O chefe dos árbitros foi à PJ fazer o quê?
José Fontelas Gomes, presidente do Conselho de Arbitragem da FPF, pediu para ser recebido pela Polícia Judiciária, ao que julgo saber por ter ficado incomodado por um empresário divulgar nas redes sociais, sem autorização, a nomeação do árbitro João Capela para o jogo FC Porto-Marítimo.
Como a arbitragem não consegue levar uma vida normal, preferindo movimentar-se por entre as teias do oculto, nunca se sabe em concreto, ao que vai, o que pretende e por que assim procede. Sinceramente, em relação a este caso, e se nada mais houver que possa, eventualmente, prejudicar o normal funcionamento do Conselho ou a sua necessária isenção, não vejo que situação ponderosa terá levado o presidente dos árbitros a queixar-se ou lamentar-se na PJ, a quem, por certo, não faltará trabalho.
Não vejo, nem tenho de ver, é verdade, mas recordo que também no final do Moreirense-FC Porto, Pinto da Costa e o seu diretor do futebol, Luís Gonçalves, tiveram a gentileza de ir à cabina do árbitro para o cumprimentar e não me constou que alguma ligação tivesse sido feita entre essa visita e a nomeação de Jorge Sousa para o clássico com o Benfica, no Dragão, dali a três jornadas. Não me constou a mim, nem a Fontelas Gomes, certamente. Foi uma coincidência. Que haveria de ser mais?...
Não é pessoa com quem me relacione, mas tenho a melhor das impressões de Fontelas Gomes e acredito no esforço que está a fazer no sentido de credibilizar uma arbitragem que pouco tem contribuído para isso. Pelo contrário, ao longo dos tempos, os seus representantes aprenderam a movimentar-se com indisfarçável à vontade em espaços recatados da restauração, para encontros e conversas no mínimo geradores de desconfianças.
A arbitragem, ao optar por uma vida à parte, jamais teve um relacionamento fácil com a transparência. Escrevi há duas semanas, sente que detém o poder de influenciar resultados e classificações que lhe é dado pelo erro, um poder que está entranhado como todos bem sabem, embora assobiem para o lado.
Acredito que Fontelas Gomes esteja determinado em remar contra a maré da hipocrisia, mas duvido do sucesso da empreitada no curto prazo. A questão é cultural, criou raízes, e os que chegam, provavelmente animados de nobres intenções e que representam a esperança maior numa verdadeira mudança, sentir-se-ão controlados e desmotivados pelos longos tentáculos de gerações que beberam dos mesmos ensinamentos e que continuam a alimentar uma cadeia de influências desde antigos árbitros, analistas, comentadores, especialistas, e por aí adiante…
Impõe-se fazer uma longa travessia no deserto de maneira a fechar este ciclo e começar outro em que árbitros novos, despoluídos, firmes, competentes e fartos de jogar às escondidas, reclamem o seu lugar à mesa entre a família do futebol e imponham o respeito que lhes é devido.
O segredo decretado sobre as nomeações dos árbitros foi mais uma medida abstrusa, daquelas que em nada contribuem para a pacificação do setor, porque o problema não reside na quebra de sigilo no circuito de comunicação das nomeações, mas sim nos critérios que conduzem a essas mesmas nomeações.
Na posição de Fontelas Gomes, mais sensato do que saber quem foi o informador que furou o esquema teria sido avaliar, para memória futura, o desempenho do árbitro Capela no referido jogo. Pelo menos, foi louvado por provar à saciedade a relevância do VAR, pois, sem ele, a trapalhada teria sido muita, mas com ele, e cito a apreciação de Duarte Gomes, foi excelente o trabalho da «equipa de arbitragem» em «noite pouco feliz de João Capela».
Capela é árbitro FIFA por que merece? Quem foram os mestres que viram nele virtudes para tal distinção? Os mesmos que promoveram Tiago Martins e Fábio Veríssimo a internacionais sem carreira?
Haja calma. Tal como acontece aos clubes, a arbitragem vive uma crise de qualidade, que há de resolver-se. Acredito eu. Acreditamos todos. Talvez não seja preciso chamar a polícia. O que é preciso é que as equipas de arbitragem, com VAR incluído, estejam de olhos abertos nas oitos jornadas que faltam disputar na Liga.
Benfica e FC Porto lado a lado, com o título na linha de meta, e, em baixo, sete equipas separadas por três pontos a lutarem pela manutenção. Depois da paragem devido aos compromissos da Seleção, a partir de agora vai ser sempre a abrir no Campeonato. De preferência com arbitragens serenas, escalando-se os mais aptos para os jogos que dificuldades mais complexas suscitarem: aqueles em que Capela e quejandos não devem participar, em nome da saúde desportiva da competição.