Jesus ‘obrigado’ a ganhar no Dragão
Outro fracasso será o prenúncio de algo gerador de forte instabilidade que obrigará o presidente a explicar os motivos para promessas não cumpridas
L UÍS Filipe Vieira não precisava de Jorge Jesus para vencer as eleições, mas, mesmo assim, avançou para a sua (re)contratação, com as consequências que ainda ninguém consegue prever em toda a extensão e pelas quais vai ter de assumir a responsabilidade, para o bem e para o mal.
Na próxima sexta-feira realiza-se o segundo FC Porto-Benfica em menos de um mês e uma segunda derrota poderá fazer desabar os bonitos projetos que estiveram na génese de presente temporada da águia. O empate será o mal menor, na perspetiva da sua massa adepta, desiludida pelo fraco evoluir do projeto e obrigada a suportar a cavalgada leonina com resignação, mas que talvez reaja mal se, a seguir a um troféu perdido, voltar a sentir-se calcada pelo seu principal rival. Neste sentido, outro fracasso será o prenúncio de qualquer coisa geradora de forte instabilidade e que obrigará o presidente, criticado pelo seu prolongado silêncio, a explicar, na medida do que lhe for possível, os motivos para promessas não cumpridas, além do Covid e da sobrecarga do calendário, que a todos afeta. Para ser como está, mais valia deixar como estava: ficava muitíssimo mais barato.
O investimento foi considerável, mais do que seria suposto, mas, não sabendo o que Luís Filipe Vieira conversou com Jorge Jesus, ouço aqui e acolá e não tenho como duvidar de quem me garante que o treinador exigiu a última palavra em matéria de contratações e que o presidente terá anuído. A ser assim, não há como estranhar: é comprar…
O mercado de Jesus é limitado, não estou a dar novidade, razão pela qual ainda não terá sido capaz de explorar as reais potencialidades dos praticantes que integram o seu plantel. Se o problema residir nessa dificuldade, talvez a solução se afigure menos complexa, em princípio. À exceção do jogo com o PAOK, em que apresentou uma equipa conservadora, deixando as aquisições de fora, até ao fim de outubro tudo correu de feição, ante um treinador observador e, presume-se, atento.
Começou o mês de novembro, o Benfica foi envergonhado no Bessa, diante do Boavista, e desde essa altura não mais houve critério, nem coerência na condução da equipa, com opções de duvidosa eficácia e que nenhuma saúde têm dado ao grupo. Por isso se critica que os jogadores encarnados não ganham as segundas bolas, não metem o pé, não se empenham, não mostram os pitões, enfim…
Se Jesus ainda não conseguiu avaliar a riqueza do plantel que tem ao seu dispor, que é apreciável, embora necessitado de um ou dois reforços a sério, muito dificilmente formará uma equipa forte, motivada e determinada. Ele próprio já afirmou que não conseguirá vencer a Champions no Benfica, nem sei se alguém responsável no clube lhe colocou essa questão, mas sei que se voltar a perder com o FC Porto, ainda com o desfecho da Supertaça tão vivo na memória das pessoas, bem poderá olhar para o umbigo, como é seu costume, porque os adeptos ficarão à beira da saturação. Não pelo que diz, mas pelo que não faz.
Jesus só pode ajudar o presidente, e retribuir-lhe a confiança, se vencer o FC Porto, sem necessidade de arrasar, como prometeu fazer com a bazófia que o caracteriza. Ou seja, ganhe, simplesmente. É o mínimo. Bruno Lage, com currículo de pobre, ganhou no Dragão, em março de 2019, e foi campeão. Neste preciso momento, porém, a vitória nada vai resolver, mas alivia as almas encarnadas… até ao dérbi de Alvalade, quando o mês de janeiro se despedir.
E M relação a currículos, tema que Jesus resolveu trazer a público para respaldar a competência que pensa ter e que, tanto quanto julgo saber, nenhum jornalista questionou, quero esclarecer que, embora não fazendo parte da sua enorme falange de admiradores, respeito a carreira que construiu embora não o considere um grande treinador, porque ser grande é outra conversa. Verdadeiramente grande, só há um, José Mourinho. Abaixo dele, Artur Jorge, também campeão europeu. Depois, aparecem os bons, cada vez em maior número, felizmente para a imagem do País e do futebol luso, entre os quais incluo Jesus, o que não quer dizer que seja o melhor deles, porque não é, do meu ponto de vista.
Abel Ferreira, o mesmo treinador que, então ao serviço do clube grego do PAOK, impediu o Benfica de aceder à Liga dos Campeões, eliminando-o na pré-eliminatória, sem margem para discussão, está agora a um passo de colocar o Palmeiras na final das Taça dos Libertadores, depois de ter vencido o River Plate, no jogo da primeira mão das meias-finais, realizado na Argentina, por expressivo três-a-zero. Na próxima madrugada saber-se-á se o Palmeiras será capaz de confirmar a presença no jogo do título, sendo certo, porém, que o trabalho de outro treinador português, praticamente acabado de chegar ao outro lado do Atlântico, está a suscitar justificado entusiasmo.
No lado de lá, porque no de cá, em contraposição à barulheira instalada à volta de Jorge Jesus, quase endeusado em idênticas circunstâncias, até parece que nada de especial acontece. Mas este conquistou o troféu, Abel ainda não. Falta o quase e esse quase custa muito a alcançar. Será essa a diferença…
Abel Ferreira e Jorge Jesus, entre significativas diferenças, apresentam em comum passagens pelo Sporting de Braga, tal como Carlos Carvalhal, em repetição, e Rúben Amorim, que o Sporting resolveu resgatar, na altura encarado como irresponsável devaneio e hoje como operação estratégica muito inteligente: é a força dos resultados.