Quente janeiro

OPINIÃO01.02.202022:50

Sim, eu sei, foi um janeiro frio e, até, chuvoso. Sim, eu sei, foi um janeiro em que a União Europeia perdeu um relevante membro e, assim, o Brexit se concretizou. Para alegria de muitos e tristeza de muitos(as) outros. Mas com Londres a receber, em julho próximo, as meias-finas e a final do Europeu de futebol! Sim, eu sei, foi um janeiro em que o coronavírus se propagou rapidamente e determinou uma emergência global e, logo, uma séria preocupação geral. Sim, eu sei, foi um janeiro, entre nós, com casos que fervem e com divulgações que geraram múltiplas inquietações. E múltiplas discussões e outras tantas proclamações. Mas o que sei mesmo é que foi, objetivamente, o mês de janeiro mais quente do futebol português. Quente em receitas e quente em visibilidade externa. Sim foi um janeiro que proporcionou a alguns clubes - em rigor às suas SAD’s - um verdadeiro euromilhões! Foi, assim, um quente janeiro para as tesourarias de algumas sociedades desportivas que, desta forma, ganham algum ar, pagam urgências/evidências e mostram que há talento e visão de prospeção no futebol português. No top das cinco maiores transferências deste quente janeiro estão duas que envolvem jogadores portugueses: Bruno Fernandes e Trincão. No primeiro lugar o ex-capitão do Sporting e em terceiro o jovem talento do Sporting de Braga. E logo para dois dos grandes clubes do mundo, como o MU e o Barcelona. Com Trincão a ficar, resguardado em Braga até o pós Europeu de futebol, com uma cláusula de rescisão de 500 milhões de euros! Impressionante! E sabendo nós que a de Messi é de 700 milhões e a de Griezmann é de 800! Mas sem esquecermos o jackpot que Tapsoba proporcionou ao Vitória de Guimarães! Que jackpot mas com a nota que foi o Hertha de Berlim o clube mais gastador desta janela, bem à frente no top-5 de Nápoles, Mónaco, Manchester United e Espanhol. Aqui com RDT, o ex-jogador do Benfica, a envolver metade dos cerca de quarenta milhões de euros gastos pelo outro clube de Barcelona neste mercado de janeiro. Diria, em rigor, que esta janela de oportunidades não pode esquecer que estamos em ano de Europeu e de Jogos Olímpicos e vivemos este angustiante período de vírus da China que levou muitos jogadores que atuavam na liga chinesa a regressar, num instante, à Europa e, em regra, através da figura do empréstimo. E com Benfica e Manchester United, por mero exemplo, a receberem, respetivamente, Dyego Sousa - bom reforço! - e Odion Ighalo!      

O Benfica venceu, num jogo bem sofrido, o B-SAD na passada sexta feira. A noite estava chuvosa e, daí, a Luz não ter atingido os cinquenta mil espetadores. Mas ter mais de 47 mil evidencia bem a ligação forte entre bancadas e relvado, mesmo no final da tarde de uma sexta-feira em que o sofá era bem mais sugestivo do que a cadeira do estádio! E esta vivida ligação, que nunca se questiona, sabe bem que sofreu face à equipa bem liderada por Petit. Acho que foi um jogo difícil, diria que um jogo menos conseguido. O Benfica sofreu dois golos, o que, em termos internos, só tinha ocorrido em agosto passado frente ao Porto. Foi um jogo em que Taarabt mostrou as suas imensas qualidades, Chiquinho evidenciou as suas potencialidades, Weigl justificou a sua aquisição e em que Vlachodimos confirmou que é um guarda-redes em que se confia! Mas o jogo, que de verdade foi uma outra final, foi um bom alerta para uma equipa que vai iniciar um fevereiro louco. Com múltiplas finais e, logo, com jogos que determinam ou o acesso a uma final - Taça de Portugal - ou a ultrapassagem de mais um obstáculo no sonho de chegar, de novo, a outra final, a da Liga Europa. Na verdade, são sete os jogos do Benfica neste mês que ontem arrancou. Terça próxima Famalicão na Luz e sábado Futebol Clube do Porto no Dragão. Depois segunda-mão em Famalicão e encontro na Luz face ao renovado Braga de Rúben Amorim. Depois os dois confrontos, bem complexos, com o Shakhtar de Luís Castro e, no meio, a deslocação a Barcelos para uma outra final com o Gil Vicente de Vítor Oliveira! Sete jogos e sete finais na linguagem serena e realista de Bruno Lage. Que, sublinhe-se e realce-se, somou, na passada  sexta-feira , quarenta e sete vitórias em sessenta e uma partidas na liderança técnica do Benfica! E nestas finais de fevereiro exige-se, como sempre, vontade e concentração, humildade e disponibilidade. Tendo como prioridade - sim como prioridade, digo-o! - a conquista desta nossa Liga NOS. Determinante a todos os títulos. Sem prejuízo de uma larga presença europeia ser bem importante nos tempos próximos das novas competições europeias, e, por excelência, do, ainda em discussão, seu enquadramento de acesso.

No próximo dia 5 Cristiano Ronaldo faz trinta e cinco anos. É hoje em dia o grande embaixador de Portugal. A ligação dele a Portugal é total. Global. Hoje em dia não somos nem província de Espanha nem país ignorado. Hoje em dia, como constato abundantemente em múltiplos lugares e diferentes continentes, Cristiano é motivo de identificação e de geral referenciação. Permitam-me que recorde Laszlo Boloni, e o seu Bloco de Notas, escrito pelo Luís Miguel Pereira em julho de 2002 e na sequência da conquista do campeonato pelo Sporting. Um dos jovens de que ele me falava abundantemente como um futuro e extraordinário grande talento - e numa equipa que tinha Nélson e Beto, Paulo Bento e Hugo Viana, Pedro Barbosa e João Pinto, Jardel e Quaresma! - era Cristiano  Ronaldo. Ainda lhe devo um jantar por uma aposta perdida! Mas o que sei é que nunca deixei de acompanhar, e de vibrar, com esse eterno jovem que na próxima quarta-feira chega aos trinta e cinco anos. Sei bem que não há parabéns antecipados. Mas sei que há sempre justificadas felicitações. Por uma carreira brilhante, por números impressionantes, por conquistas entusiasmantes. São quase mil jogos e setecentos e vinte golos. E na minha memória registo, como escrevi no prefácio daquele  livro, que «a razão é o farol da vida, sem a qual ela soçobra e naufraga»!

Este jornal fez setenta e cinco anos. Vida longa e, por vezes, vida dura. Vida intensa e vida sentida. Vida que percorreu tempos complexos e determinantes instantes de libertação. Mas o que vale nestes anos todos é o compromisso, na plural diferença e opinião, com as leitoras e os leitores. E de prata, de ouro e de diamante foram os momentos marcantes de uma história rica e de um arquivo impressionante. De artigos e de fotografias. De registos significantes e de instantes marcantes do desporto, por excelência português. E com primeiras páginas deliciosas. Mas o que fica é a íntima ligação com o(a) leitor(a), a liberdade conferida aos colaboradores, a resistência perante as dificuldades. As de ontem e as de hoje. E, aqui, há sinais que importava receber. Mas neste momento a indiferença de certos poderes é tão perturbante quanto angustiante. E a indiferença como nos ensina Bernard Shaw, no seu A disciplina do Diabo, «é a essência da desumanidade»! É mesmo. Qualquer que seja o ano ou o mês. Mesmo neste quente janeiro que acabou de findar!