Pensar verde e branco (4)
Interrogo-me hoje, com alguma mágoa, se consigo pensar e escrever verde e branco, com alguma lucidez e serenidade. E porquê? Porque estou demasiado preocupado com o que leio, com o que ouço e com o que vejo, mas sobretudo com aquilo que não vejo - um rumo, uma ideia, um pensamento, uma filosofia por parte de quem dirige o Sporting Clube de Portugal e a sua sociedade anónima desportiva. Esta, além de anónima, parece surda e muda, autista e incompetente, incapaz de gerir os seus activos de uma forma racional e lógica!
A minha preocupação começou no dia a seguir ao último acto eleitoral, continuou com o despedimento de Peseiro e a contratação de um desconhecido para o lugar, e com a euforia desmedida provocada por vitórias em duas finais, decididas a penáltis. Enraizou-se a partir do momento em que, após uma derrota na Supertaça por 0-5, o presidente da SAD declarou não estar preocupado por, certamente, já estar a pensar na contratação, por via de empréstimo, de três jogadores sem categoria para jogar no Sporting, e em duas mudanças de treinador.
De andar preocupado passei também a andar deprimido perante a estafado discurso de que todos temos de remar para o mesmo lado, quando o timoneiro e os seus adjuntos não têm um rumo, não sabem para onde querem ir. E não satisfeitos e incapazes de põr tudo a remar para o mesmo lado, puseram uns a remar contra os outros partindo o barco mais do que o que já estava.
Falei no fosso, desportivo e financeiro, mas criticaram-me e alguns até me gozaram, numa clara demonstração de que nem sabem o que é que a palavra significa. Mas esta ignorância não me deprimiria se visse alguma coisa para diminuir esse fosso. Pelo contrário, o que vejo é o fosso alargar a cada dia que passa, perante a indiferença de quem deveria pugnar pelo seu encurtamento, o que me assusta, porque tal distância se pode tornar irreversível. O adiamento do congresso é a prova da inconsciência que grassa!...
Em consequência de todo este panorama, há quem esteja revoltado e indignado, há quem esteja descrente e há ainda quem esteja já indiferente perante este clima.
«Descrença dos adeptos é o pior que pode existir», disse-o anteontem Sérgio Abrantes Mendes numa curta declaração a este jornal. É um ex-Presidente da Mesa da Assembleia Geral do Sporting Clube de Portugal e colunista deste jornal, que normalmente assume posições ponderadas e institucionais. Acrescentou à descrença «o afastamento da massa associativa». Tem toda a razão e é contra essa descrença e afastamento que temos de lutar, mas de forma organizada, sensata e galvanizante.
A seu lado foi publicada uma declaração de António Rebelo, ex-dirigente do clube que alerta para «um défice de competência que é fatal para o clube». E, antes dele, Helder Amaral declara: «O Sporting vive o pior momento desde que há memória. Tem um problema institucional, desportivo e financeiro. O clube perdeu a identidade, graças a uma Direcção cujo lema era unir o Sporting e que tem gerido o clube com base na vingança e no ódio. É preciso uma espécie de governo de salvação nacional.»
Na opinião do leão à solta - o jornalista Henrique Monteiro - «o Sporting já esteve pior, mas nunca pensou vê-lo assim»! Não sei se já esteve pior ou não, mas sei que o momento é grave, pois temo que para uma nova vida do futebol, isto é, para uma mudança de modelo, não haja tempo e condições. Seria necessário que o presidente percebesse a educada e cirúrgica observação do Henrique Monteiro: «O senhor está num plano inclinado e não vai a subir.» Curta e demolidora!...
Demolidor é também Rui Calafate, na sua habitual coluna de sexta-feira no Record: «Já não dá mais.» E permito-me citar, com a devida vénia, o resumo do explanado nesse artigo: «Varandas é a face visível da desunião que semeia o vírus da descrença e indiferença. Num clube amansado que perde paixão, o presidente tornou-se um problema e não uma solução.»
E no meio de sinais de ruptura aventados pela comunicação social, também Sérgio Abrantes Mendes, ontem, na sua habitual coluna refere com precisão que «chegamos, assim, a um momento, em que aos legítimos detentores do poder se exige acção e esclarecimento». E manifesta-se «preocupado, muito preocupado»!...
Todos estes comentários nada têm a ver com oposição, mas sim com a preocupação que está a alastrar a todos os quadrantes do clube, e será, provavelmente, o único factor de união para além da esperança que é verde. A preocupação pode e deve ser um caminho para o diálogo e a união, A preocupação não é o futuro de Varandas, mas o futuro do Sporting. Este exige serenidade e bom senso, porque não chega esforço, dedicação e devoção, sendo necessária também a inteligência e sentido prático perante a realidade.
Olhar azul e encarnado
São as cores do jogo a que vou assistir em directo, e ao vivo, em Braga, com a mágoa de não ser o meu clube que defronta o de azul. Serve de bálsamo a esta mágoa o facto de estar presente na final a convite de Pedro Proença e na qualidade de Presidente do Special Olympics de Portugal.
Na sequencia de um protocolo celebrado entre o Special Olympics de Portugal e Fundação do Futebol da Liga Portugal, aquela instituição participou nesta semana da Final Four da Allianz Cup e será hoje homenageada, no intervalo do jogo, com a entrega da placa de mérito da Fundação do Futebol.
Estou desde já grato a Pedro Proença pela iniciativa, numa demonstração de que os problemas do futebol profissional são muitos, mas existe um tempo para trabalho de solidariedade social.