Os contornos da teia

OPINIÃO18.09.201801:41

Em maio de 2017, os supostos chefes  dos departamentos de comunicação de FC Porto e Sporting, em reunião que se julgava secreta, realizada em Lisboa, por acaso no mesmo hotel que regularmente acolhe a comitiva do futebol profissional do dragão nas visitas à capital, cozinharam um comunicado com  vários pontos de concordância entre os dois clubes e que mais tarde viria a ser ratificado por ambos os presidentes, embora com a reserva que as circunstâncias aconselhavam.


Esta história foi mal contada desde o primeiro capítulo, dado fazer pouco sentido que dois grandes clubes, interessados em ultrapassarem questões mal resolvidas entre eles e voltarem a andar de mãos dadas,  entregassem a responsabilidade diplomática  pelo processo de reconciliação a pessoal do meio da escala hierárquica: um (Marques), que se pensava ocupar o lugar de topo, pelo protagonismo que lhe foi atribuído, obedecia, pelo menos, a um superior direto, e outro (Saraiva) desapareceu  em combate por extinção de lugar,  prova de que Frederico Varandas  suplanta em inteligência o antecessor destituído.


 Manifestei a minha surpresa pela cimeira de comunicadores, supostamente feita às escondidas quando o normal seria que fosse realizada às claras, dado tratar-se de um encontro entre colegas de profissão e que, tanto quanto julgo saber, até trabalharam  para o mesmo patrão.  A não ser, e isso eu não escrevi, por não me ter ocorrido que por detrás de aparente iniciativa desajeitada se escondesse intenção bem mais ardilosa. Pensando melhor, se o FC Porto quisesse ficar de fora da fotografia com certeza que teria sugerido outro local,  discreto e menos frequentado por espiões em diversas áreas.


Ao ver Manuel Tavares nessa espécie de tratado de paz, identificado na interessante  reportagem da revista Sábado como diretor do FC Porto Media, fiquei com a pulga atrás da orelha e dessa desconfiança dei conta em  várias intervenções, sem retorno, confesso. Ou seja,  sem que alguém acompanhasse a minha linha de raciocínio e sem que o departamento de comunicação institucional do Benfica alguma vez tivesse dispensado ao assunto um segundo do seu precioso tempo.


Ano e meio passou e, em resultado de acontecimentos e revelações recentes,  as minhas  dúvidas  veem reforçada a pertinência. Creio que essa reunião em maio de 2107, mais do que desajeitado acordo de franca convivência - como se fosse possível Pinto da Costa esquecer as deselegâncias que o presidente leonino destituído lhe dirigiu -, serviu para congeminar cobiçoso esquema de comunicação, como o tempo demonstrou, em que, em traços gerais, o Sporting acatou a submissão ao FC Porto numa estratégia concertada para incomodar o  Benfica, acreditando que essa reverência  alguma riqueza lhe traria. Enganou-se, porém.  O Benfica foi campeão em 2017, o FC Porto foi campeão este ano, o Sporting foi duas vezes terceiro, Bruno de Carvalho saiu de cena e Saraiva viu o posto de trabalho extinto.

No dia seguinte à publicação da reportagem da revista Sábado noticiou o CM que Rui Pinto, o pirata informático procurado pela PJ, por suspeita de intromissão ilegal no correio eletrónico do emblema da águia, é um autodidata na matéria, adepto do FC Porto e «morador na zona onde Fernando Madureira [líder da claque Super Dragões] vive há mais de uma década». Há cada coincidência!...


Ontem, acerca do mesmo tema,  informou A BOLA na última página que um comentador do Porto Canal e coautor do livro O Polvo Encarnado, com Francisco J. Marques, foi colega de curso de Rui Pinto, o alegado pirata.


Entraram os dois para o curso de História da Faculdade de Letras da Universidade do Porto em 2008. Diogo Faria, o comentador em causa, confirma, mas adianta que não se considera amigo dele e não o contacta  «há mais de cinco anos».  Outra coincidência, ou tão-somente mais uma contribuição para completar este puzzle  de intrigas e tramoias que ainda terá muitas surpresas por revelar.

Os investigadores devem  ter já uma noção precisa dos contornos da teia e, numa altura em que mensageiros da verdade se agitam à medida que mais luz se faz sobre os processos  dos mails e das toupeiras, convém que o Benfica não se desvie do essencial: se no Apito Dourado ouvimos o que ouvimos e nada aconteceu, nos mails lemos, e os conteúdos de alguns deles, valendo ou não como  prova jurídica,  merecem ser decifrados na defesa do bom nome da instituição Benfica, sem receio de apontar o dedo a culpados, se os houver.


Entretanto, Luís Filipe Vieira falou aos jornalistas. Uma conversa de rua, apesar de avisada e breve, é sempre um conversa de rua, difícil de controlar. E Vieira até abordou  aspetos interessantes. Sem rede, só ele, diante dos jornalistas,  testemunho de que não está em conflito com a sua consciência, Vieira prometeu falar em breve, porque o tema é «muito profundo» e apelou à  Justiça.  «Tem de funcionar e há de funcionar», sublinhou.