E depois do clássico …

OPINIÃO05.02.202001:07

Não há grandes dúvidas sobre as consequências do  clássico de sábado à luz do que vale o campeonato português. Só uma vitória do FC Porto poderá reanimar a discussão do título que, até agora, pende francamente para o Benfica e os sete pontos que leva de avanço. Tudo o resto - empate ou triunfo encarnado - deixa o campeonato virtualmente nas mãos de Bruno Lage, apesar de ainda ficarem a faltar 14 jornadas. O problema é que ninguém está a ver como é que o Benfica, sobrevivendo ao Dragão, consegue perder sete pontos até ao fim, sabendo-se que Lage ganha praticamente todos os jogos (36 vitórias em 38 jornadas, com 119-24 em golos, um desempenho do outro mundo, liverpooliano) e que o Benfica já fez as saídas consideradas mais difíceis (Dragão, Alvalade, Braga, Guimarães).


Portanto, o melhor exercício é mesmo imaginar/antecipar cenários consoante o FC Porto ganhe ou não. Ganhando Sérgio Conceição, o FCP reentra na discussão do título - mas ainda a 4 pontos e numa posição de não-favorito, atenção - e garante vantagem sobre o Benfica em caso de empate final, dada a vitória na Luz. Nesse caso, é de prever que a temperatura  interna no Dragão possa baixar e ficar em banho maria - em nome do objetivo comum - até ao acerto de contas no final da época. Sérgio disse anteontem que com ele «o FCP tem chegado [lutado até] ao fim em todas as competições», o que não é mentira nenhuma e servirá para lembrar aos mais distraídos que o FCP, nos quatro anos anteriores a Sérgio, gastou rios de dinheiro, ganhou zero títulos e só chegou a uma final (perdida para o SC Braga no Jamor). Outra das consequências de um triunfo portista será, muito provavelmente, a forma como os dois rivais passam a encarar a Liga Europa, que regressa dentro de duas semanas - o FCP vai a  Leverkusen e o Benfica joga na Ucrânia com o Shakhtar de Luís Castro. Reacendendo-se a discussão no campeonato, creio que tanto FCP como SLB olharão de esguelha a competição europeia, o que será uma pena porque ambos têm obrigação de tentar chegar longe. O FCP porque a isso o obrigam os sete títulos internacionais no currículo, quatro deles conquistados nos últimos 17 anos; o Benfica porque chegou a uma meia-final e duas finais seguidas na Liga Europa há meia dúzia de anos. Acresce, e desculpem estar sempre a insistir nisto, que é na Europa que os clubes nacionais fazem a verdadeira prova de grandeza (ser forte e dominador no quintal doméstico não chega: para lá de Badajoz ninguém vê. Ninguém quer saber).


Registando-se empate ou ganhando o Benfica, o campeonato fica praticamente arrumado e Luís Filipe Vieira pode sonhar com o sexto título em sete anos, algo que não se via na Luz desde os anos setenta do século passado. Para Bruno Lage, mais folgado, será uma ótima oportunidade de tentar alargar o registo na Liga (impressionante) a outras competições, nomeadamente à europeia. Volto a insistir: é mais que tempo de o Benfica fazer prova de vida nos palcos onde ganhou fama mundial na década de sessenta. É ali que se consegue a fama, o peso e a notoriedade que interessam. No caso portista, tudo o que não seja ganhar o clássico vai adensar a crise institucional e, acredito, precipitar trocas de galhardetes, aqui e ali, até ao grande ajuste de contas final. No fundo, alguém terá de começar a assumir responsabilidades por mais uma época previsivelmente fracassada a somar a outros desaires noutras áreas importantes. No caso de Sérgio, creio que só uma vitória na Liga Europa poderá compensar a perda do campeonato - além do peso brutal que uma conquista europeia tem, recordo que o vencedor desta Liga Europa joga a próxima Supertaça Europeia no Porto, no Estádio do Dragão, a 12 de agosto. Sem esquecer que há ainda uma final da Taça de Portugal para ganhar - mas isso vale para os dois.