O futuro do jornalismo desportivo
A convite do diário espanhol Marca, A BOLA participou num cimeira mundial de diretores dos principais jornais desportivos. O atual momento de ausência global da atividade desportiva, por causa da pandemia que se espalhou por todos os continentes, gerou também uma crise generalizada. A partir desse tema, que a todos mobiliza, discutiu-se o futuro do jornalismo desportivo.
Na mesa que me calhou estava Walter Santos, diretor do diário brasileiro Lance; Miguel Arizpe, diretor de Cancha (México); Sid Lowe, correspondente, em Espanha do The Guardian; Gianni Valenti, subdiretor da Gazzeta dello Sport (Itália) e ainda Hugo Chávez Gonzalez, diretor do periódico Líder, da Venezuela.
Como coordenador da discussão do grupo, Emilio Contreras, subdiretor da Marca.
Interessantes e importantes trocas de experiências, naturalmente diversas, sobre a forma como cada publicação tem reagido a este período tão traumático da vida da imprensa desportiva no mundo, mas o que mais importa é falar-vos das diferentes visões de futuro para a imprensa desportiva.
Podemos, de uma forma objetiva, assinalar três ideias-força, que diferenciam projetos para o futuro. O primeiro, afirma-se pela ideia de que há muito começou a grande revolução da imprensa, com uma angustiada passagem do papel para o digital, e que a pandemia do coronavírus apenas veio acelerar algo que será inevitável. É uma posição muito marcada pela cultura do jornalismo sul-americano e que, nos casos do Lance (Brasil) e Cancha (México) já levou, neste período de crise, à suspensão das publicações em papel, e a uma concentração de meios no digital, sendo certo que ambos admitem voltar a publicar os seus jornais em papel, logo que se assista a uma normalização da competição desportiva.
O segundo projeto, sobretudo defendido pela Gazzetta dello Sport, mantém o jornal em papel como essencial no curto e no médio prazo, até porque continua a ser, aliás, tal como em Portugal, o pilar essencial na sustentabilidade da imprensa desportiva. Gianni Valenti considera, no entanto, que a crise provocada pela pandemia e que, de uma forma trágica, atingiu a Itália, obriga a um jornalismo de resistência para ultrapassar esta fase dolorosa e propõe, logo que regressem as competições, um jornalismo mais colorido, capaz de interessar mais o público, a par de um jornalismo de eventos, que se submeterá mais a uma lógica comercial, com conteúdos editoriais feitos por jornalistas, mas com apoio expresso de entidades e de marcas, como forma de ir ao encontro de novas tendências da publicidade na imprensa. Gianni não considera, sequer, a hipótese de se poder prever o fim dos jornais em papel, sobretudo em países como a Itália, onde a média de idade da população continua a ser muito alta e, por isso, mantém milhões de leitores com o hábito de comprar jornais.
A terceira via, aquela que eu defendo, se não a curto, a médio prazo, é a da diversidade, dependente da cultura e da realidade física de cada país, o que, no caso de Portugal, poderá passar por uma complementaridade equilibrada entre o papel e o digital, com tendência a fazer do papel uma informação gourmet, mais cuidada, mais exigente, por isso, mais cara, até por obrigar à existência de jornalistas de elite, mais preparados e de alta qualidade e ter, no digital, uma informação mais imediata, mais flexível, diversa e popular, mas não menos criativa, até porque envolverá produção de imagens dos acontecimentos em direto, o que poderá permitir um avanço significativo em relação à tradicional informação televisiva.