Mourinho e outros especiais

OPINIÃO31.12.201903:00

Leonardo Jardim voltou a ser despedido e à segunda deve ser de vez, por  não lhe sobrar paciência para aturar russos especializados em fertilizantes, diamantes e outras áreas de nenhuma ligação ao futebol, mas que viram nele apetecível  área de promoção pessoal, diversificação de amizades, reforço de influências e  espaço de oportunidades de mais e melhores negócios.


O diretor geral do Mónaco, Oleg Petrov,  contratado em  fevereiro deste ano, um mês depois de Jardim ter sido recuperado pelo presidente, também ele russo, com pedido de desculpas pela precipitação que conduziu ao seu primeiro despedimento, em outubro de 2018, por um período de três meses, nem sequer foi suficientemente astuto na rasteira que quis pregar ao  treinador português. Espalhou o rumor, como é habitual, e agiu imediatamente a seguir ao Mónaco ter goleado o Lille, 4º classificado no campeonato francês, por 5-1. Tinha de ser assim, provavelmente  por  já estar aberta a porta de entrada ao sucessor, esse vulto Robert Moreno, selecionador de Espanha na ausência forçada de Luís Enrique e por este acusado de falta de lealdade.
No final da época transacta, depois de assegurada a manutenção na Ligue 1,  o senhor   Petrov anunciou que tinha ideias para o futuro próximo do clube sem a colaboração de Jardim, por acaso o treinador que em  2017 deu ao Mónaco o título de campeão francês, o único neste século, e o colocou nas meias finais da Liga dos Campeões.


Foi Jardim quem envergonhou o imbatível PSG  ao opor-se-lhe com um grupo de jovens maravilhosos que encantou os mais exigentes palcos europeus e abarrotou os cofres  do emblema monegasco de milhões  e milhões de euros, ou os bolsos do seu presidente, entretanto detido para dar alguns esclarecimentos à justiça. Mbappé, Bernardo Silva, Mendy, Fabinho, Sidibé, Babayoko, Lemar  e outros formaram equipa de sonho que Leonardo Jardim trabalhou e preparou em duas épocas para explodir na terceira e espantar o mundo do futebol com tanto virtuosismo reunido numa única equipa.  

Aseparação foi boa para jardim. Livrou-se de russos manhosos, garantidamente soube proteger os seus direitos e fica com tempo  para planear a vida e   liberdade total para ouvir e escolher, sendo certo que as valiosas credenciais que tem para mostrar indiciam espera curta e oferta generosa por  ser, em minha opinião, o primeiro na linha de sucessão da dinastia Mourinho.


Jardim continua a exibir apreciável cotação nos mercados internacionais, assim como Nuno Espírito Santo, em alta constante e surpreendente, e Paulo Fonseca é um exemplo de quem  não esperou pelo próximo comboio. Entre a corajosa atitude de reconhecer  a impreparação para treinar o FC Porto e ser-lhe franqueado o ingresso na Liga de Itália para treinar a  adorada  AS Roma, aceitou um desafio solitário,  longe dos holofotes, contando apenas com a força do seu trabalho. Conseguiu.  É um cavalheiro, o que mais o enobrece.


José Mourinho é único, mas Leonardo Jardim, Nuno Espírito Santo e Paulo Fonseca, embora em patamar inferior, têm igualmente  alguma coisa que os diferencia dos restantes e que faz deles também especiais, verdadeiros treinadores da Europa com dificuldade em caberem na pequenez lusa. Haverá outros,  mas estes são os que mais se aproximam daquilo que o special one representa.
Que bela liga, a inglesa!


Na última quinta-feira, o Tottenham de José Mourinho teve de acelerar a fundo  para vencer o Brighton e no sábado sofreu imenso para segurar o empate no campo do Norwich.


Na sexta, o Wolverhampton, treinado por Nuno Espírito Santo, o mesmo que não servia para treinar em Portugal por, entre outros reparos,  ser demasiado educado, deslumbrou na vitória sobre o Manchester City (3-2), recuperando de uma desvantagem de dois golos (0-2),  e no domingo voltou a fazer figura em Anfield, no estádio do Liverpool, obrigando o campeão mundial a suar as estopinhas de modo a segurar uma vitória tangencial, discutida e polémica.
Amanhã, apesar de ser feriado de Ano Novo, há mais futebol em Inglaterra, com a realização da 21.ª jornada da Premier League:   o Tottenham joga em Southampton e o Wolverhampton  visita o Watford.


Os treinadores têm alguma razão ao queixarem-se do calendário de doidos, porque cada jogo na Liga inglesa parece ser o último da vida de cada jogador, sempre em velocidade, disponibilidade  e entrega totais,  mas a federação faz que não percebe, em nome da promoção do espectáculo: os adeptos agradecem e os jogadores aceitam o sacrifício  porque querem é jogar, sentir o ambiente frenético de estádios cheios e receber a vibração intensa do público por cada golo que marcam.
O que eles têm de mais, temos nós de menos: jogos. Muito se descansa cá por casa e mesmo assim muito se lamentam os treinadores sem se darem conta do despropósito da suas repetidas queixinhas. Para eles, normal  é  um joguito semanal, mais do que um é considerado abuso. Pode dizer-se que os ingleses são únicos, na inclemência, tal como nós, mas na complacência: vai para três semanas que  não há notícias da Liga pátria devido a outra prolongada paragem. Depois dizemos que os outros correm mais e, se calhar, até treinam menos…