Se eu fosse João Félix
Não sei se João Félix ficará ou não mais um ano no Benfica. Nem estou certo de que essa seja uma decisão que dependa em exclusivo dele e dos que lhe são mais próximos, ao contrário do que se diz por aí, porque há, no futebol moderno, uma vertente financeira que mexe, mais do que devia até, com interesses que vão muito para lá da simples vontade de partir ou ficar. Mas admitamos que as coisas são como Luís Filipe Vieira disse e que a bola está, mesmo, do lado de João Félix, o que só pode querer dizer que à Luz já chegou o conhecimento de que haverá clubes, de facto, dispostos a bater os 120 milhões de euros da cláusula de rescisão do jovem avançado, único argumento lógico para que o presidente, depois da intransigência que sempre manifestou sobre o assunto - a cláusula ou nada -, dar a entender que não tem, já, qualquer voto na matéria no que ao futuro imediato de João Félix diz respeito.
Assumamos, portanto, que a decisão está, de facto, apenas no lado do jogador. Comecemos por dizer, porque é justo fazê-lo, que não é uma decisão fácil. Por um lado, a possibilidade de ir, partindo já, ganhar muitos mais milhões (fala-se de valores que são o dobro do que o Benfica podia oferecer-lhe para o segurar, que não seria pouco mas seria, ainda assim, metade...) do que poderia ganhar se escolhesse ficar. Não se trata, repare-se, de uma questão de ganância. Foi, até, infeliz Luís Filipe Vieira quando disse que os jogadores «gostam muito do Benfica mas também gostam de dinheiro». Porque as coisas não são, se para elas olharmos de forma mais profunda, assim tão simples. Primeiro porque a carreira de um futebolista não é assim tão longa e é normal que tentem ganhar o máximo possível no tempo que têm disponível. Segundo porque a vida de um futebolista é - à exceção de casos verdadeiramente fenomenais, que Félix pode vir a ser mas ainda não é - feita de incógnitas que os aconselham a não perder o comboio quando ele passa, essencialmente porque não é certo que passe duas vezes. Por outras palavras, nada garante que Félix tenha, na próxima época, a visibilidade que teve nesta, correndo o risco de perder o encanto aos olhos de quem hoje com ele está maravilhado. E terceiro porque há lesões e outros detalhes da vida de qualquer desportista de alta competição que os aconselham a não deixar escapar uma oportunidade como esta. Ou seja, olhando apenas para a parte financeira, se eu fosse João Félix não pensava duas vezes: ia já.
A questão é, portanto, essencialmente desportiva. Fernando Santos disse-o nos textos que ontem publicámos e já outros o tinham dito antes: é sempre melhor para um jovem jogador ficar onde se sente confortável até estar, de facto, preparado para sair. Há, como bem lembrou o selecionador, exemplos suficientes de jovens futebolistas que saíram demasiado cedo. E, sem capacidade (essencialmente mental...) para lidar com as ilusões, e desilusões, que encontraram em clubes que olham para eles apenas como mais um, acabam com muito dinheiro na conta bancária mas profundamente infelizes. E com a autoestima profundamente afetada. Há, mais uma vez, exemplos suficientes de carreiras estagnadas, e estragadas, por decisões meramente financeiras. Não quer, atenção, isto dizer que João Félix, saindo do Benfica, será mais um desses casos. Mas que o devem fazer pensar, lá isso devem. Em suma, olhando apenas para a parte desportiva, se eu fosse João Félix não pensava duas vezes: ficava pelo menos mais um ano.
Como não sou João Félix, ficarei à espera de ver aquilo que ele vai decidir. Respeitando, e percebendo, a escolha que fizer. Mas se lhe pudesse dar um conselho, dir-lhe-ia para deixar que seja, apenas, a sua cabeça a decidir o seu futuro. Porque essa é, sempre, a melhor maneira de lidar com as consequências. Pode ser, até, a escolha errada. Mas pelo menos é a dele.