É bem feito!
Está meio mundo a lembrar sistematicamente o quão infeliz foi José Peseiro na primeira passagem pelo Sporting. Foi, na verdade, José Peseiro muito infeliz em Alvalade, se considerarmos apenas a infelicidade e a frustração, sobretudo para ele próprio, de ter perdido, em pouco dias, a possibilidade de ser campeão nacional e de devolver ao leão um título europeu no futebol (a extinta Taça UEFA) 41 anos depois da conquista leonina da Taça das Taças.
Lembro-me bem daquela decisiva noite europeia já no novíssimo Estádio de Alvalade, a 18 de maio de 2005, porque estive lá, como um dos privilegiados assistentes ao vivo da final do Sporting com o CSKA de Moscovo, acompanhando então Luís Figo e a lindíssima mulher Helen, convidados especiais de A BOLA para a verdadeira noite de gala que era a final daquela Taça UEFA numa quente noite de primavera em Lisboa.
O Sporting entrou muito bem no jogo, com o futebol magnífico que já muitas vezes tinha exibido naquela época, e podia perfeitamente ter chegado ao intervalo a ganhar, não por 1-0, como chegou, mas por mais um ou dois golos de diferença.
Na 2.ª parte aconteceu o que acontece muitas vezes no futebol, e a muitas das grandes equipas: o céu a desabar sobre a cabeça quando se torna mortífero e muito eficaz o contra-ataque do adversário. E quando, por fim, se revela fatal e irremediável! Não foi um pouco isso o que ainda agora aconteceu no recente Portugal-Uruguai do Mundial?, com a diferença de que Portugal nunca jogou o que jogou aquele Sporting de Peseiro naquela noite de maio de 2005?…
Não se trata de defender Peseiro apenas por defender e muito menos a decisão de voltar a dar-lhe o comando técnico do Sporting. Mas fará sentido, 13 anos depois, ainda estar a carpir os velhos insucessos? Ou, como lembraria Jorge Jesus, já se esqueceram os mais críticos que só perde os grandes títulos quem chega às grandes decisões? E que só chegam às grandes decisões aquelas que são as boas equipas?
Admito, com facilidade, que não foi Peseiro das primeiras opções deste novo Sporting. Acredito até que com Peseiro tudo se resolveu apenas nas 24 (máximo 48) horas anteriores à apresentação dele como novo treinador, faz agora oito dias. Mas se diz o provérbio chinês para não voltares nunca ao lugar onde foste feliz, então José Peseiro pode estar tranquilo por ter sido tão infeliz no lugar aonde regressa. Competência tem ele. Veremos se, desta vez, será suficiente para fazer a diferença.
AGORA que a Seleção regressou a casa, será que já se pode dizer, falando um bocadinho mais alto, que Portugal nunca jogou lá muito no Mundial? Já se pode afirmar que a equipa apresentou quase sempre um jogo talvez ainda menos entusiasmante do que no Europeu? É uma pena, mas a verdade é que Portugal não correspondeu à expectativa que criou.
Ninguém está a dizer que esperávamos todos ver a Seleção ser campeã do mundo. Uma coisa é desejá-lo, apoiar e torcer por isso, outra é afirmar que Portugal era uma das mais fortes candidatas ao título. Não era nem nunca será. Podemos e devemos ambicioná-lo; mas não podemos nem devemos exigi-lo.
Cristiano Ronaldo, Pepe e Rui Patrício voltaram a ser os nossos maiores, tal como no Europeu. Não por acaso. São, de momento, os nossos únicos jogadores de verdadeira dimensão mundial. É verdade que se Ronaldo foi o melhor a abrir, Bernardo Silva (outro excecional talento que demorou a entrar em cena…) acabou por ser melhor a fechar.
No jogo do adeus, é verdade que Pepe esteve no melhor (o golo da nossa esperança foi dele) e no pior (foi sobretudo a má decisão dele que permitiu a Cavani fazer o 2.º do Uruguai).
O que também dói? Saber que os sul-americanos estavam mais do que ao alcance de tão talentosos jogadores portugueses. E dói ver como a equipa dá quase sempre a ideia de valer bem menos do que a soma das capacidades de cada um.
Ficou no fim de tudo ainda uma gracinha do extraordinário jogador que é, repito, Bernardo Silva, ele que deverá ser, num futuro próximo, talvez o maior entre os portugueses, e quando chegar a hora da braçadeira de Ronaldo mudar de braço talvez se saiba sem hesitação para que braço deverá mudar!
Este pode ficar, globalmente, como o Mundial dos mais pequenos gigantes, Marrocos, Nigéria, Coreia do Sul, Suíça, Japão… para citar exemplos de equipas já eliminadas, mas também a Croácia, Suécia, Bélgica, até mesmo uma nova Inglaterra ou a empolgada e anfitriã Rússia. Tudo equipas que procuraram muito mais jogar pelo jogo e não pela estratégia, pelo truque, pela mais latina perda de tempo... As equipas que cito mostraram jogar por paixão, pela defesa do jogo positivo, pela noção de que se tens poucas hipóteses de ser a campeã, então mais vale mostrar bom futebol e sair com esse orgulho do que amarrar-se à estratégia e sair sem piedade.
A Federação Portuguesa de Futebol confirmou ontem a notícia de A BOLA: José Couceiro está oficialmente anunciado como diretor técnico nacional. Fazia, realmente, falta quem pudesse no futebol português coordenar ideias, linhas, estratégias, conceitos, projetos e objetivos, acima das três cores dominantes e sem olhar a interesses privados ou a influências alheias.
Serei suspeito na medida em que me ligam a José Couceiro 30 anos de muitas conversas sobre futebol. Mas pelo que conheço do jogador, treinador, dirigente e administrador, nenhuma dúvida de que um diretor técnico nacional só pode ser alguém como José Couceiro. Alguém que, melhor ou pior, sempre procurou defender o futebol e os profissionais do futebol, a começar pelos jogadores e pelo próprio jogo.
Em Portugal, é isso o mais é preciso: defender os jogadores e o jogo. José Couceiro defende. Disso podemos estar certos. Só falta saber se o ajudarão a ele a ajudar o futebol e não se ficam, como quase sempre, à espera que ele faça tudo sozinho, para poderem, depois, continuar a sacudir a água do capote.
Pode Pedro Madeira Rodrigues reclamar o lema de candidato da coragem às próximas eleições para a presidência do Sporting, às quais concorre pela segunda vez depois de ter sido esmagado por Bruno de Carvalho em 2017. O candidato da coragem é, porém, na minha opinião, também já o candidato da insensatez. Não terá Madeira Rodrigues a noção do mal que faz ao Sporting ao afirmar que se for o presidente em setembro o treinador será Cláudio Ranieri?
Sensatez, e muita, tiveram, por seu lado, Frederico Varandas, o candidato que avançou quando a casa ainda ardia, e Fernando Tavares, o empresário desconhecido que também esta semana decidiu apresentar-se. Defender - como os dois defenderam - que Peseiro será o treinador é, mais do que uma evidência, afirmação de bom senso. E de inteligência. De quem revela ter a noção do que é uma equipa de futebol!
O jogo de apuramento do 3.º classificado do Mundial é um disparate a que a FIFA, mais tarde ou mais cedo, vai ter de pôr um ponto final. O jogo dos derrotados não serve rigorosamente para nada nem pode entusiasmar alguém. Dirão que se defende prestígio e orgulho. Treta. A servir para alguma coisa só mesmo para alguns interesses comerciais da própria FIFA, porque se perguntarem a jogadores e treinadores se faz algum sentido discutir aquele jogo logo verão a resposta.
Portugal já experimentou por duas vezes essa sensação de discutir um lugar que não é carne nem é peixe; querer que o futebol tenha um pódio como têm a F1 ou o MotoGP é mesmo de quem se habituou a não respeitar os verdadeiros protagonistas do futebol, que são os jogadores.
Durante muitos anos, o nosso 3.º lugar no Mundial-1966 ainda serviu para orgulhar um pequeno país com uma gigante paixão pelo futebol e um gigantesco talento como Eusébio. Mas alguém se lembra ou, porventura, se entusiasmou quando, 40 anos depois, discutimos com a Alemanha o 3.º lugar em 2006? Claro que não! Ser 3.º no Mundial é ser… o 2.º dos últimos. Não cabe na cabeça de ninguém!
Com todo o respeito, naturalmente, por todos as cores, creio que se compreenderá que não é exagero afirmar-se que Cristiano Ronaldo já jogou no Benfica de Inglaterra, o Manchester United, jogou no Benfica de Espanha, o Real Madrid, e vai, se tudo correr como espero, jogar no Benfica de Itália, a Juventus, na medida em que se fala dos maiores (nem sempre os melhores) clubes de futebol desses países, como é, incontornavelmente, o Benfica em Portugal, e tal como o próprio Cristiano o referiu, há bem pouco tempo. Faz bem Cristiano mudar-se para a Juve. E creio que também o merece. E mais: ou muito me engano ou tomou essa decisão na célebre noite do pontapé de bicicleta em Turim.
É bem feito, Florentino!