Quem nunca?
Hater é uma palavra inglesa, que significa «aquele que odeia» ou «odiador». O termo não é recente mas está cada vez mais em voga. Nos dias que correm, marcados pelo advento da informação e pela exposição ilimitada, aqueles que têm no ódio o seu sentido de vida proliferam como incêndio em dia de vento. São uma espécie de tochas humanas, que só sobrevivem se sugarem, dos outros, a luz, a energia e a alegria que nunca tiveram, que nunca sentiram. Que jamais experimentaram. Regra geral, os haters são incomodados pelo crescimento pessoal/profissional de outras pessoas. A ideia de imaginarem a felicidade de alguém causa-lhes revolta interior. Uma sensação de desconforto que se manifesta de diferentes formas. São, digamos, uns eternos wannabees.
O seu retrato patológico está traçado, há muito, por especialistas na área da saúde mental: são criaturas infelizes que, lá está, tendem a ficar profundamente afetadas com o êxito, o mérito, a posição, a conquista ou a felicidade alheia. Às vezes, até com a sua opinião, com a sua proximidade. Com a sua mera existência. No seu lado mais íntimo, são personalidades perturbadas que necessitam avidamente de conflito. Essa postura bélica sacia, a espaços, o vazio imenso em que vivem. Regra geral, esses traços começam a vislumbrar-se logo na infância - na forma como se relacionam com familiares e vizinhos, colegas e amigos -, mas é quando crescem que deixam de aceitar as circunstâncias da vida (da sua e da dos outros), agravando os sintomas iniciais. A vida sem colisão ou atritos é algo que não concebem. Não faz sentido para eles. Retiram daí satisfação (efémera, embora não o percebam). É como se tudo o que os outros fazem ou dizem fosse uma espécie de borbulha na ponta do nariz, que sentem compulsão em espremer. Em espremer com força, com a força de todas as unhas que roem, ainda que toda a gente lhes diga que... não havia borbulha alguma. O hater não fala, briga. Não conversa, discute.
Não ouve, só aguarda, em silêncio, a sua vez de ripostar. Essa forma de estar corresponde, quase sempre, à projeção de quem é, de como se vê a si próprio. Tentar prejudicar terceiros atenua-lhe a dor, a raiva e a frustração de saber que é irrelevante. De saber que não tem expressão em nada do que diz, pensa ou faz, que ninguém sabe quem é. O hater está tão focado em destruir que raramente tem noção da imagem que transmite. Daquilo que a sua personalidade magoada evidencia aos olhos de todos os outros: pura indiferença para quem não os conhece, piedade para os poucos que o rodeiam. Com ele, não há contraditório. Isso é visto como uma afronta à sua linha de pensamento, que julga ser superior e distinta. Vê na diversidade de pensamento e na liberdade de opinião uma declaração de guerra. Uma afronta. Um ataque pessoal. O hater é, como se percebe, demasiado orgulhoso e narcisista.
Gosta demasiado de si para se permitir gostar dos outros. Se pudesse viver num mundo perfeito, escolheria um em que só existissem espelhos virados para si. Para o seu ego. Para a sua alma sofrida. Para a sua pequenez ilimitada. É importante sublinhar que esta forma de ser, de estar e viver não é voluntária. O hater não tem culpa de ser assim. Doente. E não tem culpa de ficar infeliz com a felicidade dos outros. Essa realidade - perturbada, distorcida e enciumada - é a única que conhece, a única que o move e motiva. O mundo de hoje está cheio de pessoas assim. Que só se sentem grandes quando tentam diminuir o próximo. É um problema sério que deve merecer, de todos nós, uma atitude de enorme tolerância e compreensão. De sensibilidade e humanidade. Temos que lhes dar a mão e responder, com um sorriso sincero, às suas investidas. Temos que os ajudar a não cair no precipício onde moram. É a nossa obrigação cívica. Mais do que medicação diária ou aconselhamento profissional - que pode atenuar mas jamais resolverá a dimensão do conflito interior -, pessoas assim merecem o nosso abraço apertado. Amigo. Genuíno. Viver feliz, em harmonia e em paz interior não nos dá o direito de apontar o dedo a quem sofre, a quem jamais saiu da sombra. Pelo contrário. Sejamos decentes.