Menos um problema!...

OPINIÃO20.11.202106:00

Amorim pode ter um coração de outra cor, mas tem um cérebro dirigido para um objectivo que serve os interesses do Sporting

SEMANALMENTE, Rúben Amorim treina em Alcochete a equipa nos seus mais variados aspectos e orienta a equipa nos jogos, seja em Alvalade ou em qualquer outro campo, em Portugal ou no estrangeiro. E, quando digo Rúben Amorim, quero englobar a sua equipa técnica, que ele superiormente lidera, como, de resto, sempre faz questão de salientar.
Semanalmente, Rúben Amorim comunica com os adeptos e sócios do Sporting Clube de Portugal, para não dizer que comunica com o País desportivo ou até com o País em geral, pois não há muita gente que mesmo na sua área de actividade saiba tão bem passar a mensagem, designadamente, na área governativa. São verdadeiros brindes de comunicação as suas conferências de imprensa, quer antes, quer após o jogo. Se não as consigo ouvir em directo, ouço-as depois ou leio-as na comunicação social escrita.

Muitos treinadores deveriam pôr os olhos nele, e já agora também os ouvidos, naquilo que ele diz de uma forma simples e humilde, sem dramatismos, mas com boa disposição e humor, procurando a verdade e a sinceridade ao contrário de alguns que se irritam facilmente e respondem com arrogância, fazendo do futebol uma ciência oculta só ao alcance dos treinadores e, ainda assim, só de alguns, e que muitas vezes analisam os jogos de forma intelectualmente desonesta, vendo um jogo que mais ninguém viu. Isto para não falar daqueles que quando ganham se auto-elogiam, esquecendo-se do mérito dos jogadores ou diminuindo o mérito pessoal de algum em particular, e quando perdem a culpa é sempre de alguém ou de alguma coisa, ao contrário de Rúben Amorim que assume a responsabilidade nos desaires e que na hora de vitória reparte os louros, enchendo a sua boca e os nossos ouvidos com a primeira pessoa do plural: nós!
Esta semana que vai terminar foram mais duas conferências a destacar: uma antes e outra após o jogo com o Varzim para a Taça de Portugal, com um triunfo ao cair do pano.

Na antevisão do jogo, como sempre faz, abordou diversos temas, entre eles as suspeitas sobre a lesão de Rafa, tal como anteriormente, um certo bimbo, ex-treinador, levantou suspeitas sobre as lesões de alguns jogadores do Sporting que determinaram a sua ausência dos trabalhos da Seleção Nacional. Disse Rúben: «Só posso falar por nós e nunca usaríamos isso. Os jogadores querem ir à Selecção, valorizam-se e isso é importante para os clubes. Não dou crédito a isso.» A diferença desta atitude nada tem a ver com o nível teórico de treinador, mas com a dignidade e respeito para com o jogador, ainda que adversário, mas que antes de mais nada é um ser humano. A isto chama-se carácter, que, infelizmente, vai estando fora de uso.
 

«No projecto desportivo não temos um problema de treinador, antes temos a solução»


Anteontem, após o jogo com o Varzim, sobre o estado do relvado, foi claro e conciso: «Obviamente que me preocupa, mesmo sabendo que as pessoas fazem o melhor que podem. Já o trocámos e agora estamos a fazer tudo para o ter em boas condições. Tivemos várias bolas em que bastava um passe simples, mas a bola não passava. Teve impacto na lesão do Jovane e também pode ter num adversário. Estamos a fazer o máximo para resolver o problema.»
Num tema que não é da sua praia, envolve-se no problema e na solução, mais uma vez na primeira pessoa do plural, numa atitude de solidariedade com todos com que trabalha de registar e enaltecer.

Mas, voltando à conferência de imprensa de antevisão do jogo, foi abordada a questão de Rúben Amorim poder prolongar o seu contrato para além de 30 de Junho de 2024 - data estabelecida no prolongamento acordado a 4 de Março deste ano - ao que respondeu: «Nós queremos que os jogadores fiquem por muito tempo, o treinador também quer ficar muito tempo e vai ficar muito tempo e terá oportunidade no futuro de voltar a renovar, mas se não ganhar jogos posso ter o lugar em risco como todos os treinadores. E como sempre disse a única diferença é que têm de pagar mais para eu sair. Estamos todos felizes, sabendo que na parte boa é fácil estar feliz num sítio, quando os resultados não aparecem tudo se complica.»

Recordo aqui e agora o artigo publicado a 06/03/2021, sob o título Sir Rúben Amorim: Rúben Amorim explicou de uma forma simples qual é o seu projecto e a sua determinação em o levar a cabo. No Sporting é preciso coragem, outra das suas características de liderança. Ao ouvi-lo, eu que nunca joguei futebol, nem treinei futebol, apenas tendo uma pequena experiencia de balneário, enquanto dirigente, pediria ao Rúben que assinasse pelos próximos DEZ ANOS!  Na semana seguinte, observei que, na conferência de imprensa de antevisão do jogo, fizeram um paralelo com o manager Alex Ferguson do Manchester United. É curioso porque aquele Sir do futebol inglês esteve não sei quantos anos ao serviço daquele clube inglês que é o que eu penso - e escrevi - sobre a relação entre Rúben Amorim e o Sporting! Independentemente de serem atribuídas preferências do Rúben por outro clube, designadamente o nosso rival - o que a mim pouco me interessa -, o que é importante é que ele pensa o presente e o futuro do Sporting a verde e branco. Ao contrário de outros que dizem ter o coração verde, mas agem e pensam de acordo com os seus interesses pessoais, Amorim pode ter um coração de outra cor, mas tem um cérebro dirigido para um objectivo que serve os superiores interesses do clube, competindo-nos a nós, sócios, adeptos e simpatizantes, fazer-lhe o transplante para um coração verde!

Para já estamos felizes, e é isso que importa depois de tantos e tantos anos a mudar de treinador como quem muda de camisa, com as consequências próprias da falta de estabilidade para a construção de um projecto desportivo sólido. Num balanço rápido de 1973/1974 a 2019/2020 - 47 épocas - o futebol profissional do Sporting mudou 66 vezes de treinador (fora os ameaços)!!! Resultado: apenas cinco campeonatos. Entre o primeiro (1973/1974) e o segundo e terceiros (1979/1980 e 1981/1982) um espaço de cinco épocas, e entre estes e os dois últimos (1999/2000 e 2001/2002) um espaço de 17 épocas. De então até 2021 foram 19 anos de abstinência. Uma coisa é certa: a SAD do Sporting não sobreviverá a mais de quarenta anos com mais de sessenta treinadores!

No próximo ano haverá eleições no Sporting Clube de Portugal e por mais que se trate de uma pessoa colectiva diferente da SAD, esta não será indiferente ou alheia àquelas eleições no seu acionista de referência. Tanto assim que, normalmente, não se discutem verdadeiramente os temas que têm a ver directamente com o clube, como sejam o modelo de organização e governance, matérias estatutárias e outras de primordial importância, antes se debatendo as questões do futebol, ligadas à SAD. Contudo, mesmo relativamente a esta, não se discutem problemas estruturais e de natureza económica e financeira, mas sim o futuro treinador ou futuros e potenciais jogadores, como se isso fosse um projecto desportivo que interesse para além dos votos que pode captar.

Esta é a razão do título do meu artigo de hoje. Nas próximas eleições discutam realmente o que importa ao clube e à SAD, como sejam o modelo de organização, matérias estatutárias, distribuição do capital, etc, tanto na SAD como no clube. Falem e debatam assuntos sérios e não tanto o projecto desportivo que está bem e recomenda-se. Deixem-se de demagogias e falem de realidades; falem de sustentabilidade e consistência. De forma directa e concreta. Sem receios, nem tabus, de perder votos. Precisamos de dirigentes corajosos, sérios, determinados, como verdadeiros leões, e não de meros tigres de papel!
No projecto desportivo não temos um problema de treinador, antes temos a solução. Mas essa solução do treinador e do seu grupo de trabalho precisa de uma base de sustentação que lhe dê continuidade. Temos muitos problemas pela frente como, por exemplo, os financeiros, mas, por ora, a questão do treinador - que treina e ainda por cima comunica - pode ser tudo menos um problema! O problema que tem dado cabo de nós!...