Ele chora, nós sorrimos

OPINIÃO09.01.201900:15

1 - Como todos os não-benfiquistas, ou mesmo como todos os benfiquistas sãos de espírito, eu já vomito por todos os poros a novela do novo treinador do Benfica. Saber se o Benfica vai ter ou não saudades de Rui Vitória, se foi este que se despediu ou se foi convidado a despedir-se (ah, ah, ah!), se vem Mourinho, Luís Castro, Leonardo Jardim, Jorge Jesus ou a surpresa Bruno Lage, não justifica, não pode justificar em qualquer país ainda com alguns resquícios de lucidez mental, o bombardeamento de programas de debate televisivo ou a programação de uma televisão de referência noticiosa, dedicada ao assunto de manhã à noite. Querem absolutamente convencer-nos que o Benfica é o Alfa e o Ómega da vida do país, e que nada pode haver de mais importante para ele do que saber quem será o novo treinador daquilo que pomposamente designam por a Instituição. Mas há, por muito que lhe custe e por mais que seja generalizada a estupidez disseminada à roda. Há mais vida para além do Benfica e do seu novo treinador. Até no futebol, mesmo no nosso futebol.


Tenho consideração e simpatia pessoal pelo presidente do Benfica, Luís Felipe Vieira, o que não tem nada a ver com o resto nem me condiciona o raciocínio ou a liberdade de observação. Aliás, foi ao lado de benfiquistas que pude observar o desconforto, para dizer o mínimo, com que eles viram o seu presidente prestar-se à operação de relações públicas do programa de Cristina Ferreira, com o qual quis manifestamente fazer esquecer as vozes de contestação que na véspera tinha escutado na Luz. A um, escutei-lhe o desabafo de «o Vieira agora escolhe o treinador a jogar à bisca na televisão!» e a outro o comentário de «como é que o tipo pode dizer que o dinheiro não é problema quando dirige uma SAD que tem 385 milhões de dívida, fora a do clube?».


Tenho simpatia pessoal pelo presidente do Benfica, mas a verdade, verdadinha, é que não o queria para presidente do meu clube. Não apenas porque entendo que o meu clube está melhor servido, mas também porque acho, com toda a frieza, que Vieira tem ficado muito aquém do que um presidente do Benfica - com a maré de sócios e adeptos que tem e com os apoios de que tradicionalmente goza junto dos vários poderes do país - poderia e deveria ter feito ao fim de tantos anos. Imaginar, por exemplo, que um clube como o Benfica pudesse terminar uma época sem um único título de campeão nacional nas modalidades que contam, como sucedeu na época passada, é inconcebível. E se a tarefa primeira de um presidente de um clube de futebol profissional que aspira cronicamente ao título de campeão do seu país e a ser alguém na Europa tem de ser forçosamente a escolha criteriosa de um treinador, então o rol de sucessivos desastres e asneiras acumulados por Vieira nos tempos recentes nessa matéria é digna de um amador. As lágrimas derramadas por Vieira frente a uma deliciada Cristina Ferreira não apagam uma outra imagem que a mim me causou uma impressão bem mais marcante: o Benfica perdia por 2-0 em Portimão, depois de dois inacreditáveis auto golos, jogava zero e estava completamente perdido face ao jogo e ao destino. E que fazia o seu presidente, sentado na bancada? Como sempre, estava embrenhado na consulta do telemóvel. A fazer negócios, a fazer joguinhos, a receber conselhos ou opiniões sobre o jogo? Que sentido fazia aquilo?


Não são contas do meu rosário e eu não tenho nada a ver com isso. Mas, para mim, um presidente, seja do que for, tem de ser um líder, tem de estar na frente, nos bons e maus momentos. E, no que se refere a um clube de futebol, isso não tem que ver apenas com a escolha do treinador. Não pude evitar ficar mal impressionado (e talvez porque, como portista, habituado ao contrário), ao reparar que recentemente houve três momentos na vida do Benfica em que o seu presidente deveria lá ter estado, na frente, e não esteve. O primeiro momento, foi no tribunal, quando o Benfica teve de responder, como arguido, no processo dos emails. Ora, quem representa o clube em juízo é o seu presidente - e, neste caso, deveria sê-lo por maioria de razão, visto que Paulo Gonçalves fora escolha de Vieira e era o seu braço direito na SAD. Mas Vieira declarou-se doente ou coisa que o valha e mandou avançar outros dois administradores, que responderam eles como arguidos. O segundo momento foi em Munique, quando o Benfica jogava o que se antevia ser a despedida da Liga dos Campeões e um jogo de risco máximo, em termos de resultado e até de prestígio. Pretextando trabalho em Lisboa, Vieira não seguiu de véspera com a equipa, ficando de viajar no dia seguinte. Mas no dia seguinte, voltou a invocar reuniões urgentes em Lisboa e ficou em terra: entregou a equipa à sua sorte, a um massacre anunciado, à representação de outros administradores e à responsabilização do treinador, que viria a despedir e depois reintegrar. Pergunto: que tarefa seria mais urgente e importante do que estar com a equipa naquele momento de aperto? O terceiro momento aconteceu quando o Benfica foi jogar para a Taça a Montalegre, nos confins norte de Portugal (que também não é assim tão grande). É fácil passar a vida a apregoar que o Benfica é o maior clube de Portugal e desfilar no Marquês de Pombal, em Lisboa, quando o clube é campeão, mas é nestas alturas e nestas paragens que se exige a responsabilidade de saber representar o tal maior clube de Portugal. Mas Vieira, é claro, não se deu ao trabalho de pôr os pés em Montalegre, apesar de a viagem ser de avião até ao Porto e autoestrada a seguir e prever duas noites de agradável estadia no Hotel Vidago Palace. Mais uma vez mandou outros em seu lugar. Eis o que Pinto da Costa jamais faria. Mas, repito: não é da minha conta. Apenas constato.

2 - Foi jornada dupla na semana e todos os da frente acusaram o cansaço acumulado por meses de oito jogos. O Benfica encostou em Portimão e só não morreu de vez contra o Rio Ave porque a sorte do jogo e as forças anímicas que conseguiu ir buscar onde pareciam já não existir o evitaram. O Sporting tremeu contra o Belenenses e espalhou-se contra o Tondela, com um tiro de misericórdia saído de um dos melhores golos deste campeonato. O Braga passou incólume pela dupla jornada mas em modo de tem-te, não caias, que é o mesmo que o FC Porto vem usando para conseguir chegar à incrível série de 18 vitórias consecutivas - com o recorde nacional absoluto a poder ser batido em Alvalade, o que seria ouro sobre azul.

3 - Dizem que a contratação de Pepe serviria para deslocar Éder Militão para a direita e nos podermos enfim livrar do sobressalto permanente de Maxi naquela função. Mas não percebo porque só Pepe dá garantias de poder jogar no meio: Diogo Leite provou bem antes de Militão, embora não tão bem quanto este; Mbemba voltou a mostrar contra o Nacional que pode com segurança fazer o lugar, e Chidozie, de quem eu sempre gostei, mostrou contra o Benfica B que é um grande central que precisa e merece mais oportunidades. A meu ver, se Militão pode ser opção para a direita, nada justifica continuar a adiar a urgente reforma de Maxi Pereira. E, quanto ao reforço do meio-campo, temos emprestados jogadores como Mikel, Galeno, Ewerton, todos eles jogadores com valor para, pelo menos, se sentarem no banco. E, na equipa B, João Mário, por exemplo.


Como é óbvio e já o escrevi vezes suficientes, tenho toda a confiança e admiração pelas opções de Sérgio Conceição. E toda a gratidão. Mas às vezes há coisas que me fazem confusão. Como ver o Porto a jogar como se estivesse com dez, quando Maxi está em campo ou ver a insistência em Adrián López, quando Hernâni está sentado no banco.