O destino
A diferença entre Benfica e Bayern na noite de quarta-feira, na Luz, pode muito bem ficar exemplificada também na diferença entre as exibições do jovem Gedson Fernandes, do lado dos portugueses, e do jovem Renato Sanches, do lado dos alemães. Infelizmente para o Benfica, o jovem Gedson afundou-se no jogo, felizmente para o Bayern o jovem Renato superou com distinção o maior teste emocional que até hoje teve de enfrentar.
Enorme o desafio lançado a Renato pelo treinador Niko Kovac, o treinador que apesar de croata nasceu na Alemanha há quase 47 anos, no então lado ocidental de Berlim, e que esta época sucedeu nos bávaros a essa grande figura germânica que é, sem qualquer dúvida, Jupp Heynckes. O novo treinador do Bayern já tinha prometido, assim que chegou a Munique, um olhar muito atento a Renato Sanches, que muitos (eu incluído) pareceram traçar como destino provável nunca mais regressar ao colosso alemão.
Niko Kovac prometeu, aliás, ver mesmo com muita atenção na pré-época o que considerou ser um jogador com muito de especial e raro, foram palavras de Kovac, entre os jogadores da Bundesliga. Logo na apresentação como novo treinador da equipa, no começou de julho, Kovac foi claro ao afirmar querer contar com Renato, pondo completamente de lado a possibilidade de o clube voltar a emprestá-lo. Kovac teve convicção no que disse e acaba de mostrar porquê.
Renato não encheu apenas a Luz na quarta-feira, encheu também o coração de todos os que são fãs e esperam vê-lo triunfar e voltar a ter na Seleção Nacional a influência que teve no caminho do título europeu de Portugal, há dois anos, em França. Uma coisa é certa: o jovem Renato precisa, como todos, de se sentir confiante; e precisa, mais do que qualquer outro, de estar poderoso fisicamente. Ficou claro.
E ficou ainda mais claro que Renato precisar de acreditar nele próprio, precisa de ser determinado, precisa de não desviar o foco do que é a exigência do futebol profissional, precisa de trabalhar muito, e precisa, sobretudo, de ter vontade de ser realmente bom. Se conseguir tudo isso, vai seguramente ser bom. Tem tudo para ser bom. Só precisa de arrumar tudo no lugar certo.
O que Niko Kovac fez, em Lisboa, foi dar ao mesmo tempo a Renato Sanches uma tremenda injeção de confiança e um teste emocional absolutamente desafiante. O que Renato fez foi agradecer a confiança e mostrar que parece ter reencontrado de novo o caminho. Depois de se ver o que ele fez na casa que o viu crescer, sob a pressão de mais de 60 mil adeptos e com o rigor, concentração, intensidade e serenidade com que jogou, só poderá o futebol lamentar se Renato Sanches não souber aproveitar as qualidades que a natureza lhe deu.
No jogo da Luz, infelizmente para o Benfica, em sentido contrário esteve o jovem Gedson, igualmente uma das maiores esperanças do futebol português atual, que acabou por se afundar no meio daquela superioridade e organização alemãs. Sim, a diferença entre as exibições de Gedson e de Renato refletem, de algum modo, a diferença do futebol das duas equipas, ainda por cima acentuado, na minha opinião, pelas ineficazes decisões do treinador do Benfica na hora de mexer no onze, deixando (e desprotegendo) o jovem Gedson em campo quando parecia francamente mais aconselhável deixar Pizzi, o único maestro possível e apenas com a desvantagem da ligeireza física, e, por que não, até o próprio Salvio - retirado também à hora de jogo - quando ele era, à primeira e à segunda vista, o único jogador do Benfica em campo de verdadeira classe mundial, a perder, na verdade, no combate com o austríaco Alaba, seu adversário direto, mas sempre potencialmente mais capaz do que qualquer outro de conseguir aquele lace de desequilíbrio, decisivo em qualquer jogo, e ainda num jogo destes e frente a um adversário desta dimensão.
Assim não viu Rui Vitória, assim não conseguiu o Benfica repetir a graça do empate de há duas épocas (2-2) frente ao mesmo Bayern, na noite em que um miúdo chamado Renato Sanches também brilhou, mas a defender então o lado português da barricada. Parece o destino.
Ainda antes de ir ao Schalke-FC Porto, algumas referências mais ao que se passou quarta-feira na Luz: Odysseas Vlachodimos com a melhor exibição entre os jogadores do Benfica; o arrepiante (palavra bem escolhida na capa de A BOLA de ontem) aplauso que todo o estádio tributou ao menino Renato, o muito infeliz gesto de James Rodríguez a entrar em confronto com a plateia, que é tudo o que não se espera de um jogador de categoria, e a elegância com que o treinador do Bayern quis saber junto de Rui Vitória o que significava a atitude de James, pedindo, de algum modo, desculpas ao Benfica.
JÁ na terça-feira, o que vi do outro confronto luso-germânico foi um jogo demasiado pobre para uma Liga dos Campeões e, com toda a franqueza, até parece impossível como o FC Porto não foi capaz de o ganhar. Salvou-se, apesar de tudo, o mal menor do empate, mas salvou-se sobretudo o regresso a estes palcos dessa espécie de imperador portista que é Danilo. Um jogador que também faz a diferença!
Em Alvalade, ontem à noite, três particulares vencedores num jogo difícil que o Sporting ganhou bem: José Peseiro (como decidiu), Montero (pela classe) e Raphinha (o melhor em campo) - é craque!
PS: O que se esperaria de Paulo Gonçalves após a demissão confirmada na última segunda-feira pelo Benfica? Que literalmente se afastasse da vida do clube. Pois na noite do Bayern lá esteve Paulo Gonçalves no camarote presidencial da Luz. Parece tudo menos bem.