Será sempre preciso culpar alguém por uma derrota?
Na semana passada coloquei a supersticiosa hipótese de os maus ensaios (jogos de preparação) do Sporting poderem resultar numa boa estreia. Pode ser válido para a ópera, o teatro, o canto, o que for, mas neste caso não foi. A estreia sportinguista foi pior do que qualquer ensaio. O desastre foi total; pior é quase inimaginável.
Posto isto, como diz uma canção brasileira, o melhor a fazer é levantar, sacudir a poeira e dar a volta por cima. Tenho lido e visto muitos sportinguistas na ânsia de arranjar um ou vários culpados para aqueles cinco golos que encaixámos no domingo passado. É extraordinário, e já agora também muito português, que se tente exorcizar um mal a acusar, expulsar, despedir, demitir (ou, por que não, queimar numa grelha?) aqueles que se arranjam como culpados. Vamos ser práticos, já que mesmo no futebol um dos defeitos do Sporting é a falta de sentido prático.
Para isso é preciso distanciar-nos das paixões imediatas. Varandas, Keizer, os centrais, a falta de afirmação do Sporting, o facto de se ter expulso Bruno de Carvalho, já tudo foi apontado como eventual culpa. Mas o Sporting, a menos que seja de novo possuído por uma irracionalidade insustentável, vai continuar com Varandas, Keizer, os centrais (Mathieu e Coates), com um discurso educado e tranquilo, mas firme e com o ex-presidente demitido expulso. Qualquer outro caminho seria pior.
Sobretudo, nada se contribui para impedir desastres destes através do método de discutir de quem é a culpa. Pelo contrário, são debates estéreis, sem substância. Autênticas conversas de café.
Eu ofereço dois culpados indesmentíveis: o primeiro é o Benfica, que jogou melhor. Na semana passada escrevi aqui que, de um modo geral, considerava «que neste momento o Benfica está a jogar melhor do que o Sporting. Sem dúvida». Mantenho a ideia, e aqui está o primeiro culpado da nossa derrota. Tivemos duas ou três oportunidades que não aproveitámos e o Benfica, num passe rasgado de Pizzi para Rafa (e perante uma desorientação de um jogador que esteve em grande nível, Thierry Correia), marcou um golo.
O que não pode acontecer
Mesmo considerando o jogo todo, o Sporting teve mais posse de bola, mais passes, mais precisão no passe, menos faltas, mais cantos. O que lhe faltou? Também não foram remates. Pela estatística oficial teve 19 contra 15. Foi, sim, eficácia: remates à baliza. 11 para o Benfica e seis para o Sporting. Repare-se que desses 11, os encarnados converteram cinco, ao passo que o Sporting dos seis nem um. A culpa foi do guarda-redes? Claro que não! Do posicionamento tático (não treinado, dizem agora… mas foi com um posicionamento semelhante que fizemos um dos melhores, senão o melhor jogo da época passada na vitória 3-0 sobre o Braga)? Também não. O que perdeu a equipa, além da eficácia e melhor fio de jogo encarnado, foi a desorientação nascida do segundo golo, com a atrapalhação de Mathieu e Coates aos 60 minutos, a que se seguiu um livre bem marcado por Grimaldo (e sem culpas de Renan) quatro minutos depois. De um resultado que dava hipóteses, passámos para 3-0, impossíveis de recuperar. Isto é o que não pode acontecer, como foi dito também por vários responsáveis. Uma equipa profissional não pode desmoronar-se perante as contrariedades.
Bruno Fernandes pouco se viu (embora, ainda assim, talvez fosse o melhor) e nitidamente tem a cabeça ocupada com a novela da transferência. Bas Dost desapareceu e talvez as oportunidades que vêm de fora o desconcentrem… enfim, a equipa não foi equipa. Para transformar isto em culpa é necessário um grande passo. O Real Madrid perdeu 7-3 com o Atlético de Madrid e ninguém acredita que os merengues tenham passado à condição de equipa desprezível e sem ambições. O mesmo se passa com o Sporting. A equipa tem de sentir o apoio dos adeptos, alguns dos quais fariam melhor em apelar ao espírito e devoção dos profissionais do que se armarem em Sherlock Holmes em busca de culpados.
Resumindo: gostei de ver o jogo até aos 60 minutos. Perder por um ou dois não é o mesmo que perder por cinco. O mal esteve, precisamente, quando faltou a calma, a distância emocional do momento e o sentido das hierarquias, exatamente após aquele golo inacreditável que a nossa defesa ofereceu (e não se confunda falha com culpa). Temos dois jogos muito difíceis pela frente, mas fazer depender de dois jogos toda a estratégia de um clube é insano. No entanto, perder no Marítimo e não ganhar em casa ao Braga é de molde a muito contribuir para a conhecida autofagia sportinguista.
A liga dos milhões
O FC Porto foi vencer 1-0 a Krasnodar, na Rússia, na 3.ª pré-eliminatória da Liga dos Campeões. Conseguiu o golo contra a equipa com o nome da cidade no fim do jogo, através de um livre direto de Sérgio Oliveira, cerca de 10 minutos depois do seu novo guarda-redes, Marchesín, ter justificado a contratação com uma enorme defesa.
A vitória fora e sem sofrer golos abre todas as perspetivas para que, no Dragão, para a semana, os portistas sigam em frente, para o play-off onde serão esperados pelo Istambul ou Olympiakos, sendo que os gregos, que receberão os turcos para a semana, devem estar teoricamente em vantagem para passar a eliminatória. A ser assim, teremos um duelo entre dois treinadores portugueses: Sérgio Conceição e Pedro Martins, que orienta a equipa de Atenas (Pireu).
Independentemente de outros cálculos, a Portugal e ao Sporting em particular interessa que os clubes portugueses façam carreiras longas e profícuas. Aumentar a pontuação de Portugal, de modo a passar a Rússia (objetivo que conseguimos o ano passado, mas que foi insuficiente para as contas a cinco anos, como são feitas), permite-nos mais uma equipa nas competições da UEFA e sabe-se como isso é hoje importante. O Krasnodar foi, exatamente, o terceiro classificado no campeonato russo do ano passado (atrás do Zenit e do Lokomotiv) e, por esse feito, tem acesso às pré-eliminatórias da Liga dos Campeões. Como se sabe, em Portugal só duas equipas (Benfica e Porto) podem aspirar à Liga dos Milhões. Eis porque foi ainda mais importante esta vitória sobre um clube russo, conseguida na Rússia e será importante que seja repetida no Porto. Como será importante uma vitória no play-off de modo a que os dragões acompanhem o Benfica na fase de grupos. E do mesmo modo, o sucesso do Guimarães e do Braga para se juntarem ao Sporting na fase de grupos da Liga Europa contribui para este desígnio de voltarmos a ter seis equipas, tal como a França, apenas atrás dos quatro gigantes - Alemanha, Inglaterra, Espanha e Itália.