Um bom fim-de-semana
1 - Na passada sexta-feira, estando em Berlim, não pude ver o Boavista-Benfica. Socorri-me do relato radiofónico. Há muito que não acompanhava o meu clube desta maneira. Foi, pois, uma oportunidade para regressar à magia de seguir o desenrolar de um jogo pelo recurso auditivo. Confesso que me senti mais nervoso do que se o estivesse a acompanhar visualmente.
A rádio continua a ter o fascínio da nossa imaginação que segue o relato e o tenta moldar em função das nossas expectativas. Assim como o livro é o nosso espaço de companhia estando sós, a rádio é a nossa imaginação solitária, mesmo estando acompanhados.
Há muito que a rádio virou parente pobre da televisão. O que é certo é que existe antes desta e perdura para além dela, pese embora o totalitarismo televisivo dos dias de hoje. O que, só por si, espelha a sua força, ancorada na presença da imagem criada através do som. A rádio tem de liberdade o que o televisor tem de prisão. A rádio tem de ilimitado na nossa imaginação o que a televisão tem de redutor da mesma imaginação.
Um relato de futebol, escutado na rádio, tem um movimento, uma emoção, um tempo, diferentes da pasmaceira de que muitas partidas de futebol não são capazes de ultrapassar. Um mau jogo é sempre um mau jogo no ecrã, mas na rádio pode transformar-se num bom jogo, porque jogado dentro de nós, numa mistura da adrenalina profissional de quem no-lo transmite e de adrenalina sentimental de quem o escuta.
Curioso que, ouvindo o relato do jogo do Bessa, quase nunca olhei para o relógio, como obstinadamente faço quando o vejo no estádio ou na televisão. Não sei porquê, mas talvez porque o relógio imerge no entusiasmo de quem nos comunica o que se passa no campo. Também o som que vem das bancadas foi mais audível dentro de mim porque menos disperso na sinestesia dos meus sentidos.
É claro que este reencontro com a rádio do futebol foi, neste caso, feliz. Porque ganhou o meu Benfica, porque jogou bem e porque ultrapassou, com classe, um jogo que eu, com o meu incurável pessimismo, antevia difícil.
O onze que derrotou o Boavista parece-me ser o melhor que o Benfica pode apresentar no actual momento. Com Rafa e André Almeida, em boas condições físicas, está encontrada a melhor solução para vencer o campeonato.
2 - A nível do nosso campeonato, o Benfica de Bruno Lage continua imparável: desde Janeiro deste ano 32 jogos, 30 vitórias e cem por cento de jogos fora de casa ganhos (15), com mais golos marcados (33) e menos sofridos (5). Nesta época, 10 vitórias nos últimos 10 encontros. Provavelmente inédito é o facto de, durante todo ano civil de 2019, o Benfica ter vencido todos os encontros fora de casa para o campeonato nacional.
Cada qual pensa como melhor entende, mas, por mim, não alinho numa onda de críticas, ou mais concertadas, ou mais avulsas, que vou lendo e ouvindo sobre o trabalho do treinador encarnado. Acho-as até de uma grande ingratidão. Há sempre os compulsivos insatisfeitos que estão invariavelmente na expectativa do treinador que se segue, numa espécie de sebastianismo recorrente. Pergunto: quem então em Portugal? Ou que técnico estrangeiro saído de alguma chicotada psicológica e em regime de paradisíaco desemprego temporário?
3 - Na lista dos melhores marcadores, Vinícius com 10 golos e Pizzi com 9 ocupam os primeiros lugares e os dois em conjunto têm mais golos do que 13 das equipas do campeonato, e apenas menos 1 do que o Sporting e 6 do que o Porto.
Carlos Vinícius fez um grande jogo no Bessa. Os mais cépticos, mesmo entre os benfiquistas, já terão percebido que se trata de uma aquisição certeira e por um custo que, contrariando as habituais más-línguas, poderá ser bem reprodutivo.
Carlos Vinícius deveria ter dedicado os dois belos golos que marcou no passado sábado a um senhor que teima em arbitrar no nosso campeonato. Refiro-me ao inigualável Fábio Veríssimo, assim retribuindo a inimaginável atribuição, há uma semana, de um dos seus 3 golos a um defesa do Marítimo. Nada tendo podido fazer nesse jogo para anular os quatro golos marcados pelo Benfica, vai daí vingou-se no atacante brasileiro. Aliás, nos jogos do Benfica, o brilhante juiz transfigura-se, como já esta época se viu no Jamor, no jogo contra o Belenenses SAD, em que uma grande penalidade clara foi fabiamente ignorada pelo varíssimo árbitro.
Não sei se a Liga, tendo aceitado o douto critério deste mestre de mal apitar não atribuindo o golo a Vinícius, irá transformar em jurisprudência aquela estapafúrdia decisão. Sugiro mesmo que o (i)racional se generalize de tal modo que sempre que um golo, precedido de uma mão ou do corpo do guarda-redes, seja atribuído ao eficiente guardião. Provavelmente o guarda-redes da equipa com mais golos sofridos poderia, assim, vir a vencer a Bola de Prata e, quem sabe, se a UEFA não alteraria também o critério para a Bola de Ouro. É pena os postes serem inertes, porque se o esférico lá batesse antes de entrar também poderiam ser-lhes atribuídos golos
4 - Li, entretanto, a habitual e compulsiva pulsão pavloviana do comunicador do FCP, a propósito do jogo no Bessa. Certamente por lapso, não se terá referido à conveniente troca de cor do cartão dado ao axadrezado que derrubou Chiquinho quando este se preparava para marcar. Quanto ao resto, pura coerência com os casos que, nesta época, já beneficiaram o Porto. Não é preciso recordá-los, pois não? Mas, para os mais amnésicos, relembro alguns lances exemplares neste campeonato: a expulsão injustificada aos 40 segundos de um jogador do Vitória de Guimarães por C. Xistra; um escandaloso penálti a favor do Santa Clara e um cartão vermelho perdoado, por agressão clara de Uribe; um penálti assinalado em Portimão, mas de todo inexistente; o empate conseguido no Funchal através de um lance com dupla falta portista, mas generosamente concedido curiosamente pelo mesmo árbitro do Boavista-Benfica, Jorge Sousa, em que agora resolveram desancar…
Mas, a seguir ao Bessa, veio o empate do FCP no Jamor. E, evidentemente, quando não se ganha, lá se inventam umas reles desculpas para uma exibição menos conseguida da equipa. Desta vez, diante do valoroso Belenenses SAD, a culpa do empate também tinha de ser da arbitragem, o que, na linguagem sibilina dos seus autores, deve interpretar-se como sendo obra do ... Benfica! Isto para já não falar no mau perder pontos de Sérgio Conceição que considerou como equipas rivais as de arbitragens (um ingrato) e na habitual pressão em redor do árbitro no fim dos jogos não ganhos, com o director do futebol, o médico (!) e um personagem da comunicação todos ao molho a pedir contas.
Já num outro registo, o novo director mediático do Sporting resolveu disparar contra o arqui-rival. Assim fez a sua primeira prova de vida, zurzindo contra o Benfica, juntando alhos com bugalhos, misturando demagogicamente situações de diferente natureza e de outros assuntos já decididos pela Justiça. Como benfiquista e não diminuindo a sempiterna rivalidade entre os adeptos dos grandes clubes, custa-me ver pessoas responsáveis do SCP a considerar que a melhor maneira de resolver os graves problemas que o clube enfrenta é tão-só atirar-se ao Benfica sem peso, sem conta e sem medida. Assim não vão longe...