No Dragão, o jogo do título
O Sporting sabe que, se não perder hoje, quase garante o título, mas Rúben Amorim tem de evitar o desconfinamento da responsabilidade
SEMPRE que há um grande jogo em perspetiva, sobe, no país, a nostalgia do estádio vazio. É o caso do jogo de hoje, no Dragão. Um clássico que regressa em todo o seu esplendor de interesse e dúvida e ao qual, sem ponta de exagero, se poderá chamar o jogo do título.
Maior pressão no FC Porto que, se ganhar, abrirá um pouco a janela de esperança de ainda vir a discutir um campeonato, por tudo, invulgar. Mas não menor expectativa no Sporting porque, se não perder, conseguirá assegurar a quase certeza de um título que lhe foge há 19 anos.
FC Porto e Sporting serão, atualmente, as melhores equipas do futebol português. Curiosamente, por razões distintas. Mais impulsiva, mais emotiva, mais dinâmica, mais explosiva, tal como o seu treinador, a equipa portista; mais racional, mais consistente, mais estratégica, mais equilibrada, à imagem de Rúben Amorim, a equipa do Sporting.
Interessante que ambas as equipas tão fielmente representem as características de personalidade dos seus líderes e não menos interessante observar como resultará o confronto entre estilos diversos e estados de alma tão diferentes.
Terá, o Sporting, a imensa vantagem de saber que uma eventual vitória, até mesmo um empate, praticamente resolve, a seu favor, a corrida do título e de saber, também, que uma indesejável derrota não lhe retira o estatuto de principal candidato. Algo que Rúben Amorim pode e deve gerir com pinças, porque não pode deixar que os seus jogadores entendam a real vantagem das circunstâncias em que jogará este clássico como um momento de desconfinamento da responsabilidade.
Enfim com uma semana inteira sem calendário competitivo, o FC Porto terá preparado este jogo com a mais completa noção de que ele é absolutamente decisivo. Espera-se, por isso, um FC Porto regressado à sua inteira condição de equipa forte, pujante, conquistadora de corpo e alma. Uma equipa que irá procurar dominar o jogo e o adversário desde o primeiro minuto, que vai pretender não deixar o futebol pensado e organizado do Sporting respirar.
Terá, o Sporting, a vantagem de saber o que o espera e de poder desenhar uma estratégia que o proteja e que lhe proporcione o valor sempre impactante da surpresa. E, depois de tudo pensado e devidamente ponderado, poderá o jogo pender segundo as suas próprias circunstâncias, os seus momentos de imprevisibilidade.
F INALMENTE Jorge Jesus fica com tempo para treinar durante a semana. Eis algo que os treinadores portugueses sempre anseiam, mesmo que isso signifique o afastamento, cada vez mais vincado, dos níveis competitivos das equipas europeias de alto nível. Tolhidos por uma visão regionalista e estreita dos principais objetivos, que se concentram, todos, no território nacional, as equipas portuguesas vão-se afastando, levadas pela corrente da mais conservadora opinião nacional.
Há, apesar de tudo, é justo dizê-lo, uma exceção a esta regra em que todos saem das provas europeias satisfeitos e de cabeça erguida pelas meritórias derrotas em que salvam as suas más consciências. Essa exceção chama-se FC Porto, a única equipa portuguesa que tem, atualmente, dimensão europeia. Se não tanto na qualidade global dos seus jogadores, pelo menos no respeito por uma atitude competitiva que não atraiçoa a sua História.
Para a maioria, incluindo o Benfica, a ainda discutida qualificação para a Champions é, muito mais do que uma questão de prestígio e de estatuto internacional, uma questão de dinheiro, o que revela uma mentalidade pequena e com pouca margem de evolução.
A morte de um atleta vibrante
Morre jovem o que os Deuses amam, escreveu Fernando Pessoa a propósito da morte prematura do seu amigo Mário de Sá Carneiro. O mesmo se poderia dizer sobre a morte de Alfredo Quintana, jovem de apenas 32 anos de idade, figura maior do desporto nacional e, em especial, do FC Porto. Não o conhecíamos pessoalmente, mas admirávamos a sua magnífica plasticidade de guarda redes de andebol. Um atleta vibrante, alegre, mobilizador de jovens para o prazer da prática do desporto. Tremendo golpe numa promessa de vida.
Confinar ou desconfinar
Desconfinar é a palavra maldita. Quem quer desconfinar é um perigoso traidor e quem quer continuar a confinar é um honrado patriota. O país a preto e branco é isto. Desconfinar é o verbo da ação que deveria suceder a planear, organizar, calendarizar, programar, que, em Portugal, são, apenas, verbos de inação. O que se espera do desconfinamento, venha quando vier, é que não seja apresentado como um prémio de bom comportamento ou como uma surpresa social misturada com o coelhinho e com as amêndoas da Páscoa.