Levar as coisas a sério
Nem tudo é mau e há sempre coisas boas a retirar destas experiências
O ano que está a terminar não correspondeu às nossas expectativas. Às minhas não correspondeu garantidamente. Estava honestamente convencido que 2021 marcaria o fim da pandemia e o regresso à normalidade, mas afinal apenas nos trouxe a Delta e a Omicron. A verdade é essa e não há ninguém normal que a possa contrariar, infelizmente. Por esta altura, sabemos que o Covid-19 já matou, direta ou indiretamente em todo o mundo, cerca de cinco milhões de pessoas (números oficiais). Muitas outras, se calhar mais, perderam também a vida por falta de diagnóstico, tratamento ou cirurgia. São números trágicos que pintam de negro a fase mais desafiante da nossa geração.
A outro nível, os danos colaterais deste coronavírus foram igualmente devastadores: fecharam-se milhares de empresas e negócios, perderam-se milhões em investimentos e trabalhos e houve muita gente boa que ficou sem casa, sem carro e sem bens. Para além disso, a pandemia afetou a forma como percecionamos o mundo, impondo medo, impotência e perda: medo do desconhecido, impotência pela incapacidade em travá-lo e perda de todos aqueles os que partiram cedo demais. Mas uma das coisas mais perigosas que o vírus potenciou foi o advento dos conspiracionistas e o ressurgimento dos extremistas. É certo que a pandemia uniu-nos, mas também nos separou.
A voz universal da ciência, o parecer fundamentado dos especialistas, o saber dos maiores peritos mundiais continua a ser substituído, aqui e ali, pelo grito periférico de meia dúzia de achistas revoltados. Pessoas alheadas, revoltadas e delirantes, que acham que a sua opinião deve sobrepor-se à da esmagadora maioria. Ao saber comprovado de quem sabe o que faz e o que diz. Nem tudo é mau e como em tudo o que é ruim, há sempre coisas boas a retirar destas experiências. Uma delas é passarmos a conhecer melhor quem nos rodeia. Da minha parte confesso que tenho bons amigos, amigos que admiro e de quem gosto, pessoas boas e de bem, que a partir de agora olharei de forma diferente. Não é normal que insistam tanto numa mentira alienada quando a verdade universal é tão manifesta e avassaladora.
Lembram-se do histórico? Primeiro o vírus tinha sido fabricado pelo homem apenas para controlar a humanidade e todos os seus passos; depois era apenas uma invenção criada para dar lucro às farmacêuticas, com a conivência de todos (?) os governantes mundiais; mais tarde era uma viruzitos leve, menos fatal que a gripe e que os tumores, porque desses já ninguém queria saber (?); a seguir foram as medidas decretadas, que assassinavam os direitos, liberdades e garantias das pessoas; mais tarde, com o regresso à normalidade, em causa passou a estar a negligência dos governos, que estavam a facilitar demasiado e que assim o bicharoco voltaria em força; agora são as vacinas que, pelos vistos, têm coisas horríveis lá dentro que são más para a saúde (alguém que por favor leia a esta gente a bula do Bruffen ou da Minigeste). Pelo meio, as decisões políticas nacionais, que foram sempre injustas, desajustadas ou aplicadas no timing errado. E amanhã? Será o quê? Para quê? Porquê? Enfim.
É triste ver que há gente que pensa genuinamente assim, mas é preciso lidar, porque de facto não somos todos iguais. Convém apenas que não nos esqueçamos que a liberdade de uma pessoa termina quando interfere com a de outra. É verdade que as coisas não são tão dramáticas quanto meia dúzia de exagerados a pinta, mas são sérias e devem ser equilibradamente levadas a sério. Protejam-se. Cuidem de quem mais amam e respeitem a saúde das pessoas que vos rodeiam. Pensem nelas e não apenas nas vossas convicções. Quando o problema é de todos, a opinião de um não interessa para nada, sobretudo se for isolada.
Feliz Natal, Boas Festas.