Terminou em glória o ciclo Amorim/Viana
Sem retirar mérito aos méritos de Rui Borges, que salvou do naufrágio o barco leonino que, à sua chegada, metia muita água, as últimas cinco épocas, que renderam três títulos nacionais ao Sporting, foram planificadas pela dupla que agora está em Manchester.
Chegou ao fim o Campeonato Nacional de 2024/25, parabéns aos vencedores, honra aos vencidos. Esta foi uma competição que fica para a história, essencialmente porque o Sporting, 71 anos depois, voltou a ser bicampeão nacional de futebol, um ‘borrego’ que durava desde o ano em que a UEFA foi fundada, em Basileia, na Suíça. Aos leões coloca-se agora nova meta, a de serem, 72 anos depois, tricampeões nacionais. Para terem esse objetivo tinham de ser campeões e bicampeões, e essas montanhas já foram superadas...
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Falar deste Campeonato de 2024/25, do ponto de vista dos leões, é como embarcar numa montanha russa de emoções, da euforia com Ruben Amorim, da depressão com João Pereira, e da esperança com Rui Borges. Mas, provavelmente, dentro em pouco estes ‘detalhes’ serão esquecidos e a história apenas registará o Sporting como bicampeão nacional de 2023/25.
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No futebol, ninguém ganha nada sozinho, mas há jogadores que têm uma influência na equipa que não pode, nem deve, ser desvalorizada. É o caso de Viktor Gyokeres, agora (tudo indica) de saída, que cumpriu de leão ao peito uma etapa impressionante, não só pela quantidade de golos que marcou, mas essencialmente por uma forma de jogar que influenciou a mecanização do conjunto. Para dar uma ideia mais precisa da importância do ponta-de-lança sueco nesta marcha leonina de 24 meses, será boa ideia lançar mão de algumas comparações: no ‘bi’ de 1952/54, o guarda-redes Carlos Gomes fez 100 por cento dos jogos (52, porque o campeonato tinha 26 jornadas), enquanto o defesa Manuel Passos fez 51 (98%); Viktor Gyokeres, em 2023/25 realizou 66 jogos em 68 possíveis (campeonato com 34 jornadas), o que dá uma utilização de 97%. Se a isto acrescentarmos uma média de golos estratosférica (um golo por jogo, nos dois campeonatos), estamos perante alguém que, na história do Sporting, se coloca no patamar de eficácia de Fernando Peyroteo, Héctor Yazalde e Mário Jardel.
De sábado para domingo houve festa no Marquês, no próximo domingo o Jamor acolhe o dérbi dos dérbies na final da Taça de Portugal e em Alvalade termina um ciclo, marcado por Ruben Amorim e Hugo Viana, que construíram os plantéis que deram, em cinco épocas, três campeonatos aos leões. A próxima temporada será trabalhada por outros protagonistas, a quem foi deixada uma fasquia muito elevada, porque boa parte do sucesso verde-e-branco teve a ver com a assertividade e critério nas escolhas, pensadas para um determinado modelo de jogo. A dupla Amorim /Viana, apoiada por Frederico Varandas, soube sempre quem queria, e para que função era pretendido. Há um ditado que postula que «para quem navega sem rumo, nenhum vento é favorável»; ora, se houve algo que nunca mereceu dúvidas aos responsáveis de topo do Sporting nos últimos anos, foi o caminho que desejavam trilhar, e nem mesmo nas piores fases (serem eliminados em campo neutro, pelo Varzim, do quarto escalão, ou perderem a Supertaça para o FC Porto, depois de estarem a vencer por 3-0, por exemplo) houve vislumbre de hesitação.
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Finalmente, Rui Borges, que chegou quando a casa parecia que vinha abaixo, na sequência do abalo provocado pela saída de Rúben Amorim que João Pereira não foi capaz de controlar, merece palavras elogiosas. Começou por tentar inovações face ao modelo vigente, mas teve a lucidez de perceber que o plantel estava formatado num determinado sentido, e na cabeça dos jogadores morava uma convicção (e uma habituação) profunda quanto aos méritos da fórmula. Assim, deu um passo atrás para poder dar vários em frente, e terminou a época, pode dizer-se, com a equipa na mão. Mas como no futebol a memória é sempre curta e o resultado é quem mais ordena, irá começar 2025/26 em estado de graça, mas deverá ter por modelo a filosofia de Amorim/Viana, que hierarquizaram os momentos: primeiro definiram o que queriam, e só depois foram à procura de quem queriam para o que queriam.
Para quem gosta destas curiosidades, deixo a lista dos bicampeões de 1952/54, (52 jogos nos dois campeonatos) e a de 2023/25 (64 jogos nos dois campeonatos:
1953/55 - Carlos Gomes (52J), Manuel Passos (51), João Martins (49), Juca (48), Manuel Vasques (45), Manuel Caldeira (45), Fernando Mendonça (35), José Travassos (28), Albano (27), Armando Barros (25), Galileu (14), Vicente Camilo (14), João Faustino (7) e Teodoro Aparício (3). Nestas épocas não eram permitidas substituições, pelo que ‘apenas’ 14 jogadores chegaram ao bicampeonato. De referir ainda que nesta lista estão três dos Cinco Violinos – Albano, Vasques e Travassos – faltando Jesus Correia, que ainda foi campeão em 1952/53, optando a seguir pelo hóquei em patins (seis vezes campeão mundial, e outras tantas, europeu, como jogador, e duas vezes campeão mundial como selecionador) e Fernando Peyroteo, que já tinha abandonado a atividade.
2023/25 - São 19 os mais recentes bicampeões pelo Sporting, que nas duas épocas, em que foram permitidas cinco substituições por jogo, disputaram campeonatos com 34 jogos cada: Gyokeres (66J), Trincão (65), Gonçalo Inácio (60), Hjulmand (58), Matheus Reis (57), Catamo (57), Diomande (57), Morita (52), Pedro Gonçalves (46), Daniel Bragança (46), Eduardo Quaresma (40), Nuno Santos (38), Esgaio (37), Edwards (32), St. Juste (25), Fresneda (23), Israel (15) Essugo (6), Mateus Fernandes (2).
No ciclo de cinco anos planeado por Amorim/Viana, foram três vezes campeões nacionais os jogadores Pedro Gonçalves (32 jogos em 2020/21), Nuno Santos (31), Daniel Bragança (21) Gonçalo Inácio (20), Matheus Reis (15), Quaresma (2), Essugo (1).
BENFICA
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Vencedor da Taça da Liga, segundo no Campeonato Nacional e ainda com a Taça de Portugal e o Mundial de Clubes para discutir, talvez seja demais dizer que a época do Benfica sabe a pouco, mas a verdade é essa: sabe a pouco. Porque o plantel é forte, passou a ser aproveitado com coerência a partir do momento em que Bruno Lage chegou ao clube (o Benfica estava a cinco pontos do Sporting, e nos 30 jogos de Lage ganhou três aos leões, 11 ao FC Porto e 15 ao SC Braga), e esteve pertíssimo de chegar ao 39. Houve três momentos que, emblematicamente, podem ficar associados à perda de um título nacional que ficará, por certo, atravessado na garganta dos benfiquistas:
O primeiro foi a decisão insensata de manter Roger Schmidt, que não tinha quaisquer condições, depois de ter afrontado o Terceiro Anel, e fazendo a seguir, da arrogância, a sua imagem de marca, para navegar a nau encarnada.
O segundo foram as lesões simultâneas de Bah e Manu (bom aproveitamento do mercado de Inverno, ainda com Dahl, Belotti e Bruma), que retiraram opções e obrigaram a remendos na equipa.
O terceiro, embora, e a largura da baliza seja de 7,32 metros e não mais, foi o remate ao poste de Pavlidis, no dérbi, num lance que poderia ter dado a vitória ao Benfica.
O que irá seguir-se, com eleições marcadas para o final de outubro, dependerá muito de vários fatores, que vão desde a conquista da Taça de Portugal, ao comportamento no Mundial de Clubes e, provavelmente mais importante do que as anteriores, a entrada ou não na Liga dos Campeões. Só depois de se serem conhecidos estes desfechos será possível tomar o pulso aos humores e amores da nação encarnada.
FC PORTO
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Quando, depois de ter vencido as eleições, André Villas-Boas abriu o cofre do Dragão e só viu teias-de-aranha, devia ter optado por um discurso mais prudente, que falasse em ano zero e que colocasse um teto nas expetativas dos adeptos. Optou por um caminho diverso, o que pode ter-lhe trazido benefícios em termos de entradas anuais, mas colocou-se demasiado a jeito face a um punhado de opositores que apenas pretendiam encontrar pretextos para atacá-lo. Fez bem quando contratou Vítor Bruno, que teve a coragem de aceitar um plantel que era claramente o menos apetrechado dos três Grandes, mas não foi capaz de resistir às pressões externas para mudar de técnico, o que acabou por não lhe trazer qualquer benefício (como a classificação e os pontos mostram). Mais a mais, acabou por dar a Martín Anselmi um presente envenenado, ao retirar-lhe as duas unidades mais importantes - Nico González e Galeno – para apagar fogos de tesouraria. De qualquer forma, teve na afirmação de Rodrigo Mora o momento de maior satisfação, subsistindo a dúvida sobre quais os anéis de que vai ter de desfazer-se no defeso para não perder os dedos. Diogo Costa tem sido o mais falado... além disso, precisa de uma requalificação profunda do plantel, sendo que o facto de ir disputar a Liga Europa pelo segundo ano consecutivo não contribui para o fortalecimento do músculo financeiro de que necessita para reerguer o clube.