Seis oportunistas
O pomposamente designado Campeonato de Portugal, que absorveu as antigas segunda e terceira divisões nacionais, tem os dias contados e quanto a mim bem, por sempre me ter parecido que no meio daquela aglomeração de clubes se acoitam dirigentes, treinadores, observadores, agentes, enfim, investidores que correm atrás de investimentos duvidosos por terem na sua génese uma contradição indisfarçável que esta pandemia denunciou.
Nada me move contra quem queira aplicar o seu dinheiro num projeto futebolístico a este nível competitivo, de fraca projeção mediática e sem retorno no curto prazo. Pelo contrário, trata-se de uma aventura muito interessante que exige dedicação e prazer, dinheiro para as primeiras despesas, muita paciência, contenção nos gastos, respeito pelos compromissos, tesouraria controlada, estabilidade e só depois admite espreitar a possibilidade de lucro através de bons resultados que atraiam patrocinadores ou da venda de algum talento.
Desconfiei, portanto, de reações exaltadas que troaram na praça pública prenunciando desgraças e reclamando este mundo e o outro pelos prejuízos que os mais intrépidos emblemas enxergam. A tal ponto que não faltou uma proposta apressada de remodelação de todo o edifício futebolístico para minimizar o impacto provocado pelo cancelamento das provas devido à pandemia, salvaguardar os investimentos e segurar os investidores.
No fundo, todos ficariam felizes com mais um alargamento desavergonhado em grande escala, o que reflete o nível dos pensadores que congeminaram tamanha tentativa de atropelamento ao progresso e credibilidade do futebol português.
Nos últimos dois meses, o Campeonato de Portugal tem sido falado sobretudo por maus motivos, como vencimentos em atraso e jogadores a viverem com dificuldades, a quem falta comida, uma situação que muito preocupa o Sindicato e que gerou, inclusivamente, uma onda solidária dentro da própria classe no sentido de ajudar os companheiros necessitados, prova de que a realidade da competição é muito diferente da que nos pretendem vender.
Sendo um pasto imenso de sombras, como já se percebeu, por onde se move com inadmissível ligeireza gente que prefere a penumbra à transparência, em que mais de oitenta por cento dos jogadores não têm contratos profissionais, embora ninguém acredite que todos sejam verdadeiros amadores, é fértil o terreno para alastrarem falsas relações laborais e, por via desse expediente, ludibriar o Estado com fuga aos impostos.
Deve, assim, a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) dar-se ao incómodo de entrar no jogo, em nome da defesa do praticante, que é o elo mais fraco, proteger os clubes cumpridores e identificar os enganadores.
A Federação Portuguesa de Futebol (FPF) tomou a decisão de suspender a prova, quanto a mim acertadamente, e promover à Liga 2 o Vizela e o Arouca, na altura líderes de séries mais pontuados. Seguiu um critério razoável e defensável, sabendo-se que, em circunstâncias semelhantes, fosse qual e fosse a decisão nunca agradaria a todos. No entanto, os emblemas alegadamente prejudicados, no caso Praiense (1.º C), Olhanense (1.º D), Fafe (2.º A), Lusitânia de Lourosa (2.º B), Real (2.º D) e Benfica e Castelo Branco (2.º C), têm liberdade e legitimidade para exporem os seus pontos de vista e lutarem pelo que entendem justo.
Quererem reunir-se com a FPF é absolutamente normal. Exigirem a presença do presidente é excessivo, porque, no exercício das suas funções, é Fernando Gomes que decide com quem se reúne e não o contrário.
Os dirigentes contestatários virarem as costas ao diretor-técnico nacional, José Couceiro, ao diretor-geral adjunto, Luís Sobral, e ao diretor de competições, Carlos Lucas, a delegação federativa que os recebeu, é uma atitude reprovável e não recomenda quem a tomou. Revelou apenas oportunismo, nada mais.
Os seis falam na promessa de realização de um play-off que tudo leva a crer nunca foi feita, por motivos de todos conhecidos. Ou será que os seus representantes ainda não se deram conta que o país e o mundo vivem um período excecional, em que as autoridades de saúde são quem mais ordena em nome da proteção e bem estar dos cidadãos?
Praiense e Olhanense pretendem subir à Liga 2 e os restantes quatro contentam-se com uma indemnização pelos danos causados (?), segundo o presidente da SAD do Olhanense. Ontem, li também em A BOLA, que continuam unidos como nunca, «refutam de forma veemente» as declarações de José Couceiro e teimam em falar com o presidente da FPF.
Conversa para entreter e manter o tema na agenda diária. Como sugeri, se a ACT fizer o favor de viajar ao interior do Campeonato de Portugal, para facilitar na escolha, comece por estes seis, tão pujantes que eles andam.