Eco de idiotas
Pedro Pichardo não é menos português que Nélson Évora ou Cristiano Ronaldo...
SE Nélson Rodrigues descobriu no seu alvitre que os idiotas acabariam por tomar conta do mundo não pela sua capacidade, mas pela sua quantidade - eles vão mostrando o pior da sua moléstia devido a uma outra descoberta, à sagaz descoberta de Umberto Eco:
- As redes sociais dão o direito à palavra a uma legião de idiotas de aldeia que antes só falavam na taberna depois de uma taça de vinho, sem com isso prejudicarem a humanidade. Eram rapidamente silenciados nos seus disparates e agora têm o mesmo direito à palavra que qualquer Prémio Nobel…
Por lá apanhando, ontem, essa «invasão de imbecis» entretida em comentários a Pedro Pichardo - insinuando-o «português menor» por ser ter «naturalizado em dois meses» (o que é mentira) - veio-me à cabeça a lata de sardinha do Jonathan Edwards que o Matthew Syed revelou no seu Bounce, o mais cativante e entusiasmante livro sobre sucesso que eu li. Conta que, marcado na pele da alma pela ideia de que as esperanças podem ser coisas perigosas, levou para a final dos Jogos Olímpicos de Sydney, escondida no fundo do saco dos equipamentos, uma lata de sardinhas:
- … a passagem em que Jesus fez o milagre da multiplicação era das suas favoritas na Bíblia, se as sardinhas eram para simbolizar os peixes miraculosamente dados por Cristo às massas, elas eram, na realidade, a representação da fé de Edwards em Deus…
Há dois anos, na véspera de se lançar à conquista do título mundial em Doha, Pichardo revelou-me, emotivo:
- Aprendi o Hino como se fosse uma canção, quero cantá-lo para agradecer o que Portugal fez por mim…
Não o conseguiu por infelicidade e sei o que sofreu por isso. Não merecendo, pois, que o tratem como se fosse diferente de português nascido em Alvaiázere (ou diferente de Nélson Évora ou de Cristiano Ronaldo...) - também sei que a sua lata de sardinhas em Tóquio será de novo o hino que tem para cantar e quer cantar com coração de português (e real).