O jogo a 1,99
Com o início da NBA, está para avançar a aplaudida venda de visualização em ecrã do último quarto dos jogos a 1,99 dólares. Comercialmente, as vantagens parecem claras: é um montante dispensável e permite chegar a quem não tem dinheiro para os pacotes de época ou equipa. Além do mais, está subjacente a ideia de que as populações têm, hoje, menos paciência e tempo para um jogo mau ou, pelo menos, para a parte inicial e desinteressante.
Dá-me que pensar. O desporto, na sua prática ou observação, como o aceso à cultura, é parcela de um direito social ao lazer. Está consagrado em constituições. Achar grandiosa a ideia de negociar um pedaço por pouco dinheiro é também aceitar que estamos a perder não apenas capacidade financeira, mas, talvez pior, a perder tempo para as coisas das quais gostamos. Note-se que não é o dinheiro e o tempo que se poupam por ver apenas o melhor bocadinho do jogo a 1,99; é antes o dinheiro e o tempo que, de repente, parece que ninguém tem ao ponto de poder ver o jogo todo de uma equipa de que gosta. É que, sinceramente, na perspetiva de um adepto que segue um qualquer emblema, não consigo imaginar o que pode ele preferir além de ver um jogo todo. Que virá depois do lazer? Que será mais importante? Que direitos deveremos reservar para nós depois do já garantido direito ao lazer?
Aqui perto de A BOLA, no Bairro Alto, há um café onde gosto de ir. A bebida é péssima, contudo o espaço agrada-me, pelo que até já me ocorreu pagar o café e sugerir ao dono que nem mo tire, porque só quero sentar-me ali uns minutos. Nunca o fiz. Pago sempre a bica (e bebo-a). É o contraste entre a parte boa e a parte má, ou entre a espera e a gratificação, que me situa. Ver um mau jogo, inteirinho, de uma equipa de se que gosta é tão bom que não creio que tenha preço. Se eu não beber, um dia, aquele café mau, julgo que nem o sítio será tão bom.