpridor das regras. No entanto, se levar um grito não me chateia. Já levei muitos gritos, tanto do Guardiola como do Fernando Santos, como de muitos outros treinadores meus, e nunca levei a mal.

- Naquela declaração sobre a humildade do Bernardo, Guardiola disse que não tinha tatuagens. Ele nunca viu o seu braço esquerdo?

- Tenho uma, tenho uma. Há bastante tempo.

- Chegou a vê-la?

- Eu acho que sim, mas se calhar esqueceu-se.

«Melhor presente que me deram foi inscreverem-me nas escolinhas do Benfica»

Número 20 no City, Bernardo Silva respondeu a 20 perguntas rápidas sobre vários temas.

- O que fez com o dinheiro do primeiro salário?

- Já não me lembro. Provavelmente, meti logo nas poupanças, porque sempre fui muito poupado. Meti na minha conta para ter uma folguinha, para mais tarde usar se precisasse.

- Qual é o guarda-redes que mais o irrita?

- O guarda-redes que mais me irrita? Provavelmente… Não sei responder. Diria um guarda-redes a quem nunca marquei. Diria o Buffon, porque me eliminou duas vezes da Champions League quando eu estava no Mónaco. Agora já não vou ter a oportunidade de consegui-lo… Era sempre ele que me tirava da Champions, quando eu estava no Mónaco.

- Qual a viagem que tem mesmo de fazer?

- A viagem que gostava de fazer seria entre o Brasil e o Japão. Brasil por razões óbvias, porque falam a nossa língua e também por razões musicais. Adoro a música, adoro a cultura, são um povo divertido. E por serem tão próximos de nós, por razões óbvias. É uma cultura de que ouvimos muito e conhecemos muito quando somos pequeninos e, como tal, tenho muita curiosidade. O Japão, porque toda a gente diz que é dos países mais completos, que tem de tudo, desde a comida fantástica à cultura. Tem praias, tem tudo. Adorava. Sei que a viagem é longa, para aí três semanas para percorrer o país, mas adorava fazê-la.

- Quem escolheu o nome da Carlota?

- Foi metade, metade. Fomos os dois.

- Consegue ter amigos fora do futebol?

- Consigo. Grande parte dos meus melhores amigos é toda fora do futebol.

- Em que língua fala no balneário?

- Normalmente inglês, para toda a gente perceber, mas inglês, espanhol, antes um bocadinho de francês também porque me dava muito bem com o Mendy, com o Mahrez… Falo muito português com o Rúben, com o Matheus agora, mas normalmente inglês.

- Chalana ou Eusébio?

- [hesita]. Chalana! Não consigo escolher, mas o Chalana faz parte da minha vida pessoal também, por isso Chalana.

- Quer ser presidente ou treinador? Já começou a pensar nisso?

- Treinador. Primeiro, treinador. Não, eu tenho… eu gosto muito de futebol. E gosto muito de pensar o jogo. E gosto muito da parte tática. Não sei se mais tarde vou ter paciência para ser treinador, porque é preciso paciência para lidar com 20 e tal miúdos, todos com personalidades diferentes. Não é fácil.

- Não pensou ainda no curso…

- Não, não. Mas acho bastante provável. Porque toda a gente diz que quando se deixa o futebol se fica com muitas saudades passados dois ou três anos. Por isso, é possível.

- Este ano vai desmontar a árvore de Natal?

- A árvore de Natal já foi desmontada pela minha mulher há uns anos. Agora, já não monto a árvore há três anos também. Dá muito trabalho.

- Qual foi o pior e o melhor presente que recebeu?

- O melhor presente foi quando me inscreveram nas escolinhas do Benfica, tinha seis ou sete anos. Portanto, foi o meu início de futebol um bocadinho mais a sério, tirando o de escola e de rua. O pior presente? Acho que não tenho nenhum pior presente. Sei que é um grande cliché, mas a intenção é que conta, portanto não consigo pensar num pior presente.

- Assina o seu nome nos autógrafos ou rabisca qualquer coisa?

- Assino o meu nome.

- Continua a ter só uma tatuagem?

- Só uma tatuagem.

- Gosta que o chamem Messi do Seixal ou preferia ser o Ronaldo de Manchester?

- [risos]. Não gosto de nenhum dos dois. Porque são comparações sempre… Gosto de ser o Bernardo. Claro que é um orgulho às vezes compararem-me com um jogador ou outro, mas não gosto de nenhuma dessas alcunhas.

- Continua a ser um betinho?

- Há pessoas que dizem que sim. Mas acho que com as experiências que tenho na vida, de vários meios diferentes, sou um misto de tudo.

- Ainda vai de Smart para os treinos?

- Em Portugal, sim, sobretudo quando estou no centro da cidade, porque é muito mais fácil estacionar. Mas se estiver com a minha filha, não, claro.

- Escolheu o Benfica para ser do contra?

- Para ser do contra não, porque o meu pai também é benfiquista. A minha mãe é que é sportinguista. Do lado da minha mãe são todos sportinguistas, só que o meu pai é benfiquista, levava-me aos jogos, e a influência, felizmente, ficou lá.

- Tem alguma superstição?

- Não.

- Qual foi o maior desafio como pai?

- Não tive muitos. Os primeiros meses… o primeiro mês foi difícil, porque ela nasceu em Portugal e nas primeiras semanas não é muito recomendável viajar. Ficar longe dela nas primeiras semanas foi duro, mas não considero isso um grande desafio, porque a miúda é saudável e é feliz, e é supercalma, porta-se bem. Tem sido impecável.

- Espera algum?

- Espero muitos, obviamente. Ser pai é isso. Até agora tem sido bastante tranquilo, mas calculo que haja momentos bastante difíceis também.