O palhaço rico!
É por demais sabido que o dinheiro não dá educação, nem dá instrução só por si, como também sabemos que apenas ler e escrever não significa que não se seja analfabeto.
Salazar era professor na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra mas pensava mal da democracia, como alguns que apenas têm a quarta classe! Odiava-a e achava as eleições uma palhaçada, como acharia palhaço alguém que emitisse uma opinião contrária à sua. Tinha, no entanto, e ao contrário de outros, o decoro de não usar a propósito tais expressões. Criou mesmo uma polícia política e a censura para melhor controlar as opiniões divergentes, nem que para isso fosse necessário dar um safanão, de vez em quando! Salazar, numa entrevista que deu, entre outras, a António Ferro e para o Diário de Notícias, quando questionado sobre os métodos de tortura da polícia política, disse tratarem-se de «meia dúzia de safanões a tempo nessas criaturas sinistras». Não sei porquê mas lembrei-me daquela palhaçada de um pequeno apertão no pescoço de um associado durante uma Assembleia Geral que manifestava uma opinião contrária ao presidente de uma conhecida instituição nacional.
Palhaçada eram realmente as eleições na outra senhora e não as que se realizam num regime democrático, em que se podem debater livremente as ideias entre aqueles que as têm. Compreendo que quem não tem ideias para debater, considere um debate uma palhaçada! Não é fácil o debate, quando não impossível, para quem está habituado a ler o que os outros escrevem ou a fazer eco das apalhaçadas cartilhas!
Aliás, há mesmo especialistas em palhaçadas! Quem não se lembra de um circo que era para ser montado no Estoril, mas foi transferido para o Algarve para poder ser maior a palhaçada! E quem não gosta das palhaçadas dos vouchers, dos emails, das toupeiras e sobretudo dos palhaços que, em sentido figurado, enchem os bolsos a uns tantos palhaços, no verdadeiro sentido?
E o que se dirá de quem consente, com o seu silêncio ruidoso, palhaçadas que consistem em imitar os sons de very-lights que causaram a morte a adeptos de futebol? E como se qualifica uma conversa gravada entre Caturno e Zé Gago, em que este disse que Vieira lhe prometera que na época seguinte não haveria polícia na zona da claque, que autorizaria o uso de tochas, que iria devolver a sede à claque, com obras custeadas pelo clube, e que iria «tratar da polícia em três tempos» e «correr com Paulo Dias» - chefe de segurança que auxiliou a PSP a identificar vários dos 31 alegados criminosos detidos pela Divisão de Investigação Criminal da PSP de Lisboa!
E pergunto agora o que se dirá de uma jura que Jesus não voltaria ao Benfica, de uma acção que foi proposta contra este de 12 milhões de euros e o seu regresso triunfal! Há sempre os que gostam e os que não gostam de palhaçadas, porque os palhaços não são todos iguais e não são sempre os mesmos, como há maus e há bons. Há quem goste e houve quem não tenha gostado daquela palhaçada a propósito de uma Comissão de Honra de alguém que foi sócio durante muitos anos de clubes rivais, o que, de resto, só por si, pode ser considerado uma palhaçada!
Há em todos estes factos uma figura que emerge pelo seu papel destacado. Alguém que não se deve olhar ao espelho, que não respeita a democracia na sua própria casa e que trata as regras desta com um analfabetismo primário. É alguém que repete ter a consciência tranquila e chora nos momentos mais convenientes. É alguém que nos diverte, que diz e faz disparates ou coisas engraçadas, que muda constantemente de opinião e que por isso não merece consideração nem é levada a sério por outras. É este alguém que sente autoridade moral para qualificar as últimas eleições do Sporting Clube de Portugal como uma palhaçada.
Quando ouvi aquela grosseira afirmação, lembrei-me das manifestações dos lesados à porta do BES e comentei para comigo: neste circo que, por vezes, é Portugal, há sempre um palhaço rico para troçar dos pobres!
ASSEMBLEIA GERAL - DELIBERAÇÕES
Há mais de dois anos os sócios do Sporting Clube de Portugal, em Assembleia Geral, e ao abrigo da competência que lhe é conferida pela alínea b) do nº 1 do artigo 43º dos Estatutos - eleger e destituir os membros dos órgãos sociais - elegeram estes, por maioria relativa, isto é, tomaram essa deliberação de acordo com o número 1 do artigo 49º, disposição ilegal por contrariar a norma imperativa do artigo 175º do Código Civil.
Curiosamente, o Sport Lisboa em Benfica também vai a eleições em breve, isto é, a sua Assembleia Geral vai reunir para eleger os órgãos sociais, ao abrigo da competência que lhe é dada pela alínea b) do nº1 do artigo 50º dos seus Estatutos. Nos termos do nº 2 do artigo 58º dos Estatutos do SLB será eleita a lista que obtiver maior número de votos que qualquer uma das outras, o que viola a mesma norma imperativa do Código Civil.
Será que na Segunda Circular se não respeita o Código Civil, caindo-se ou podendo cair-se no ridículo de ter presidentes que não foram eleitos pela maioria absoluta dos sócios que se deslocam ao local de votação - a Assembleia Geral!
É para o lado que eu durmo melhor o que se vai passar com os quatro ou cinco candidatos que vão a votos, porque não me cumpre a mim velar pelo cumprimento dos Estatutos, mas sim à Assembleia Geral do SLB, de que não faço parte pela razão simples de não ser associado daquele clube.
No que respeita ao meu clube, para além de ter o dever de cumprir as disposições dos Estatutos e dos regulamentos, sinto-me no direito e obrigação de opinar sobre a legalidade daquela disposição estatutária, e não desistirei enquanto não for convencido do contrário.
Com efeito, no artigo 175º, 2 do Código Civil, estabelece-se o princípio básico de que as deliberações são tomadas por maioria absoluta de votos dos associados presentes. A imperatividade desta disposição, bem como as dos números 3, sobre a maioria qualificada para alteração dos estatutos e 4, sobre a dissolução ou prorrogação da pessoa colectiva, resulta clara e expressamente do plasmado no nº 5, do mesmo artigo 175º: «Os Estatutos podem exigir um número de votos superior ao fixado nas regras anteriores.» Se a lei permite um número de votos superior, obviamente que não admite um número de votos inferior à maioria absoluta.
Não sou apenas eu que interpreto assim, mas também os ilustres professores, já falecidos, Pires de Lima e Antunes Varela, que referem em anotação àquele artigo: «Do disposto no nº 5 conclui-se, por argumento a contrário, que os estatutos não podem, sob pena de anulabilidade das deliberações, prescrever a suficiência de maiorias menos qualificadas do que as exigidas na lei sobre as matérias nela previstas.» Também o Prof. Menezes Cordeiro dá sustento à minha tese ao dizer que os estatutos podem fixar exigências maiores.
Também me sinto confortado por dois acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa, respectivamente, de 13/02/2007 e 15/01/2015:
«O Código Civil consagra normas de interesse e ordem pública, cuja violação implica nulidade. Qualquer cláusula que derrogue ou condicione preceitos do Código Civil, ainda que materializada em Estatutos, é nula»;
«Os Estatutos não podem, sob pena de anulabilidade das suas deliberações prescrever a suficiência de maiorias menos qualificadas do que as exigidas na lei para a deliberação sobre as matérias nela previstas.»
Não largarei esta questão enquanto não me demonstrarem o contrário. Se não me quiserem responder, irei recorrer à Procuradoria-Geral da República. Não pode continuar a haver presidentes minoritários!