Otimistas, para variar

OPINIÃO04.03.202114:39

Apesar de tudo, o início de 2021 está a trazer-nos alguns sinais positivos que nos fazem acreditar em melhores dias

MUITOS dos defeitos do nosso futebol têm origem na nossa cultura como povo mas as sociedades evoluem e também um desporto desta magnitude terá, mais cedo ou mais tarde, de abrir as portas da modernidade. E 2021 está a trazer-nos sinais positivos. Destaco dois: a aprovação da centralização dos direitos televisivos e a mais que provável redução do número de equipas na Liga.
O primeiro será mesmo uma revolução e, numa perspetiva otimista, aquilo que poderá fazer regressar ao campeonato o equilíbrio de forças pré-acordão Bosman. Quem se lembra dos plantéis das equipas não grandes antes da segunda metade da década de 90 do século passado recordar-se-á, certamente, do quão fortes eram. Com facilidade encontrávamos muitos internacionais num Belenenses, V. Setúbal, Boavista, V. Guimarães, Chaves e por aí fora. Porque havia menos transferências (e por conseguinte um núcleo duro permanecia dois/três anos num clube), os adeptos tinham tempo para ganhar empatia com os seus jogadores favoritos. Não havia a oferta que há hoje, os horários dos jogos eram desenhados consoante a vida dos adeptos de bancada e não a dos operadores televisivos e por isso era relativamente normal vermos gente aos magotes num Bonfim, São Luís, Restelo, Bessa, Coimbra e por aí fora (para não falar dos eternos adeptos de Guimarães, um caso à parte). São tempos irrepetíveis, é certo. Porque também há coisas boas. Com os instrumentos certos e um contexto desportivo adequado, um clube de média dimensão em Portugal consegue ganhar escala internacional em 2021 em poucos meses, coisa que levaria anos a conseguir em 1991.
Mas não há dúvidas: o fosso de que os grandes clubes nacionais se queixam relativamente às maiores potências europeias é o mesmo que foi cavado em Portugal nos últimos 25 anos entre Benfica, FC Porto, Sporting e todos os os outros. A diferença entre o FC Porto e a Juventus em 1995 não é a mesma que existe em 2021 (e daí o elogio pela vitória dos dragões na primeira mão dos oitavos da Champions), tal como não era entre um Benfica e um Farense.
À medida que o futebol se foi industrializando as desigualdades foram crescendo, variando apenas a escala. Com vistas curtas e  largo poder, os dirigentes dos grandes nunca perceberam (e mesmo agora ainda parecem não estar muito convencidos) que seriam mais pujantes com concorrência mais forte. Talvez se entenda a maior relutância do FC Porto porque foi o único que conseguiu disfarçar a falta de um campeonato muito competitivo com grandes desempenhos europeus (o único clube português com dimensão internacional no século XXI), ainda assim já é tempo de todos embarcarem no comboio da modernidade. Basta recordarmos que andamos há anos a discutir a questão do tempo útil de jogo, tal como estamos neste momento a fazer, e nada mudou. Tenho para mim que além das arbitragens defensivas, da manha dos jogadores, da culpa dos treinadores e da pressão de um público que gosta mais dos seus clubes do que de futebol, a questão também passa pela qualidade dos intérpretes. E a qualidade custa dinheiro. E se houver mais dinheiro para todos...

Opresidente do Comité Olímpico Internacional deu ontem o mote e acredito que será o início de uma questão que vai  marcar o desporto mundial: a obrigação de os atletas olímpicos serem vacinados contra a doença do novo coronavírus. A ideia já começou  a ser discutida em Itália; em Israel (país que está mais avançado na administração das vacinas) é provável que brevemente o passaporte verde ganhe corpo de lei também no futebol e à medida que o processo de vacinação for crescendo na Europa a pergunta será feita: pode um jogador profissional ser proibido de jogar se se recusar a tomar a vacina?
 

P.S.  Nunca é demais valorizar o trabalho de Carlos Carvalhal no SC Braga. Tem tudo o que o jogo pede: bom futebol e, é bom realçá-lo, um discurso positivo. Ganhou mundo em Inglaterra e veio diferente. Para melhor. Ele e Rúben Amorim são a prova de que há mais vias para ter sucesso.