O Mundial europeu
1 - Saberemos nas noites de terça e quarta-feiras próximas os finalistas deste Mundial da Rússia. O que sabemos é que nas meias-finais apenas encontramos seleções europeias. É um verdadeiro Mundial europeu. Disputado num País que é europeu e asiático. Num País em que o símbolo é uma águia bicéfala. Tanto olha para Ocidente como para Oriente. O que suscita e é a origem da sua inquietude existencial. Da inquietude que atinge um império imenso. Que se quer uno no seu dualismo e na sua ambivalência. O que é indiscutível é que este Mundial sob o ponto de vista organizativo merece uma nota altamente positiva. Bem me dizia o meu bom Amigo, o Embaixador Igor, que este Mundial iria surpreender e mostrar a capacidade e a mobilização russas. Antecipou mesmo a descoberta por parte de milhões de russos - e russas - do futebol. Da magia deste jogo. Da sua força de agregação. A França e a Inglaterra já sabem o que é erguer o troféu. No Mundial de 1966 a Inglaterra comemorou, em casa, a vitória. Como bem me recordo já que foi o primeiro Mundial que acompanhei pela televisão. Que era única, um só canal, e a preto e branco. No Mundial de 1998 a França ergueu, em Paris, o troféu. Mas a França também foi vice campeã em 2006, ficou em terceiro lugar duas vezes (1958 e 1986) e alcançou o quarto lugar no Mundial de Espanha de 1982. O mesmo quarto lugar que a Inglaterra conseguiu em 1990 no Mundial de Itália. A Bélgica, que fez cair o Brasil, também já conquistou um quarto lugar no Mundial de 1986, o Mundial do México. E também a Croácia, com Modric em evidência, e no drama das grandes penalidades, fez, recordo, um terceiro lugar no Mundial de França. Em que muitos dos seus atuais jogadores vibraram, como crianças, com esse marco histórico, poucos anos após a sua independência. É o futebol a marcar os novos Estados, os novos hinos, as agregações que nunca se perdem. Já que as memórias e as tradições não se perdem. Nunca se perdem. Nunca mesmo!
2 - Agora que o Mundial se restringe a um mini Europeu e que as grandes figuras já regressaram a casa, o futebol doméstico já domina as nossas atenções. Como se viu ontem na extraordinária afluência do oportuno treino aberto do Benfica há muita fome de bola. Muita mesmo! Há o nervoso miudinho da nova época, dos novos e sonantes nomes dos plantéis, da renovada crença de uma época feita de conquistas ou, no caso do Benfica, de uma necessária reconquista. Já sabemos, se bem que apenas à segunda tentativa, o calendário dos jogos, as datas dos seis clássicos, os fins de semana das diferentes dezassete jornadas da Liga portuguesa. Sabemos que é bem possível que em tempo de luta pelo acesso à milionária participação na Liga dos Campeões, o Benfica receberá na Luz o Sporting, nesse momento em plena e, decerto, acesa, campanha eleitoral. E sabemos que bem perto da data simbólica da proclamação da República o Futebol Clube do Porto se deslocará a Lisboa para defrontar o Benfica. Que, assim, recebe os seus diretos rivais na primeira volta no Estádio da Luz. Os dados estão lançados. Os sonhos renovados. As novas camisolas já disponíveis. Os lugares de época bem à venda. Querendo cada um de nós que em cada arranque de época a nossa equipa mostre elementos de ballet e de xadrez. Ou seja nota artística e sagacidade tática! Mas também sabendo todos que no futebol a cabeça é o terceiro pé!
3 - Este Mundial da Rússia é, também, acredito, o Mundial dos guarda-redes. Recordo sempre uma frase de Warney Cresswell: «Os guarda-redes bons nunca fazem grandes defesas.» Não concordo com ela mas sinto que muitos dos amantes do futebol a sentem como sua! Sei que os bons guarda-redes também fazem grandes defesas. Como fizeram Manuel Bento ou Vítor Damas. Talvez influenciado pela presença permanente nos cartazes da prova da majestosa imagem de Lev Yashin, este Mundial da Rússia mostrou-nos defesas do outro mundo e frangos inesperados. Ele, Yashin, que foi o melhor jogador europeu em 1963, que conquistou uma medalha de ouro em futebol nos Jogos Olímpicos (1956), ele que recebeu a Ordem de Lenine em 1968, ele que foi figura emblemática do futebol soviético e do Dínamo de Moscovo. Ele que, vestido de negro, nasce em 1929 e morre em 1990, e que também foi guarda-redes de hóquei no gelo. Mas este Mundial mostra-nos que os guarda-redes também ganham e perdem Mundiais. Ou até finais da Liga dos Campeões como aconteceu - com ou sem comoção cerebral - com o guarda-redes do Liverpool, Loris Karius! Neste europeu Mundial da Rússia, De Gea face a Portugal ou Muslera frente a França não se vão esquecer dos seus falhanços. Mais ou menos determinantes face ao resultado final das respetivas seleções. Como o belga Courtois não se vai esquecer da sua extraordinária exibição frente ao Brasil e, em especial, aquela defesa nos derradeiros momentos do jogo ao remate de Neymar. Ou da descoberta global das imensas capacidades de Jordan Pickford, o novo herói das balizas inglesas. Ele que ajudou, e muito, esta operária equipa inglesa a regressar, após duros anos de ausência, às meias-finais de um Mundial de futebol. Sem nos esquecermos das exibições ao longo deste Mundial do francês Lloris, do dinamarquês Kasper Schmeichel, do alemão Neuer, do colombiano Ospina, do russo Akinfeev, do veterano egípcio El Hadary (45 anos!) e do português Rui Patrício. Todos eles são extraordinários guarda-redes. Que ajudaram as respetivas seleções a conquistarem títulos ou a legitimamente sonharem com dignas conquistas. As mesmas que levam, decerto, Buffon a deixar a Juventus e a assinar, com toda a pompa, um contrato com o PSG. Aos quarenta anos Buffon, depois de dezassete anos na Juventus, aceitou um novo desafio. E os desafios de vida merecem um especial reconhecimento. Já que como nos legou Shakespeare no seu Júlio César, em «certos momentos os homens são donos dos seus próprios destinos»! Donos mesmo!
4 - As quatro substituições chegaram com este Mundial e mostram que são uma necessidade. Em todas as competições. E antecipam que devem ser possíveis nos noventa minutos a um curto/médio prazo!