Essa coisa de torcer o nariz...
Sou dos que começaram por torcer o nariz ao treinador Nuno Espírito Santo. Ter sido guarda-redes não me dava grande confiança, o que era, reconheço agora, um preconceito como outro qualquer. Eu, por exemplo, estudei engenharia e acabei jornalista. Que tem uma coisa a ver com a outra? Nada. A verdade é que não acreditava que um guarda-redes mediano, como foi Nuno Espírito Santo, pudesse dar grande treinador. Mas deu. Ou está a caminho de dar. Muito bom trabalho no Rio Ave, bem razoável no Valência, medianíssimo no FC Porto, espantoso no Wolverhampton. Quinze pontos nos primeiros oito jogos da Premier League é, mesmo para o campeão em título da segunda liga inglesa, soma notável. Tem mais dois pontos que o Manchester United de José Mourinho e mais três que o Everton de Marco Silva. É, pois, de momento, o treinador português mais bem posicionado na bem competitiva Premier League. Esta coisa de ter sido preconceituoso com guarda-redes que se tornaram treinadores pode virar-se contra nós.
Sou dos que continuam a não torcer o nariz ao treinador José Mourinho. Que raio, é impossível o homem ter desaprendido tanto em tão pouco tempo. Claro que, durante os longos minutos em que ontem o Manchester United esteve a perder com o Newcastle, até eu perdi a fé e passei a torcer o nariz. Comecei a imaginar que, a partir da eventual derrota de ontem, as portas dos maiores clubes europeus estariam, em definitivo, fechadas para José Mourinho. Imaginei que o setubalense teria de baixar a fasquia e passar a sonhar, por exemplo, em treinar Nápoles ou Fiorentina, Sevilha ou Valência, Mónaco ou Marselha. Mas Mourinho tem sete vidas e o 0-2 transformado em 3-2 parece ter sido uma vida extra que lhe foi concedida frente ao Newcastle. E lá engoli eu a minha incrível imaginação.
Sou dos que, aqui e além, torcem o nariz ao treinador Rui Vitória. Talvez seja do discurso. Ou da forma como, por vezes, fala dos árbitros. A verdade é que é igualmente uma estupidez torcer o nariz a quem ganhou dois campeonatos em três épocas no Benfica. E que lançou Ederson, Nélson Semedo, Renato Sanches, Rúben Dias, Gedson e João Félix, entre outros. Rui Vitória está longe de ser um treinador consensual no Benfica. Como não o foram Jorge Jesus, Quique Flores, José Antonio Camacho, Fernando Santos, Ronald Koeman, Giovanni Trapattoni, Jesualdo Ferreira, Toni, Jupp Heynckes, José Mourinho ou Graeme Souness, para falarmos apenas dos últimos 20 anos. Se calhar, se não quisermos torcer o nariz a 114 anos de treinadores no Benfica, o único consensual terá sido Cosme Damião.