Uganda ou no Ruanda? Não, na obscura Itália!
Bruno Fernandes
Bem sei que os balanços só se fazem no fim, mas o avanço já é tal que não sobra espaço para qualquer hipotética discussão. Bruno Fernandes realizou uma temporada incrível e merece sem contestação ou dúvida alguma o título de melhor jogador do ano. O Sporting julgava que tinha comprado uma cautela brindada com a terminação e afinal saiu-lhe o prémio maior da lotaria. E onde andava escondido tal tesouro, que passou completamente despercebido aos grandes sábios recrutadores da concorrência? Nas trepidantes ligas do Uganda ou do Ruanda? Não, parece que era no obscuro campeonato italiano. E o mérito da sua apresentação ao futebol português deve-se, em primeira instância, a Rui Jorge, selecionador dos sub-21. Parece justo lembrá-lo.
Rafa Silva
Se um andava escondido, outro há que andava disfarçado, ou mascarado, ou camuflado, sei lá, mas este rapaz que atende pelo nome de Rafa Silva sofreu com toda a certeza uma metamorfose. Este ou um outro que há uns anos veio de Braga para vaguear - pouco, reconheça-se - nos geralmente miseráveis relvados nacionais. Um e outro de comum só têm o mesmo nome.
Jurgen Klopp
Quem faz o favor de me distinguir com a leitura do que escrevo neste jornal, saberá da profunda admiração que, há já muitos anos, dedico a Jurgen Klopp (apesar do Liverpool ser apenas a terceira equipa que treina, depois do Mainz e do Borussia Dortmund). Mas não lhe conhecia dotes de profeta. Disse ele antes do inclassificável jogo com o Barcelona: «Suceda o que suceder hoje, temos de fazer um jogo inesquecível.» Pecou por defeito: dizer inesquecível é dizer muito pouco, quase nada.
O desporto não é para velhos - ou é?
«Este País Não É Para Velhos» é o título de uma aclamada obra cinéfila realizada pelos irmãos Cohen, com a qual conquistaram 4 Óscares em 2008, incluindo o de melhor filme. E no ano seguinte, como sempre sucede, outros foram os vencedores.
A mesma sorte atinge todas as modalidades desportivas, época após época: a aparição e a consagração de novas estrelas. De par com o abandono de outras, seja ainda no topo da sua carreira - como, aliás, mereceriam todos os verdadeiros campeões - ou já longe do auge das suas capacidades. Entre os primeiros conta-se um muito recente exemplo: depois de mais uma prestação memorável, traduzida na vitória da sua equipa, os Dallas Mavericks, contra os Phoenix Suns, por 120-109, o basquetebolista alemão Dirk Nowitzki, de 40 anos, anunciou sua retirada da NBA, a principal liga de basquetebol do mundo, na qual jogou 21 (vinte e uma!) épocas consecutivas, sempre pela mesma equipa. E fê-lo com os adeptos a gritarem, em pano de fundo, «M-V-P! M-V-P!» (Jogador Mais Valioso).
De qualquer forma, o tempo não pára, mesmo para quem esteja sempre parado. E assim se processa uma permanente renovação, seja de um modo mais patente, seja de forma quase imperceptível. Mas há casos e casos. Examinemos alguns exemplos em concreto. No ciclismo é impensável tirar os olhos do mais precoce de todos os neófitos, o belga Remco Evenepoel, de 18 anos, campeão da Europa e também campeão do mundo na categoria de juniores, tanto na prova em linha como em contrarrelógio individual. Mas esta época vai seguramente marcar a consagração de toda uma geração, de que constituem nomes paradigmáticos o espanhol Enric Mas, o holandês Mathieu van der Poel, o francês Davdi Gaudu, os eslovenos Matej Mohoric e Tadej Pogacar, não falando já do verdadeiro case study que é Primož Roglic (um ex-saltador de esqui que chegou já tarde às bicicletas), além dos colombianos Miguel Angel Lopez e Egan Bernal, do russo Pavel Sivakov ou do inglês Tao Geoghegan Hart. Isto sem falar já nos gémeos Yates, Adam e Simon.
Também na Fórmula 1 se está a assistir à súbita aparição de uma novíssima guarda de jovens talentos. Arrisco mesmo dizer que jamais na história da modalidade se vira coisa igual. Este fenómeno sem precedentes começou com a explosiva afirmação do holandês Max Verstappen, ainda menor de idade quando se estreou no circo, repetiu-se no ano passado com o monegasco Charles Leclerc, a quem bastou uma só época para se tornar piloto oficial da Ferrari, e prossegue agora com os rookies ingleses George Russell e Lando Norris. Tudo gente que acelera para o futuro de faca nos dentes.
Em suma: estes desportos não são para velhos. Excepto se se chamarem, por exemplo, Alejandro Valverde (actual campeão do mundo de ciclismo, com 39 anos) ou Valentino Rossi, o qual, com 40 anos feitos, persiste no objectivo de arrecadar o seu décimo título mundial de motociclismo…
Já agora: que idade tinha Carlos Lopes quando conquistou a medalha de ouro na prova da maratona nos Jogos Olímpicos de 1984 disputados em Los Angeles? 37 anos! E quantos tinha Joaquim Agostinho, indiscutivelmente o melhor ciclista português de todos os tempos, quando completou a sua derradeira Volta à França? Pois, nem mais nem menos do que 40 (quarenta!)
Entrevista imaginária
- Qual a sua principal virtude?
- É difícil dizer… Talvez a humildade.
- E o seu principal defeito?
- Ah, defeitos, defeitos, sinceramente não estou a ver... só se for acreditar nos outros e ser demasiado bonzinho…
- Concorda com Pascal quando afirma que «o universo é uma esfera cujo centro está em toda a parte e a circunferência em parte nenhuma»?
- Só digo isto: quantas Bolas de Ouro é que esse sujeito já ganhou? Quantas?