O novo calendário
OS dados mais recentes sobre um possível regresso à normalidade não são animadores. Não se pode analisar o problema de um ponto de vista nacional porque de nada serve a um país como Portugal pensar voltar à atividade económica pré-coronavírus se no mesmo continente e espaço político comum (União Europeia) outros países estiverem em situação dramática como aquelas que se vivem em Itália e Espanha - e o que pode ainda vir a acontecer em Inglaterra (que ainda pertence à UE, até dezembro), pois segundo vários especialistas o pior está para vir na «ilha», como lhe chamava Churchill. Diria mais: temo que só quando os três grandes blocos (China/Japão, Europa e América) baixarem drasticamente o nível de infetados poderemos voltar à atividade sem medo de olhar para o lado. E quando ouço um louco como o atual presidente da república do Brasil a pedir o fim do isolamento social e apoucar a pandemia (já agora, é curioso observar como Jair Bolsonaro, Donald Trump e Boris Johnson agiram de modo semelhante), sinto que não só está em pôr em perigo a saúde dos brasileiros mas também a estabilidade económica dos seus principais parceiros, incluindo Portugal, e a prolongar o retorno civilizacional e social de um mundo global.
Porque o mal de uns é o mal de todos, nunca na Europa poderemos sonhar em ver a luz quando noutras latitudes ainda perdurarem as trevas. Se nos EUA e o Brasil ainda se assiste à fase de negação, acredito, pois, nas perspetivas de vários analistas que apontam julho ou agosto como o período mais seguro para o regresso à dita normalidade - partindo do pressuposto otimista de que conseguirão mitigar o problema em quatro/cinco meses tendo como comparativo o modelo chinês, país onde é mais fácil moldar comportamentos coletivos...
É com base nisto que não acredito no regresso dos campeonatos europeus antes do verão. Essa é, também, a sensação que fico ao ler as opiniões de dirigentes de vários clubes, federações e ligas europeias. Penso mesmo que a grande dúvida do momento já não é a questão do quando, mas como ficarão os campeonatos. Em Itália, país que precisa de se estabilizar emocionalmente, ninguém chega a acordo: há quem queira ir até ao fim, quem pense no regresso aos jogos à porta fechada quando for possível e quem considere que se deve esperar o tempo necessário para definir o título em campo, seja em formato corrido ou play-off; em Espanha, pela voz do presidente da federação, ouvimos ontem que La Liga deveria ser resolvida no campo, passe o tempo que passar; em Portugal, ouvimos Pedro Proença vincar a necessidade de termos um campeão no relvado, mostrando ser contra títulos de secretaria ou homologações forçadas. Esta será a opinião unânime de quem preza o desportivismo: qualquer competição tem de ir até ao fim. Talvez no final de abril haverá maiores certezas quanto ao calendário, o qual será desenhado em consonância com a UEFA, que dá adiou as datas provisórias da última semana de junho para as finais da Liga dos Campeões e Liga Europa.
O maior desafio para o futebol europeu é mesmo este: reagendar tudo. Admitir que o verão será a altura das grandes decisões nos respetivos países (e quem se recorda do Mundial-1994 nos EUA nunca poderá invocar o calor excessivo como desculpa); vermos uma final da Champions em agosto ou setembro; os contratos dos jogadores poderão conhecer adendas, especialmente para aqueles que terminam os respetivos vínculos no final de junho; mudar o mercado de transferências do verão para os meses de outubro, novembro e dezembro; admitir, por isso, haver apenas uma janela de mercado única mas maior, posto que não faria sentido abri-la novamente em janeiro.
E quanto ao campeonato da época seguinte? Das duas, uma: ou se faz segundo o ano civil tendo o Euro-2021 pelo meio (ou deslocar o Europeu para o final de 2021, tal como acontecerá no Mundial-2022, no Catar, entre novembro e dezembro) ou se criam provas nacionais e europeias de 5/6 meses em 2021, eliminando as taças nacionais.