O caos e os esqueletos
FREDERICO VARANDAS foi eleito presidente do Sporting há apenas um ano. Encontrou o clube numa das suas mais profundas crises e nem sequer é necessário relembrar as razões. Desportiva e financeiramente, o caos. Há apenas 365 dias o principal objetivo não era viver. Era sobreviver. Crise parecida só talvez a do Benfica após a turbulenta e caótica passagem de Vale e Azevedo pelo Benfica, entre 1997 e 2000. E quantas provas ganhou o futebol encarnado em 2000? Zero. E em 2001? Zero. E em 2002? Zero. E em 2003? Zero. E em 2004? Uma Taça de Portugal. O Benfica venceu, no primeiro ano e meio de mandato de Luís Filipe Vieira, uma Taça de Portugal. Vieira cometeu erros entre 2001 (quando entrou para homem-forte do futebol) e 2004 (quando ganhou o primeiro troféu)? Muitos. Contratou, por exemplo, Pesaresi, Bossio, Éder Bonfim ou Thornton. E disse coisas que não devia ter dito, como chamar equipa-maravilha ao plantel que entregou a Toni no início de 2001/2002. Mais tarde, embora já campeão nacional em 2004/2005, continuou a cometer erros. O mais grave dos quais terá sido despedir Fernando Santos após dois jogos da época 2007/2008. A grave crise em que o Benfica caiu em 2000 começou a ser ultrapassada com a subida de Rui Costa para diretor desportivo e, mais tarde, com a promoção a administrador da SAD. O clube melhoraria ainda mais com as entradas de Domingos Soares de Oliveira (finanças) e de Miguel Bento (marketing). O Benfica de 2009, por exemplo, nada tinha a ver com o Benfica de 2000. Estava muitíssimo melhor. Mas nestes nove anos ganhou um campeonato, uma Taça de Portugal, uma Taça da Liga e uma Supertaça. Estava a reerguer-se financeiramente mas não estava reerguido futebolisticamente falando.
APROVEITÁMOS o exemplo do Benfica entre 2000 e 2009 para o comparar com o Sporting de 2018. Os benfiquistas tiveram (alguma) paciência. Estiveram dois anos sem participar nas competições europeias e tiveram (alguma) paciência. Ganharam um campeonato em 15 anos e tiveram (alguma) paciência. Os sportinguistas, ao invés, não têm (nenhuma) paciência. Tiveram oito presidentes nos últimos 20 anos (José Roquette, Dias da Cunha, Soares Franco, José Bettencourt, Godinho Lopes, Bruno de Carvalho, de algum modo Torres Pereira e Frederico Varandas), nada menos de 23 (!) treinadores (Giuseppe Materazzi, Augusto Inácio, Fernando Mendes, Manuel Fernandes, Laszlo Boloni, Fernando Santos, duas vezes José Peseiro, Paulo Bento, duas vezes Leonel Pontes, Carlos Carvalhal, Paulo Sérgio, Alberto Cabral, José Couceiro, Domingos Paciência, Sá Pinto, Oceano Cruz, Franky Vercauteren, Jesualdo Ferreira, Leonardo Jardim, Marco Silva, Jorge Jesus, Tiago Fernandes e Marcel Keizer) e ainda nove (!) diretores de comunicação (Carlos Severino, Nuno Dias, Irene Palma, Pedro Sousa, Mário Carneiro, Luís Bernardo, Nuno Saraiva, Rui Miguel Mendonça e Cláudia Lopes). Para além, claro, de dezenas de jogadores de qualidade (muito) duvidosa. O Sporting venceu, nos últimos 12 meses, uma Taça da Liga e uma Taça de Portugal. Dois verdadeiros milagres. Frederico Varandas cometeu erros? Sim. Despedir José Peseiro e contratar Marcel Keizer, por exemplo. Mas está apenas há um ano na presidência. Os sportinguistas têm de ter paciência. Quanto mais não seja porque Varandas foi eleito democraticamente. O caos não se ultrapassa com um pestanejar de olhos. Demora tempo. E é preciso paciência para lidar com o caos. Talvez o próprio Frederico Varandas tenha sido impaciente com aqueles a quem chamou de esqueletos ressuscitados. Os esqueletos têm direito a falar. São esqueletos impacientes? Sim. Mas é assim a democracia. Varandas tem de ter paciência para lidar com o caos e os esqueletos. Vieira, no fundo, também teve de lidar com o caos e os esqueletos. E agora ganha.