Valeu a pena?

OPINIÃO22.06.201904:00

O meu último contacto com os meus leitores data de 8 de Junho - há duas semanas portanto - quando tinha acabado de sair do forno próprio e já circulava pela internet a sentença proferida no processo que opunha, fundamentalmente, o clube Benfica e a sua SAD ao clube Futebol Clube do Porto, respectiva SAD,  respectivos administradores, Pinto da Costa, Fernando Gomes e Adelino Caldeira, e ainda as sociedades Avenidas dos Aliados SA e FCP Media SA e Francisco Marques, Director de Comunicação.


No dia 9 voei para a Espanha para percorrer outros caminhos, designadamente, os de Santiago, que não os caminhos do direito, da politica ou do desporto. Faz bem, de vez em quando, como que desaparecer da circulação e ir reflectir para outro lado, e por isso repeti a experiência de 2018.


Tive tempo, contudo, para ainda ler a referida sentença, escrever alguma coisa sobre ela, e ler e ouvir alguns comentários, nem todos, na minha opinião, muito acertados. Designadamente, aqueles que reclamavam uma esmagadora vitória dos autores sobre os réus. Na altura, a minha ideia é de que a vitória não era assim tão esmagadora, como diversos opinadores e ‘tudólogos’ - expressão usada por um amigo meu para qualificar aqueles que opinam sobre tudo - queriam fazer crer.


Decidi que, quando voltasse - o que aconteceu no dia 19 - iria analisar a sentença de uma forma objectiva para opinar sobre a distribuição dos pontos na acção, já que quanto à reconvenção - acção do Porto contra o Benfica - esta foi julgada totalmente improcedente e o Benfica absolvido do pedido com custas totais a cargo do Porto!
Posto isto, vamos à acção, começando por dizer que de todos os pedidos formulados pelo Benfica foram absolvidos os réus Avenida dos Aliados SA, Pinto da Costa, Adelino Caldeira e Fernando Gomes, o que implicou um empate geral, inclusivamente, quanto a custas, com 50% a pagar pelo Benfica, pois o seu pedido decaiu, desde logo, quanto a metade dos réus. Quando da elaboração da conta final de custas, veremos o que vai tocar ao Benfica, em termos práticos!


Vejamos, de seguida, o que aconteceu aos 11 pedidos de condenação dos réus, começando por aquele em que o Benfica pedia a condenação dos réus a entregarem ao tribunal «todos os suportes em seu poder contendo a correspondência (ou suposta correspondência) privada das Autoras, nomeadamente a relacionada com e-mails com o domínio slbenfica.pt - ou identificados como tal - ou qualquer tipo de comunicações e documentos provados das autoras, incluindo a correspondência e comunicações contendo dados e segredos do negócio das autoras». Este pedido foi julgado extinto por inutilidade superveniente da lide.


Ficam, portanto, 10 pedidos, tendo todos os réus sido absolvidos de 7 deles, restando, assim, três.
Um deles, o de os réus serem condenados a pagar às autoras «as quantias adicionais que vierem a ser reclamadas, a título de indemnização pelos danos supervenientes que a actuação dos Réus continuará a causar às Autoras, incluindo designadamente a título de aproveitamento de segredos de comércio das Autoras, remetendo-se a sua liquidação para momento oportuno - após o seu conhecimento ou a sua ocorrência - ou em sede de execução de sentença, tudo com juros e o mais que for de lei», resultou na condenação do Clube, da SAD e da FCP Media, «no pagamento da quantia que se liquidar em execução se sentença relativamente ao dano causado às Autoras pela apropriação desde Abril de 2017 até à data da liquidação», de certos segredos do negócio, que não temos aqui espaço para enunciar, e que temos algumas dúvidas - mas é apenas uma opinião minha - que algum dia se venha a liquidar!...


Por outro lado, o Benfica, clube e  SAD, reclamavam a quantia de € 784 579, 56 «a título de indemnização pelos custos e despesas diretamente incorridos para mitigar os efeitos das lesões às Autoras às Autoras até à presente data, bem como no pagamento das quantias que se vencerem futuramente e que as Autoras tenham de incorrer com a mesma finalidade, acrescido aquele montante dos juros vincendos desde a citação até às taxas legais aplicáveis até efectivo e integral pagamento», e a sentença além de reduzir em 33% a quantia pedida a título de danos emergentes a €523.023,04 (acrescida de juros), nega, em nossa opinião, «o pagamento das quantias que se vencerem futuramente».
Finalmente, quanto ao grande pedido de dezassete milhões «a título de indemnização equitativa pelos danos de difícil quantificação causados às autoras até à presente data», e que o tribunal fixou, a título de danos não patrimoniais pela divulgação da sua correspondência, no montante de 1 430 000 euros, cumpre assinalar que esta verba significa pouco mais de 8% do pedido, o que, na minha modesta opinião, é uma tremenda derrota material, que não chega a ser uma vitória moral, porque tal redução, como se destacou na nossa anterior crónica, foi assim justificada: «O dano é, em concreto, atenuado pela veracidade das afirmações e pela sua natureza. Não podemos esquecer que, o facto de as afirmações contidas na correspondência serem verdadeiras implicaria sempre uma redução da indemnização como característica relevante do caso concreto, porque o ‘Direito não pode encarar com os mesmos olhos a verdade e a mentira’».


A sentença, como é óbvio, não transitou em julgado, desconhecendo eu se é ou não intenção de qualquer das partes recorrer. Em consequência, é apenas com base nesta sentença que eu acho, de uma forma objectiva, que o Benfica não ganhou.
Mas deixemo-nos de hipocrisias e sejamos sinceros. Neste momento, o Futebol Clube do Porto e duas das suas sociedades estão condenadas a pagar uma quantia de menos de dois milhões de euros pela divulgação dos e-mails que todos conhecemos. E pergunto eu, muito objectivamente, se o Porto, antecipadamente soubesse que iria pagar dois milhões de euros pela divulgação dos e-mails, não faria na mesma essa divulgação? E o Benfica, como sói dizer-se, não pagaria essa quantia para que os e-mails não fossem divulgados? Cada um que responda segundo a sua convicção, que eu tenho a minha convicção e a minha resposta.


Aliás, não será de trazer à colação aquela teoria (ou prática) defendida há uns anos pelo então e actual Presidente do Benfica de que mais valia colocar certas pessoas nos lugares certos de que fazer muitas aquisições de jogadores!


Não sabemos que consequências advirão da divulgação dos e-mails. Só depois de todos os veredictos sobre os processos que gravitam à volta dos e-mails poderemos perguntar, como o poeta: valeu a pena?


Ele respondeu que «tudo vale a pena quando a alma não é pequena»; nós só então responderemos se a quantia foi grande ou ... pequena, porque só então saberemos se valeu a pena!...