Não pôr violinistas a tocar bombos
O que se pretendia mudar com a mudança de selecionador não eram os jogadores, mas sim o triste jogo que esses jogadores jogavam
TERÁ causado alguma frustração, entre os portugueses, a primeira convocatória do novo selecionador nacional, Roberto Martínez. Muitos terão ficado dececionados com a ausência de renovação e terão chegado, mesmo, a perguntar se era para continuar tudo na mesma, para quê, então, mudar de selecionador. Penso, porém, que se tratam de reações injustificadas, sem base de argumentação e sem critério. O que se pretenderia mudar, com a saída de Fernando Santos, não era tanto os jogadores, porque noventa por cento, em qualquer convocatória, são indiscutíveis, mas os processos de jogo, a opção por um futebol menos encolhido e prisioneiro de uma visão demasiado clássica de um futebol que tem por objetivo único ganhar, mesmo que fosse preciso hipotecar o melhor aproveitamento da qualidade técnica e das características dos jogadores, trocando, na expressão de Sérgio Conceição, os violinos pelos bombos, mesmo que se trate de uma orquestra de violinistas... a tocar bombos.
É aí, num novo conceito de jogo e de modernização do futebol da Seleção, que deve estar o essencial de uma expectativa legítima. Tanto mais que os principais clubes portugueses têm sabido evoluir nesse conceito de jogo e têm optado - e bem - por um futebol que pode escolher sistemas diferentes, mas tem princípios iguais no que respeita a jogar em todo o campo, atacar com e sem bola, manter uma alta intensidade competitiva, jogar em função da equipa e da sua personalidade e não, apenas, em função do adversário.
Claro que podemos todos discutir se o Florentino deveria ter sido convocado no lugar do Danilo, mas a verdade é que as escolhas do novo selecionador deixaram em aberto - logo se verá mais tarde a razão da dúvida - a mudança de sistema. Será que Roberto Martínez irá preferir jogar com três centrais? E se não é essa a intenção, para que lhe serve convocar tantos jogadores com essas características?
Roberto Martínez, selecionador nacional
Evidentemente que também se nota outro tipo de inquietação sobre ausência de renovação da equipa nacional, depois de se ver confirmada a escolha de Cristiano Ronaldo. Sinceramente, não estaria à espera de outra coisa. Na primeira convocatória seria, no mínimo, deselegante não convocar Cristiano. Outra coisa, bem diferente, será, em nome do que o futebol português lhe deve, ir tentando pagar a dívida oferecendo-lhe um género de passe verde para uma titularidade eterna.
A verdade é que houve quem depositasse demasiadas expectativas na primeira seleção de Roberto Martínez. No entanto, basta fazer um simples exercício de juntar meia dúzia de adeptos do futebol português e perguntar qual seria a sua escolha. E lá cairíamos, nós, no consenso em redor de uma esmagadora maioria. Quem diz meia dúzia, poderá dizer meia centena, meio milhar ou meio milhão. Temos excelentes jogadores de futebol, mas também não são assim tantos. O que nós verdadeiramente desejamos é que esses jogadores, de cuja geração nos orgulhamos, possam traduzir em qualidade de jogo, em espetáculo, em atitude e em resultados aquilo que nós pensamos que eles, coletivamente, podem valer. E, para isso, é verdade que havia também consenso de que era preciso mudar. Não de jogadores, mas do jogo jogado por esses mesmos jogadores. É isso que se pretende que o novo selecionador consiga fazer, sendo por isso aceitável e avisado que não tenha começado por decisões drásticas e fraturantes. Em breve, chegarão os jogos que nos permitirão tirar mais e melhores conclusões. Serão, esses jogos, a única base sólida em que podemos começar a construir uma opinião séria sobre Roberto Martínez.
DENTRO DA ÁREA – QUERER GANHAR... PARA GANHAR
Os sportinguistas dirão: «Se o Sporting jogasse sempre como jogou com o Arsenal, estaria ainda a lutar pelo título.» Mas a pergunta que, logo a seguir, deverão fazer, apesar de simples, é que se pode tornar essencial: «Porquê?» A resposta não é fácil, porque tem muito a ver com a atitude mental. «É preciso criarmos uma cultura de vitória», disse, não há muito tempo, Rúben Amorim. E essa cultura é o que leva uma equipa a querer ganhar sempre e a acreditar que ganha, se quiser. Sem interlúdios. Sem manifestações de estados de alma.
FORA DA ÁREA – A GENIAL POLÍTICA DA SOLUÇÃO ÓBVIA
Christine Lagarde saiu sorridente pela porta de trás da sua limusine e falou à Europa para puxar as orelhas aos governos que por aí andam a tentar ajudar os seus cidadãos para que possam, ao menos, ter dinheiro para comprar comida para os filhos. Que não devem fazer isso, porque aumenta a inflação. Nem uma palavra sobre outra qualquer opção que não passe pelo óbvio: se o povo não tiver dinheiro para comer e para se vestir a inflação baixa e não será preciso aumentar as taxas de juro. Para isto, é preciso ser-se uma genial política?