Portugal fora de contexto
Quis Portugal ser mais papista do que o Papa, mais Itália do que a «squadra azzurra»
Abela Itália, a vertiginosa Inglaterra, a emotiva Dinamarca e a irreverente Espanha são as semifinalistas de um Euro-2020, digo já, em que o reativo e complexado Portugal esteve fora de contexto. Podemos discutir a justiça de um torneio feita à medida da seleção de Gareth Southgate, com apenas os quartos de final fora de Londres, e até o arranque a diesel do conjunto britânico, sem chama, mas a verdade é que, a partir do momento em que o seu maior problema, um tal de Harry Kane, se resolveu a si próprio, passou a ser o maior candidato à vitória final. E o talento nem tem sido colocado todo à solta.
Também permanecem dúvidas sobre a consistência espanhola, num conjunto cheio de juventude e sem um matador digno desse nome. Até talvez queiramos sublinhar o percurso à-Fernando Santos, com apenas um triunfo nos 90 minutos, para que nos alivie a consciência. Contudo, a verdade é que La Roja não espera pelos adversários. É um tiki-taka que absorve as transições que antes eram consideradas heresia e até, quando necessário, um jogo mais direto, mas a ideia de jogo começa e acaba na baliza contrária. E mesmo a Dinamarca, que ficou sem grande parte da sua imaginação quando Eriksen nos assustou a todos, mantém-se uma equipa de ataque posicional que gosta da velocidade e do contra-ataque, fazendo jus à ideia de seleção mais latina entre os nórdicos.
E o que dizer desta Itália? Falhou o Mundial e reconstruiu-se, colocando de lado a tradição, o líbero e o trequartista, o gioco all’italiana e o maldito catenaccio que sai de debaixo dos próprios escombros de tempos a tempos. Pressiona, gosta de ter bola, ataca e mantém a solidez cá atrás. Quis Portugal ser mais papista que o Papa, mais Itália que a própria azzurra. Que pode não ganhar, mas vai ficar mais na memória de todos do que os campeões de 2016.