Sobre Mourinho e Jesus

OPINIÃO25.11.201903:00

ESTA foi uma semana boa para o futebol português. E para aqueles que, dele gostando, ficam felizes com o sucesso daqueles que melhor o representam, mostrando lá fora a qualidade (também a há, por muito que muitos prefiram continuar a puxar pela nossa face mais feia…) que por cá existe. Por estes dias, dois treinadores lusos fizeram as manchetes um pouco pelo mundo fora. Primeiro José Mourinho, que após quase um ano no desemprego - não forçado, porque, percebe-se, um treinador como Mourinho só está tanto tempo desempregado se quiser… - voltou ao ativo. Regressa pela mão do Tottenham, um clube que, não sendo pobre, está longe do poderio (financeiro e desportivo) a que se habituou quem já treinou Chelsea, Real Madrid e Manchester United. Não faltou, pois, quem tenha torcido o nariz à opção de Mourinho, olhando para os spurs como um passo atrás ou, até, como a confirmação de que aquele que em 2004 se apresentou em Londres como o special one percebeu ter, 15 anos depois, perdido a aura que sempre o acompanhou.

Não é necessariamente assim. E, bem vistas as coisas, o Tottenham pode até ser a melhor opção para Mourinho mostrar que não perdeu o toque de Midas. É natural que este ano sabático lhe tenha dado tempo para pensar. Para perceber os erros que cometeu e, mais importante, para perceber o que queria fazer daqui para a frente. Continuar, apenas, a ganhar muito dinheiro seria fácil. Tal como fácil seria continuar a ganhar títulos em clubes para quem eles (os títulos, entenda-se…) representam, muitas vezes, só mais um. Mas há muito que o dinheiro deixou de mover Mourinho. E títulos é coisa que não lhe falta no currículo - e continuará a não faltar, aposto. Neste ano de reflexão Mourinho terá, provavelmente, regressado às origens, aos tempos em que ganhava sem craques comprados a peso de ouro, aos dias em que dependia, apenas, dos seus conhecimentos do jogo e da incrível relação que estabelecia com balneários onde, mais do que apenas jogadores talentosos, pontificavam jogadores que, se necessário, por ele dariam a vida em campo. Foi disso que me lembrei ao ouvir as palavras de José Mourinho na sua apresentação no Tottenham. Lembrei-me muito mais do Mourinho de 2002 do que do Mourinho de 2018. E isso são, do meu ponto de vista, boas notícias. Para Mourinho, para o Tottenham e para o futebol.

DO outro lado do Atlântico, Jorge Jesus calou os críticos com uma estrondosa conquista da Taça dos Libertadores da América. Sobre o feito épico de Jesus já quase tudo foi escrito e dito. Não há, portanto, muito mais a acrescentar. Prefiro falar das portas que este título lhe abre. Sei bem que, muito provavelmente, se dependesse da sua vontade Jorge Jesus nunca teria saído de Portugal. Ficaria por cá, entre Benfica, Sporting, FC Porto e, talvez, SC Braga. Talvez a Jesus tenha sempre faltado o espírito de emigrante, indispensável aos técnicos portugueses que pretendam ganhar a dimensão internacional necessária (seja isso justo ou injusto…) a quem quer ser considerado um grande treinador. Foi quase que empurrado, primeiro para a Arábia, depois para o Brasil, por não se terem, por cá, aberto as únicas portas em que admitia entrar.
Forçado ou não, a verdade é que no Rio de Janeiro deu Jorge Jesus o passo que faltava a uma carreira recheada de sucessos. No Flamengo confirmou tudo o que dele já se sabia: é, de facto, um treinador diferenciado, como ele próprio se define. Mas é um treinador diferenciado que também sabe ganhar fora de Portugal. O desafio que agora se lhe coloca é saber qual é o próximo passo. Ficar no Flamengo? É fácil, mas nem sempre o mais fácil é o melhor e ali, depois de Taça dos Libertadores e Brasileirão, dificilmente conseguirá melhor. Mais vale, portanto, sair por cima. Voltar a Portugal? É sempre uma opção, até porque se deve admitir a possibilidade de, para estar junto da família e dos amigos, não se importar de ficar a perder a nível financeiro. Mas, convenhamos, depois destes seis meses no Brasil, seria um passo atrás - ainda por cima um passo atrás, ao contrário do que acontece com Mourinho, difícil de perceber. Talvez este seja, sim, o momento de Jesus voltar à Europa, mas para mostrar que pode, também, ter sucesso em qualquer um dos campeonatos com maior projeção mundial. Inglaterra, Espanha… Porque não? E nem precisa de ser num tubarão - mesmo admitindo que chegar a um seria, hoje, mais fácil do que no passado.