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O regresso de José Mourinho ao jogo não pode deixar de ser considerada uma boa notícia para José Mourinho, para os que o admiram (é o meu caso), para o futebol português, para o Tottenham, evidentemente, e também para a Premier League e para o universo da Liga dos Campeões. Mourinho é uma figura com demasiado impacto no mundo do futebol para esse mundo do futebol poder dar-se ao luxo de passar sem ele. Confesso, porém, que esperava, vê-lo, mais tarde ou mais cedo, regressar... ao Real Madrid, onde me parece que Mourinho deixou algo por fazer em termos europeus e onde me parece que estava o próximo desafio mais à dimensão de José Mourinho.
Mourinho é - queiram ou não - mesmo especial, como ele, aliás, anunciou sentir-se, logo quando chegou pela primeira vez ao futebol inglês, já lá vão quinze anos. E é tão especial que faz parte do restrito grupo de treinadores mundiais que sempre ganharam algum título em todos os clubes onde trabalharam. E Mourinho já trabalhou - e foi, por exemplo, campeão - em Portugal, Inglaterra, Itália e Espanha. Raro.
Tão raro, que em toda a história, apenas dois treinadores mais (o austríaco Ernst Happel e o italiano, tão nosso conhecido, Giovanni Trapattoni) conseguiram ser campeões em quatro países!
NUNCA José Mourinho tinha estado tanto tempo sem trabalhar como desta vez, quase um ano, desde que chegou a acordo com o Manchester United para deixar Old Trafford. Certamente, já alguns dos seus maiores críticos - felizmente, poucos - esfregariam as mãos, vendo que José Mourinho arriscaria estar ainda esta época a refletir sobre o futuro e à espera do melhor projeto para regressar.
Alguns desses (felizmente, poucos) críticos classificam o percurso de Mourinho no Manchester United como um percurso de insucesso. Falam de um futebol irregular e menos atrativo. Mas não apenas ignoram circunstâncias como esquecem o que, apesar de tudo, Mourinho conseguiu.
No Tottenham, José Mourinho encontrará, porventura, um projeto interessante para este momento da carreira - um clube estável, com extraordinárias condições de trabalho, bom plantel, fantástico estádio, adeptos apaixonados e fiéis, e uma equipa com que todos parecem simpatizar mas que… não ganha títulos.
Com todo o respeito (justificado) pelo trabalho de Mauricio Pochettino, arrisco, porém, a maldade (meio a brincar, meio a sério), de considerar que os jogadores do Tottenham talvez estejam, a esta hora, a pensar: «Agora, sim, vamos ganhar taças.»
NO Manchester United, Mourinho encontrou uma equipa sem raízes e sem referências, num clube que perdera identidade e deixara de ganhar, depois dos anos dourados com Alex Ferguson. O que é terrível para qualquer treinador, como aliás se viu com David Moyes e Van Gaal, que antecederam o português.
O Manchester perdera identidade e todos sabiam como seria difícil recuperar essa identidade após os 20 anos com Alex Ferguson. E perdera as referências britânicas de renome, absolutamente essenciais, como eram Roy Keane, Ryan Giggs, Wayne Rooney, Rio Ferdinand, os irmãos Neville e Paul Scholes, que mantinham a estrutura e a filosofia para receber, depois, os talentos estrangeiros.
As referências que o Manchester United de Mourinho tinha eram dois rapazes com muito talento mas ainda sem estatuto como eram, e, de algum modo, são ainda, Marcus Rashford e Jesse Lingaard, insuficientes para suportar a chegada de individualidades como Pogba, Lukaku ou Alexis Sánchez, só para citar jogadores cujo ego poderá, num determinado momento e num certo contexto, ter-se sobreposto ao compromisso com a equipa. A verdade é que nenhuma grande equipa se reconstrói sem grandes referências.
Ainda assim, com Mourinho, o United voltou aos títulos - Liga Europa e ainda Taça da Liga e Supertaça inglesas, além de ter levado o United a vice-campeão inglês em 2018, só atrás do insuperável Manchester City.
Enquanto Mourinho procurava em Old Trafford reconstruir um império em declínio, os seus maiores adversários construíam equipas em clubes com muito maior estabilidade emocional, no caso do Liverpool por estar muito pouco habituado a ganhar nos últimos 15 anos, no caso do City por ter passado a ganhar mais vezes com a chegada de Guardiola.
Ou seja, a herança pesada estava no Manchester United. E, sublinhe-se, mesmo assim Mourinho conduziu a equipa a três títulos. Trocando, como trocou, o treinador português por Solsjkaer, veremos quando vai o United voltar a ganhar troféus!...
PS: Mais duas figuras especiais em destaque esta semana - Jorge Jesus, que joga este sábado mais uma das coroas de glória da carreira (será fantástico para ele, para os que o admiram, como é o meu caso, e para o futebol português, que o Flamengo vença a Libertadores) e, que me desculpe Jesus, sobretudo Fernando Albino de Sousa Chalana, que viu ser apresentada em livro a vida enquanto homem simples, pequeno no tamanho e enorme no coração, e um genial jogador de futebol. Absolutamente genial!