Toma lá, dá cá!
Ou muito me engano ou o fator emocional vai ser o mais decisivo para encontrar o novo campeão da Primeira Liga, nesta espécie de campeonato agora regressado em condições nunca vistas em mais de cem anos de association. Um prolongamento da competição interrompida em março, suscetível, na verdade, de vir a promover bons jogos de futebol mas dificilmente capaz de promover, como parece compreensível, os grandes espetáculos que só a atmosfera normal dos estádios consegue encenar.
Creio que o fator emocional começou já por ser decisivo na derrota do FC Porto em Famalicão e no empate do Benfica, ontem, na Luz, com o Tondela.
Tendo o fator emocional sido decisivo para o líder marcar passo, decisivo se tornou, evidentemente, para o Benfica não conseguir regressar ao primeiro lugar, perdido, se bem se lembram, após catastrófico mês de fevereiro.
É verdade que o Benfica recuperou o ponto que tinha de atraso mas, mesmo que apenas um pontinho, é preciso dizer que o conseguiu sem qualquer brilho.
Ou seja, mesmo tendo passado tanto tempo desde a última que os vimos, bem parece que está, afinal de contas, tudo na mesma - o FC Porto a perder pontos quando menos se espera (como aconteceu, já em março, com o Rio Ave) e o Benfica a jogar bem menos do que devia, como jogava quando o campeonato entrou de quarentena.
Esteve, pois, a águia, neste regresso à Luz, igual ao que de si própria fomos vendo no tal horrível mês de fevereiro - sem grande alma, sem grande envolvimento coletivo, sem grande velocidade, sem grande intensidade, sem grande agressividade, sem grande criatividade, e, pareceu-me, sem grande espírito de campeão. Este Benfica, por mais que queira, não me parece capaz de animar ou entusiasmar os seus adeptos.
Pode alguém esperar coisas muito brilhantes nesta altura? Claro que não. Mas pergunto se algum benfiquista não estaria à espera de ver o Benfica tomar de novo conta do primeiro lugar, ontem servido de bandeja por um FC Porto que, apesar de tudo, se mostrou mais forte e intenso em Famalicão do que se mostrou o Benfica, ontem, na Luz, com o Tondela.
Para o FC Porto, nada como poder esfregar as mãos com a incapacidade do seu mais direto adversário. E nada como sentir que, tendo dado um valente tropeção, ele não fez, afinal, com que caísse.
Equipa realmente muito técnica, este Benfica de Lage não tem (nem tinha, já, mesmo antes de toda esta crise) o peso e o poder físico e atlético, nem joga com a intensidade que lhe permita, sobretudo quando as coisas não lhe correm bem, dar a dominadora ideia de mandar verdadeiramente no jogo. Será problema a inclusão de um jogador como Weigl - que tem de jogar pelo que custou mas parece ainda distante do que se lhe exige? Ou o problema é depender demasiado de jogadores como Pizzi ou Rafa, claramente longe do que valeram no primeiro terço da época? Ou o problema será mesmo o treinador, incapaz de levar a equipa a recuperar o que se espera de uma equipa campeã?
Mesmo quando domina, o Benfica não faz estragos; mesmo quando é superior continua, como em fevereiro, longe de ser eficaz, e parece viver demasiado de iniciativas individuais e das opções de cada um. Não ter conseguido regressar ao primeiro lugar depois da derrota do FC Porto, só pode ter um significado para os benfiquistas: frustração! O que o FC Porto lhe deu quarta-feira, devolveu o Benfica ontem com inesperada facilidade.
Em ambos, FC Porto e Benfica, se nota, porém, fragilidade emocional. Em Famalicão, ficou a pergunta: como é que uma primeira parte tão boa deu, depois, lugar a uma segunda parte tão fraca? E ontem na Luz, permaneceu a questão: como pode o Benfica ter tão poucas ideias para atacar o regresso à liderança?
Claro como água: o FC Porto foi, como se esperava, claramente a melhor equipa na primeira parte em Famalicão e podia e devia ter feito pelo menos dois golos; mas foi incompreensivelmente apático na segunda. Foi, na Luz, o Benfica tão macio e inofensivo na primeira parte, e tão ansiosamente perdido no ataque na segunda.
Em ambos, problemas emocionais, independentemente de outros. No FC Porto, por exemplo, pior do que o erro de Marchesín, pareceu-me ser a atitude fria, surpreendentemente abatida, muito desanimada, inerte, algo indolente até, do guarda-redes argentino, que tão intenso e envolvido se revelou até março. No Benfica, pior do que não ter intensidade só mesmo o desespero em que parece tão facilmente cair.
Valerá a pena esperar para se ver o que vai seguir-se?
Não sei se vale, porque creio que o que vai seguir-se vai ser, mais coisa menos coisa, o que esta semana se viu - um FC Porto previsivelmente mais guerreiro e combativo, e um Benfica previsivelmente mais... previsível e menos intenso.
Como estavam em março!