Ponto de situação

OPINIÃO24.05.202206:30

Que Rui Costa explique a sua extrema confiança e controle a narrativa, por uma vez. Eu e muitos benfiquistas gostávamos de sentir o mesmo

1. E AGORA?

CELEBREMOS. A época desportiva 2021/2022 chegou ao fim. Finalmente terminou o suplício pelo qual passámos ao longo destes muitos meses. Todos temos teorias sobre o que aconteceu: uns dirão convictamente que foi o planeamento da época desportiva, ou a falta deste. Outros farão questão de enumerar as arbitragens que prejudicaram o Benfica, justificando dessa forma o nosso terceiro lugar. Alguns dirão que faltou vontade aos jogadores. Outros dirão que faltou capacidade aos treinadores. Uns culparão os dirigentes. Outros culparão os adeptos. Uns quantos culparão os jornalistas. E haverá porventura quem não considere esta época tão desastrosa como eu, e até veja aqui o princípio de alguma coisa melhor. Sabemos ou adivinhamos as leituras de quase cada um de nós adeptos.
Só não sabemos o que pensa o presidente do Benfica acerca de tudo isto. Dele pouco ou nada ouvimos. Sabemos o que disse em Agosto do ano passado, quando a época arrancava de feição: que estava tudo devidamente planeado e que os adeptos podiam estar descansados que tinham aqui um projeto desportivo para o que desse e viesse. Aqui chegados, era importante que o presidente mostrasse igual facilidade no uso da palavra, não para dizer que está tudo planeado, mas quem sabe para olhar os benfiquistas nos olhos e dizer-lhes o que verdadeiramente pensa acerca desta última época. Onde falhámos, porquê, o que verdadeiramente podemos fazer para melhorar. Estes esclarecimentos não são uma nota de pé de página. Se a velha máxima de aprender com os erros serve para tantas situações nas nossas vidas, não deveria servir também a um clube de futebol e a quem o dirige?  
Ontem ouvi Rui Costa afirmar aos jornalistas que está “muito confiante”. Não sei se o disse porque sente realmente isso ou porque considerou que eram palavras adequadas à circunstância. Afinal um novo treinador acabou de chegar e a esperança dos benfiquistas renova-se a cada rumor de um criativo argentino a caminho do aeródromo de Tires. Mas seria importante perceber a que se devem os elevados níveis de confiança do presidente. Para isso é preciso que este se explique. Que abandone a tal figura de estilo do presidente discreto e silencioso, isto se não quiser que as pessoas tresleiam o seu silêncio como falta de confiança nas decisões tomadas, insegurança quanto ao futuro, receio da confrontação, ou, pior do que tudo isto, falta de personalidade. Rui Costa, que em campo foi dos mais visionários que eu conheci, parece não ver as oportunidades de afirmação que tem tido à frente do nariz. Tem recusado uma atrás da outra. Que explique a sua extrema confiança e controle a narrativa, por uma vez. Eu e muitos benfiquistas gostávamos de sentir o mesmo, mas talvez precisemos que nos expliquem os motivos para tal estado de alma. Nada disto é um pormenor. O Benfica precisa, como é evidente, de um presidente à Benfica.
 

«Rui Costa, que em campo foi dos mais visionários que eu conheci, parece não ver as oportunidades de afirmação que tem tido à frente do nariz»

2. A CHEGADA DE ROGER SCHMIDT

H Á uma enorme curiosidade em perceber quem será afinal Roger Schmidt, em especial depois de conhecer os cantos à casa, do Benfica e do futebol português. Por um lado, entusiasma-me a ideia de ter um treinador que aposta no objetivo essencial de chegar ao final dos jogos com mais golos marcados do que o seu adversário. Começo logo a sonhar com 34 vitórias sucessivas com resultados saídos de uma liga de hóquei em patins. É mais ou menos nessa altura que a minha memória traz de volta as últimas décadas de futebol português e me mostra um triste vislumbre do futuro: as frotas de autocarros estacionadas à frente da baliza, o antijogo levado à exaustão, a falta de ambição de muitas das equipas do nosso campeonato, e ainda a nossa arbitragem de segunda divisão.
É por tudo o que digo acima que não sei até que ponto será fácil jogar à holandesa em Portugal, mas estou muito curioso por ver o que vai acontecer: se Roger Schmidt terá condições para operar dentro da organização atual do Benfica e pensar pela própria cabeça; se será coadjuvado por pessoas a quem todos reconheçamos melhores condições para atingir o sucesso; se lhe darão orçamento para fazer escolhas ousadas; se será capaz de rapidamente preparar a equipa para os jogos na Champions; se ficará na história como o primeiro treinador que verdadeiramente colocou a formação do clube no centro da estratégia; e se as suas convicções resistirão a todas as cascas de banana que o futebol português vai colocar no seu caminho.
 

3. OS REFORÇOS E OS RUMORES

L ER as capas dos desportivos continua a ser uma das primeiras coisas que faço de manhã. Seja qual for o mês do ano ou o dia da semana, tenho sempre a expectativa de encontrar alguma coisa que me surpreenda. Não há nada que supere aqueles meses de verão em que tudo parece possível, até mesmo a vinda do Cavani. Bem, pelo menos era isso que sentia até há uns meses, altura em que o meu hábito questionável de frequentar redes sociais me levou a assistir a um novo flagelo na internet: os especialistas em transferências. A partir de agora, em vez de 3 capas de desportivos e algumas pessoas - aparentemente bem informadas - em direto na tv, temos um exército de figuras anónimas que afirmam saber exatamente quem vai assinar, por quanto tempo e em que aeroporto é esperado. Se o rumor não se verificar - o que acontece 99 em cada 100 vezes - explicarão detalhadamente o que se passou, sempre com aquela vaga certeza de quem não faz a mais pequena ideia do que está a dizer. Fazem a festa, atiram os foguetes e apanham as canas, tudo pela dose diária de dopamina que as redes sociais proporcionam. São os novos guionistas do futebol moderno - insuportáveis.