O Direito, a verdade e a mentira!...

OPINIÃO08.06.201904:00

Muito se tem falado caso dos emails, dos processos com eles relacionados, o que é que eles significam, etc. Têm sido horas e horas de discussões em programas televisivos, com paineleiros e sem paineleiros, com juristas e sem juristas, com os que sabem ler e com os que são para analfabetos, com cartilheiros e com aqueles que têm opinião própria e são capazes de ter juízos independentes. Enfim, e com os devidos pedidos de desculpa, uma fauna variada.


De um lado releva-se a divulgação de mails cujo conteúdo é verdadeiro e de alegado interesse público e do outro releva-se o ilícito da obtenção dos mails e a sua divulgação. É evidente que tenho a minha opinião sobre a questão, mas entendo não o dever fazer já, enquanto não houver decisões transitadas em julgado, sejam de natureza criminal ou cível.


Acontece que anteontem foi proferida a sentença, em primeira instância - Tribunal Judicial da Comarca do Porto - no caso que opõe o Sport Lisboa e Benfica e a Sport Lisboa e Benfica - Futebol, SAD e o Futebol Clube do Porto, Futebol Clube do Porto SAD, FCP Media S.A, Francisco J. Marques e ainda Pinto da Costa, Adelino Caldeira e Fernando Gomes. Estes três últimos foram absolvidos do pedido.
Os outros réus, Porto clube e Porto SAD, bem como Francisco J. Marques foram condenados a pagar ao Benfica clube e ao Benfica SAD a quantia de quinhentos e vinte e três mil euros, a título de danos emergentes e um milhão e quatrocentos e trinta mil euros a título de danos não patrimoniais pela divulgação da sua correspondência, sendo que a este título os autores reclamavam a quantia de dezassete milhões de euros.
Li a sentença, como não podia deixar de ser, em diagonal e com um objetivo muito concreto de me aperceber de uma questão objectiva: a veracidade ou falsidade dos mails. Muito se falou sobre isso, como acima referi, mas ainda não havia sido proferida, até agora, nenhuma decisão judicial sobre o assunto. É verdade que esta ainda não transitou em julgado, mas tanto quanto me apercebi a sua veracidade não está posta em causa pelas partes, excepto em duas ou três situações de truncagem.


Não quero comentar a sentença, para já, mas sim ser objetivo no tratamento da questão da veracidade dos mails, e por isso, me vou limitar a transcrever o que nela está escrito:  


«Usando as presunções supra referidas o tribunal não pode considerar que o teor dos emails objecto deste litígio são apenas ‘alegadamente’ correspondentes à realidade, nem por outro lado que eles dizem o que as RR quer que eles digam. Para o tribunal o teor literal desses documentos corresponde ao teor literal das comunicações que constam do documento n.º 10 e 10-A (emails divulgados). Isto porque, a tese das AA não faria sentido, porque se assim fosse então também teria de considerar que os segredos de negócio apropriados pelas RR também seria apenas ‘alegadamente pertença das AA’. Ou seja, se ninguém alegou sequer que o conteúdo destes emails é falso (excepto nas situações infra de deturpação), então o tribunal terá de considerar para efeitos desta acção e em termos de máximas da experiência que estamos perante realidades verdadeiras. Mas por outro, lado como veremos, as RR fazem construções, extrapolações e nalguns casos truncagens que transcendem o teor literal desses elementos».


Mais adiante, referindo-se ao dano provocado pela divulgação, pode ler-se:


«Em segundo lugar nesta sede pediam as AA a atribuição da quantia de 17 milhões de euros a título de dano na sua marca.
Teremos de ter em conta que, por um lado o dano de lesão da marca não ficou demonstrado (pelo menos na dimensão requerida pelas AA.), pelo que irá apenas e só indemnizar a divulgação da correspondência, através da equidade como dano não patrimonial.
A equidade constituiu uma cláusula geral, aberta e indeterminada, que pressupõe uma liberdade concretizadora e interpretativa do aplicador da lei, mas que exige limites operativos concretos, mediante os quais exista uma adequação dos interesses individuais, mas também um respeito dos interesses gerais garantindo a aplicação uniforme do direito».


E termino com uma afirmação que julgo relevante e justifica o título desta parte da minha crónica de hoje:


«O dano é, em concreto, atenuado pela veracidade das afirmações e pela sua natureza. Não podemos esquecer que, o facto de as afirmações contidas na correspondência serem verdadeiras implicaria sempre uma redução da indemnização como característica relevante do caso concreto, porque o ‘Direito não pode encarar com os mesmos olhos a verdade e a mentira’».
Capitães do ... baril!...

Como capitães de Abril, embora nem todos tivessem essa patente, assim ficaram conhecidos os homens que realizaram o 25 de Abril que nos restituiu a liberdade. Há pouco mais de um mês lembrámos esse dia histórico de 1974. A história de Portugal os registará para sempre, nomeadamente, para os que não viveram esse dia, como ficarão na memória dos que nasceram antes da revolução e tiveram o privilégio, como eu tive, de assistir em directo e ao vivo esse inicio de transformação da sociedade portuguesa! Os capitães de Abril vieram-me ao pensamento quando, anteontem, assistia na tribuna do Estádio do Jamor, à cerimónia de apresentação do programa comemorativo dos 75 anos da inauguração dessa obra emblemática do Estado Novo, ao ver uma fotografia da final da Taça de Portugal disputada entre o Benfica e a Académica, a 22 de Junho de 1969, em plena crise académica, nascida no dia 17 de Abril de 1969 - fiz nesse dia 22 anos - quando Alberto Martins interpelou Américo Tomás. Assisti a esse jogo, menos como adepto que já era, mas sobretudo porque era então o Presidente da Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa. Grande jornada da luta estudantil.


Mas deixando o passado da luta estudantil e os capitães de Abril, lembrei-me de dois capitães do presente: Ronaldo, o capitão da seleção que, na véspera, assumiu em pleno a sua liderança incontestada e incontestável, com mais três golos. Mostrou ao mundo que ele é realmente o melhor do mundo e joga em qualquer lado. Ao pé dele, Messi, que só joga e tem títulos no Barcelona, não passa de aspirante a oficial. O outro é Bruno Fernandes, capitão do Sporting, como há muito não se via, mas que vejo, com muita tristeza a caminho do estrangeiro. Apesar da questão financeira, ele poderia, e a meu ver deveria,  ser a bandeira de uma ambição. Mas não é...


Cristiano Ronaldo e Bruno Fernandes, dois capitães do ... baril. Por isso também me lembrei dos capitães de Abril: foi só trocar a ordem do a e do b!...