Por que eu sou Maradona...

OPINIÃO30.11.202002:30

Chamava-se Diego Armando Maradona. Para mim, como para muitos outros, foi o melhor jogador de futebol da história. Claro que esta é, e será sempre, uma avaliação subjetiva, por estar dependente da idade de quem a profere. Quando falo do assunto com o meu pai, chama-me maluco e vai buscar Pelé ou Eusébio. Se disparar esta frase numa conversa com malta um bocadinho mais nova, poderão, sem grandes problemas, recorrer a Ronaldinho Gaúcho ou Ronaldo - o fenómeno - para me contrariar. E se quisesse levar a discussão para a geração das redes sociais irei, certamente, ser bombardeado com vídeos de Cristiano Ronaldo ou Messi. Trata-se, portanto, de uma afirmação discutível. Ainda assim, na semana em que Diego Armando Maradona nos deixou, insisto: para mim, partiu o melhor jogador de futebol da história.


Podia, para sustentar esta minha convicção, falar daquele lance genial contra a Inglaterra. O golo do século. Ou dos muitos outros golos e assistências (e passes extraordinários que só não foram assistências porque Maradona não conseguia passar e marcar ao mesmo tempo, embora tenha a certeza de que, a haver alguém que o conseguisse, seria ele...) que, ainda hoje, me deixam de boca aberta quando abro o YouTube e vejo (vi muitos nestes últimos dias, confesso) os vídeos que compilam os seus lances mais geniais. Mas a verdade é que não é só isso. Houve, e há, jogadores que marcaram muitos mais golos ou fizeram muitas mais assistências do que ele. Sei disso. Mas também sei que não se pode reduzir o futebol a estatística. Não o futebol por que me apaixonei. O futebol de Maradona. Esse é um erro que me recuso a cometer. Porque no momento em que nos limitarmos a analisar o futebol, e os futebolistas, a passes certos e errados, remates, golos, assistências, desarmes e quilómetros percorridos, estaremos a desistir da ideia de, um dia, poder aparecer outro jogador como Maradona. Ou talvez, pensando bem, já tenhamos desistido...


Maradona era, para mim, muito mais do que números. Maradona era talento, claro que sim, mas era também paixão, irreverência, loucura. Maradona era, no fundo, o futebolista que todos éramos quando jogávamos com os amigos: os golos eram o menos importante. Divertido era fintar e voltar atrás para fintar outra vez (lembras-te, Miguel Mendes? Era eu a ser Maradona); fazer umas cuecas (lembram-se, Hugo do Carmo, Gonçalo Guimarães, Hugo Forte, Fernando Urbano, Miguel Mendes, Nélson Feiterona, Nuno Rita, Mário Rui Ventura, José Caetano, Nuno Raposo, Rui Baioneta, e tantos, mas tantos outros? Era eu a ser Maradona); humilhar o vizinho do lado para gozar com ele enquanto nos lembrássemos daquela vez em que o fizemos cair com uma finta de corpo (lembras-te, Nélson Feiteirona? Era eu a ser Maradona). Sim, é isso. Maradona era paixão, irreverência e loucura. Coisas que não se podem colocar em folhas de Excel, como as outras que, sendo úteis, tornam o futebol numa coisa bem menos divertida.


Havia quem lhe chamasse apenas Diego. Ou quem lhe chamasse só Maradona. E continua a haver quem lhe chame Diego e Maradona, consoante esteja a falar do homem ou do jogador. Como se fossem duas pessoas diferentes. Não são. Pelo menos para mim  nunca foram. Foram sempre a mesma pessoa. Porque, ainda hoje, duvido que pudesse existir o génio de Maradona sem a loucura de Diego. Não sei que jogador teria sido Maradona se não fosse a cocaína. Sinceramente, não quero saber a resposta à pergunta que ele, tantas e tantas vezes, colocou a quem o entrevistou. Talvez tivesse sido muito melhor. Ou talvez nunca tivesse sido aquilo que foi. Como sabê-lo agora? Sei, apenas, que não o julgarei pelo que fez fora de campo. Porque só o prejudicou a ele. Prefiro guardar as boas memórias. São suficientes.