Triste!

OPINIÃO13.08.202107:00

Creio que nem o Barcelona, nem o próprio Lionel Messi mereciam este fim

FALA-SE, naturalmente, muito de Messi, quase não se fala de outra coisa, aliás, e fala-se, naturalmente, muito do Paris Saint-Germain. Fala-se de Messi, fala-se de Neymar, de Mbappé, de Sérgio Ramos, de outros reforços como Donnarumma ou Wijnaldum, fala-se até do recente campeão da Europa, o italiano Marco Verratti, fala-se de tanto nome, mas a verdade é que toda a gente parece esquecer-se de um rapaz alto e magricela, parecendo às vezes meio desengonçado, carregado de talento desde que nasceu para o jogo, mas hoje já com a maturidade que ainda não tinha quando brilhou no Benfica, naquela fantástica equipa de 2009 conduzida por Jorge Jesus.
Ángel Di María, um miúdo hoje com 33 anos - como o tempo passa!!!... -, nascido oito meses depois de Messi, no mesmo bairro da cidade argentina de Rosário, é um dos maiores talentos naturais que vi jogar na última década, e no outro dia até me arrepiei ao recordar o que ele fez pela Argentina, com um intervalo de… 13 anos!
Pois sabe, caro leitor, quais foram os dois últimos grandes títulos conquistados pela seleção alvi-celeste? A medalha de ouro nos Jogos Olímpicos de 2008, em Pequim (China), e, agora, a Copa América de 2021, realizada no Brasil, troféu que os argentinos não celebravam desde 1993!
Na China, há 13 anos, resultado de 1-0 para a Argentina, na final com a Nigéria; agora, o mesmo resultado de 1-0 para a Argentina, na final com o Brasil.
Sabe quem marcou os únicos golos das duas finais?
Ángel Di María!
E sabe como os fez?
Quase, quase da mesma maneira, executando chapéus aos guarda-redes, com a diferença de um (em Pequim) ter sido marcado sobre a esquerda, e outro, agora, em pleno Maracanã, no Rio de Janeiro, marcado sobre a direita. Dois golos quase tirados, sim, a papel químico, a darem as últimas duas vitórias importantes à Argentina, mas com um intervalo de… 13 anos! Verdadeiramente inacreditável. Se desconfia, vá ao Youtube e veja com os seus próprios olhos. Nada melhor.
Já agora, aproveite para recordar os jogadores que acompanharam Di María naquela final de 2008, como Messi, Aguero, Riquelme, Mascherano, Garay, e os que dessa final puderam, agora, celebrar  o êxito na Copa América - além de Di María, apenas Messi e Aguero!

POIS é este Ángel Di María, amigo de infância de Lionel Messi, com  quem cresceu e se formou a jogar nas ruas do mesmo bairro, e há muito vivem como companheiros de seleção, que nas contas de todos os analistas parece condenado a perder o lugar no poderoso PSG, que o futebol europeu, corado de vergonha, vê ganhar cada vez maior dimensão nesta espécie de farsa consentida pela própria UEFA, tão prolífica a defender a verdade desportiva, mas ao mesmo tempo tão incapaz, submissa, de impedir que na mesma equipa se juntem Messi, Neymar, Mbappé, Sérgio Ramos, Donnarumma, para citar apenas os que certamente custam mais dinheiro por mês… ao Catar!
Deve o talentoso Di María, porém, dormir de consciência tranquila; podem, tristemente, tirar-lhe o lugar na equipa francesa, mas ninguém pode tirar-lhe o orgulho de ter sido tão absolutamente decisivo nas duas últimas grandes conquistas da seleção da Argentina, tão rica em talentos e, nas duas últimas décadas, tão pobre, afinal, em resultados. 

Q UANTO a Messi, para muitos o melhor jogador da história do futebol, para mim seguramente um dos dois melhores da atualidade, com Cristiano Ronaldo, e um dos três melhores de sempre, junto a Diego Armando Maradona, a ida para Paris já não teve, apesar de tudo, creio, o impacto que teria tido se, há um ano, quando Messi quis bater com a porta do Barcelona, o mesmo PSG, ou qualquer outro clube, o tivessem acabado por contratar.
É verdade que com a saída do anterior presidente, Josep Maria Bartomeu, e o regresso de um ex-presidente, Joan Laporta, à liderança dos catalães, admitia-se, evidentemente, como bastante provável, a continuidade de Messi no clube que o viu crescer, que o fez crescer, que o tirou de uma infância pobre e o tornou num multimilionário, e lhe deu todas as condições para que ele pudesse, na realidade, provar ao mundo ser um jogador tão verdadeiramente único e tão excecionalmente brilhante e bem sucedido.
Mas 21 anos, 35 troféus e muitas centenas de milhões de euros depois, Messi decidiu, por fim, virar costas ao Barcelona, com o clube a ser incapaz de assumir novas e exigentes responsabilidades financeiras com o jogador, que só nas últimas quatro épocas terá custado aos catalães qualquer coisa como 550 milhões de euros!!!

DIZ Messi que fez tudo o que lhe foi possível para continuar no Barcelona, mas sem qualquer demagogia barata ou insensata utopia, se Messi quisesse mesmo ter permanecido no Barcelona, para ali acabar a mais singular carreira que o futebol mundial testemunhou, pergunto, não teria ficado?!
O Lionel Messi com duas décadas de Barça, que nos habituámos a confundir com a essência do espírito blaugrana, absolutamente multimilionário e com uma relação de amor, presume-se, com a cidade e com os catalães, não teria sido capaz de dizer ao Barcelona que jogaria no Barcelona até ao fim dos seus dias pagasse-lhe o clube o que pudesse pagar-lhe?
Não creio, em suma, que Messi tivesse verdadeiramente a mais profunda e autêntica vontade de continuar no Barcelona, sabendo que estou - contra os meus princípios - a julgar as genuínas intenções de Messi. Não resisto, confesso, a desafiar a tolerância que o bom senso me impõe, arriscando contrariar a ideia de que Messi, coitado, acabou empurrado para fora do Barcelona porque o Barcelona, em sérias dificuldades, não tem dinheiro para lhe pagar, ou melhor, não tem para pagar a Messi o dinheiro que Messi ainda quer receber para continuar a jogar, sendo que, bem pelo contrário, o que me parece é que foi Messi que empurrou o Barcelona para fora da sua vida!
Diz-se que Messi aceitou reduzir o salário em 50 por cento para fazer um novo contrato com o Barcelona. Nenhuma razão para duvidarmos. O que parece, também, ser verdade, é que Messi, pelos vistos, não se dispôs, com isso, a nada de mais, porque se é verdade que recebia por época 70 milhões de euros líquidos no Barça, garante-se agora que receberá no PSG 35 milhões anuais, pelo que se pode concluir que Messi só estava disposto a fazer ao Barcelona precisamente o desconto que acabou por fazer ao PSG, como se os dois clubes tivessem surpreendentemente a mesmo importância na vida do jogador.
Tem evidentemente Messi, como qualquer jogador nas mesmas circunstâncias, ou seja, livre de responsabilidades contratuais, todo o direito de exigir, negociar, escolher, optar e mudar. Foi o que Messi fez. Não precisa é de carpir as lágrimas como se estivessem a forçá-lo a fazer o que não queria. Arrisco mais: Messi já não sentia, sequer, ligação especial a este balneário do Barça, e muito menos após a saída de Luis Suárez para Madrid, e parece, legítima e naturalmente, mais forte, o apelo que lhe chega de Paris e das mais fortes amizades com Neymar, Leandro Paredes ou Di María. 

EM todo no caso, pode Messi vir a ganhar tudo no Paris Saint-Germain, e pode, se assim for, sentir-se de novo tão feliz como foi, em Barcelona, sobretudo com Guardiola, Puyol, Daniel Alves, Xavi, Iniesta, com os quais formou, entre 2009 e 2012, talvez, e muito provavelmente, a melhor equipa da história do futebol, ou mesmo com Neymar e Suarez, com quem ganhou a última Liga dos Campeões, em 2015.
Pode o PSG representar, ainda, para Messi o desafio que ele, afinal, nunca teve, o de sair de casa e fazer-se ao mundo, para fazer o que ainda não foi feito na sua carreira e poder provar ao mundo do futebol que é capaz de fazer o que há muito conseguiu Cristiano Ronaldo, conseguir atingir o mesmo sucesso em diferentes clubes.
Mas apesar de tudo isso, o que dificilmente alguém conseguirá é levar os adeptos do Barcelona, mas também, acredito, muitos fãs um pouco por todo o mundo, a ignorar a ideia de que o próprio Messi se traiu, no fundo, a ele próprio, por trocar uma vida no mesmo clube por dois anos de contrato e mais umas largas dezenas de milhões de euros num principado sem alma e sem caráter, sujeitando-se, ao mesmo tempo, a deixar o Barcelona realmente por uma das mais pequenas portas, com uma Taça do Rei apenas na montra de troféus ganhos nas últimas três temporadas.
Creio que nem o Barcelona, nem o próprio Lionel Messi mereciam este triste fim!