Rui Costa cedeu? E então?

OPINIÃO20.09.202106:05

Se a AG de sexta-feira servir para trazer transparência, debate, talvez até mais democracia ao Benfica, então valeu a pena

N ÃO sei se seria Rui Costa o alvo dos sócios que tanta contestação levaram à Assembleia Geral do Benfica na passada sexta-feira mas sei que, como presidente de uma Direção que, queira-se ou não, ainda é uma extensão daquilo que foi o Benfica de Luís Filipe Vieira seria mais do que previsível que, neste que foi o seu primeiro encontro com os associados na condição de presidente (por agora demissionário), fosse Rui Costa a ouvir aquilo que, provavelmente, não gostaria de ouvir. É admissível que uma franja (não consigo, nem ninguém conseguirá, contabilizar se maioritária ou minoritária) veja de facto em Rui Costa um símbolo da continuidade do Vieirismo na Luz. Essa será, já se percebeu, a maior pedra no sapato do presidente demissionário e maior candidato a futuro presidente do Benfica no caminho que percorrerá até às eleições: a ligação, que o próprio nunca negou, a Luís Filipe Vieira e a forma como permitiu que o ex-presidente fizesse aquilo que é acusado de ter feito. Essa será, decerto, uma pergunta que Francisco Benítez, o único com coragem suficiente para enfrentá-lo, não se cansará de fazer e para a qual Rui Costa terá de encontrar uma resposta convincente. Não porque disso dependa o resultado das eleições de 9 de outubro, mas porque merecem, os benfiquistas, perceber como chegou o Benfica ao que chegou. Tão simples como isso.

M AS percebeu-se que essa não era, sequer, a grande questão da AG. O problema que mais fez aquecer os ânimos na noite de sexta-feira foi outro e só chegou ao que chegou por duas razões. A primeira remonta a outubro de 2020, quando, decerto (pelo menos a avaliar pelos resultados da contagem há poucos meses divulgada...) por uma questão de teimosia, Luís Filipe Vieira não permitiu que os votos fossem confirmados nos dias imediatamente a seguir às eleições em que bateu, de forma não esmagadora mas clara, João Noronha Lopes e todos os que ousaram enfrentá-lo. Em vez de matar de imediato o assunto permitiu que as dúvidas persistissem, alimentando a força da oposição e o descontentamento de um número ainda considerável de sócios. A segunda está relacionada com a teimosia, ainda mais incompreensível tendo em conta aquilo que se passou menos de duas horas após o final da AG, em incluir na ordem de trabalhos a votação do regulamento eleitoral, em especial o tema do voto físico, aquele que, já se sabia, mais confusão iria suscitar. Evitava-se tanta discussão e evitava-se que alguns olhassem agora para o pedido, inteligentíssimo, de Rui Costa para que as eleições decorressem com recurso ao voto físico como uma cedência à vontade dos contestatários. 

T ALVEZ tenha sido uma cedência de Rui Costa. É, pelo menos, admissível pensar assim. Mas é isso, verdadeiramente, uma coisa negativa? Sinceramente, não me parece. Uma das acusações que, sem ser necessário esperar ou lançar mão ao direito de presunção de inocência, se pode fazer a Luís Filipe Vieira é de ter, em especial nos últimos anos, tratado o Benfica como se fosse seu, mandando e desmandando como se não tivesse de prestar contas a ninguém. A recusa de contar os votos das eleições de há um ano é, apenas, mais um exemplo flagrante. Por isso foi acusado, e com alguma razão, de ser uma espécie de ditador, que não admitia, sequer, ser confrontado ou questionado sobre as decisões que tomava.
O que Rui Costa fez, tenha sido cedência ou não, foi mostrar aos benfiquistas que, mesmo tendo estado muito tempo com Vieira, não tem necessariamente de ser como ele. E se a AG de sexta-feira servir para trazer transparência, debate, talvez até mais democracia ao Benfica, então todo o barulho acabou, no final das contas, por valer a pena.